São Paulo, terça-feira, 8 de outubro de 1996
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Kesey volta como contador de histórias

FREE-LANCE PARA A FOLHA; , EM SAN FRANCISCO

ADRIANE GRAU
O eterno líder dos Merry Pranksters e consagrado escritor Ken Kesey voltou a San Francisco (Califórnia) para mostrar que a contracultura não acabou.
O palco do Maritime Hall se iluminou com cores psicodélicas e a platéia se vestiu com "tie-die" (roupas multicoloridas manchadas com água sanitária) para ver Kesey chegar numa réplica do ônibus "Furthur".
Numa performance única, ele e a banda Jambay sacudiram as cabeleiras de 500 hippies atemporais.
Ken Babbs, melhor amigo de Kesey, foi o mestre de cerimônias num show que incluiu música, projeção de filmes de "acid test" dos Pranksters e de leitura de trechos de seu diário, "Cut the Mother Fuckers Loose", que será lançado no ano que vem.
Em seguida, no camarim lotado de fãs e amigos que pareciam saídos de um documentário sobre os anos 60, Kesey recebeu a reportagem da Folha.

Folha - O sr. acha que para mudar o rumo das próximas eleições bastaria uma trupe pregando do alto de um ônibus?
Ken Kesey - Não, tudo mudou. Hoje tenho muito em comum com os republicanos. Bill Clinton experimentou maconha e não engoliu. Eu experimentei o homossexualismo, mas juro que também não engoli (risos). Estava louco por uma chance para usar essa piada...
Folha - Então o sr. continua um rebelde?
Kesey - Sim. Mas o que preocupa os republicanos é que sou um pai de família. Todos os meus filhos fizeram faculdade e somos muito unidos, sou casado com a mesma mulher há 40 anos e nós juntos tocamos uma fazenda. Somos uma família americana. Mas, como sou usuário de drogas, eu deveria estar morto, com a família caindo aos pedaços.
Folha - Qual é seu apelo junto a fãs que nem eram nascidos quando o sr. foi preso, nos anos 60?
Kesey - Sou um mágico, uso truques de ilusionismo. Isso encanta as pessoas. Mágica tem tudo a ver com fazer rock e contar histórias. Não tento mudar o ponto de vista de ninguém. Destruir ou criar polêmicas não é minha intenção. Só quero entreter, divertir.
Folha - Mas não é importante levar uma mensagem política?
Kesey - Nem sempre. É como Jerry Garcia (líder do Grateful Dead, que morreu no ano passado). Nunca se viu ele fazendo canções de protesto ou abraçando causas. Tudo que ele fez continha valores pessoais e muitos não entendem isso a seu respeito. A maneira como expressava suas emoções era o que tinha de melhor.
Folha - É assim com o sr. também?
Kesey - Sim. Não tenho as pessoas como ídolos e sim como aliados. Mais ainda. Gosto de guerreiros. Tento descobrir quem são eles e tento me tornar o mesmo. Para mim é mais importante ser um guerreiro que ser rico, famoso.
Folha - O sr. poderia dar exemplos de "guerreiros" que admira?
Kesey - Joan Baez. Ela apóia as causas mais nobres, esteve até na Bósnia. Minha mulher ensina na escola de domingo e é muito boa nisso. Prepara as aulas assim como prepararia um discurso para a ONU. Jambay sabe preparar um ritual.
Folha - O sr. ainda usa drogas?
Kesey - Não tomaria mais tanto ácido de maneira alguma, só porque sou mais ocupado agora. Mas toda Páscoa nós vamos ao topo de uma montanha e tomamos LSD.
Folha - "Nós" quem?
Kesey - Eu, minha família, meus velhos chapas... Minha mãe.
Folha - O sr. dá ácido para a sua mãe?
Kesey - Ah, sim. Venho de uma boa família. Ela tem 79 anos.
Folha - Como o sr. encara a maneira como Timothy Leary decidiu tornar pública sua morte?
Kesey - Achei de uma coragem tremenda, bem-humorada, sensata e com classe. Foi sua melhor cena.

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