São Paulo, segunda-feira, 7 de outubro de 1996
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Ironia de 'Salsa' ridiculariza classe média

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

Embora o número de novelas no ar tenha aumentado, a audiência do gênero vem diminuindo e o interesse de atores e diretores também. Diante da crise, a Globo busca profissionais capazes de gerar novas fórmulas. Nessa linha, investe em Miguel Falabella e Maria Carmem Barbosa, dupla consagrada no teatro de comédia do Rio.
Mas a margem de manobra é pequena. A nova novela das 19h da emissora, "Salsa e Merengue", gira em torno da busca da verdadeira identidade de personagem abandonado pela mãe na maternidade. O tema da criança trocada é caro às telenovelas. Em "Salsa e Merengue" ele vem associado a outros ingredientes típicos.
Romances, laços familiares ocultos e adultério garantem mobilidade social. A condição de filho ilegítimo do protagonista vem a público graças a uma doença providencial que requer transplante de medula de familiares consanguíneos.
A dramaticidade da situação produz aquele diálogo de sempre, onde o pai revela seu segredo ao médico incrédulo. A situação requer o também clássico ambiente hospitalar.
A novela trás também um tom irônico, beirando o cinismo, que se distancia no entanto do escracho. A primeira semana apresentou alguns momentos ferinos, como o fantástico baile de debutante de classe média baixa.
O "cerimonial" transforma acontecimentos de contos de fadas em etapas de um ritual. A menina, instalada em um trono, tem seus sapatos sem salto trocados por sapatos de moça. Recebe então seu príncipe para a primeira valsa. Toda a pirotecnia de bolos, luzes e névoa, devidamente ridicularizados pela personagem de classe média alta, lembra o "Xou da Xuxa".
Sequências do baile se alternaram com sequências de festa fina na paisagem bucólica de um rio amazônico. Em nenhuma delas as regras da etiqueta encobriram o escândalo. No barco, a ex-mulher ciumenta se joga no rio. No baile, a mãe da debutante é pega em flagrante adultério pelo marido e a cerimônia termina em pizza.
Surpreendentemente, a paisagem urbana e a comédia não dispensam o exotismo do rio, canoas, teares e garimpeiros politizados que protestam contra intoxicação sofrida por culpa da mineradora.
O tom de turismo ecológico aliado a um discurso conciliador e politicamente correto parece emprestado de "O Rei do Gado". Ou talvez já seja norma da casa.

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