São Paulo, segunda-feira, 21 de outubro de 1996
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De tanto fuçar, micro vira profissão

SILVIA RUIZ
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil tem seus candidatos a Bill Gates. A maioria deles tem pouca idade e histórias muito parecidas. Começaram a mexer no computador por brincadeira e, de tanto fuçar nas máquinas e devorar manuais de programas, se transformaram em feras da informática.
André Uratsuka Manuel, 20, começou a brincadeira no micro do pai, aos oito anos. "Eu usava os joguinhos e comecei a fazer alguns programas simples." Lia "todos os manuais que caíam na mão".
Quando entrou na Poli (Escola Politécnica da USP) para estudar engenharia eletrônica, já dominava o assunto. Foi então cuidar da rede da Escola do Futuro, na USP.
Há menos de um ano, montou uma empresa com mais três amigos da USP. Especializados em projetos de redes e design de páginas para a Internet, os garotos já têm dez funcionários e atendem à grandes empresas, como a Editora Abril, a Tec Toy e a Philips.
"Enquanto tem gente que brinca com figurinhas, a gente mexe com computador e trabalha com o que gosta", diz André.
Melhor site do mundo
Um dos sócios de André, Rodrigo Siqueira, 26, acaba de voltar da França, onde foi receber um prêmio dado pela Unesco e pelo Centro de Pesquisas Científicas da França. Seu site pessoal na Internet foi premiado como o melhor do mundo. Com quase mil páginas (www.lsi.usp.br/usp/rod/), o site tem de música indiana a poemas de Fernando Pessoa. Rodrigo, que na última semana deu entrevista ao jornal francês "Libération", diz que "faz o trabalho porque gosta, e não por dinheiro".
A informática entrou na vida de Murilo Hallgren, 16, de uma forma inusitada. Aos nove anos, ele passeava de bicicleta quando encontrou uma calculadora programável em plena rua. "Comecei a brincar, fazendo algumas programações e depois fui fazer um curso", conta ele. Em 94, foi fazer colegial técnico em mecatrônica e descobriu a Internet.
Hoje trabalha no RNP (Rede Nacional de Pesquisa), onde cria páginas e faz programações para a rede mundial. Também é um dos responsáveis pela montagem do Yahi?, ferramenta de busca de endereços brasileiros na Internet.
Murilo diz que passa cerca de 12 horas por dia no terminal e ganha pouco mais de R$ 1.000 por mês.
Caçador de vírus
Horus Ricardo Junoy, 19, chega a faturar até R$ 2.500 por mês dando assistência técnica para empresas e particulares. Apesar de ter feito colegial técnico em processamento de dados, ele diz que "aprendeu tudo na prática, o curso só dá respaldo teórico."
O profissional entrou no mundo da informática aos 14 anos, brincando no computador de um amigo. "A gente ficava jogando e caçando vírus. Quando quebrava, a gente abria a máquina e tentava ver o que tinha de errado."
Henrique Pantarotto concorda que é fuçando que se aprende. Ele tem computador em casa desde os 6 anos. Aos 16, já estava montando seu próprio sistema de troca de mensagens -"de brincadeira". Agora, aos 18, começou a levar o negócio mais a sério. Entrou como sócio em um novo BBS, com 30 linhas disponíveis.
Laboratório de feras
Boa parte dos garotos que estão se destacando no mundo da informática saíram do LSI (Laboratório de Sistemas Integrados da Escola Politécnica da USP). Os alunos, monitorados por professores, fazem pesquisas principalmente na área de informática. Segundo Marcelo Zuffo, um dos coordenadores, o LSI tem uma política de iniciação científica que tem a ambição de formar futuros "Bill Gates". "Essa é a nossa intenção", diz ele.

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