São Paulo, terça-feira, 22 de outubro de 1996
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Artistas se apropriam da mídia

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

O Museu Guggenheim de Nova York reabriu recentemente sua sede no bairro do Soho com a exposição "Mediascapes", dedicada a explorar as relações entre tecnologia e cultura no mundo contemporâneo.
Thomas Krens, diretor da Fundação Guggenheim, abre o catálogo chamando a atenção para o fato de que a distribuição em massa de equipamento de vídeo e computador vem transformando as formas de produção cultural.
O número significativo de trabalhos que fazem referência à televisão, ao vídeo ou ao computador tanto na Bienal quanto na mostra "Antarctica Artes com a Folha" confirmam o esforço de inúmeros artistas em se apropriarem dos novos recursos tecnológicos para elaborar novas formas estéticas.
Mas quantidade aqui não se traduz em impacto artístico. Basta notar que, apesar do peso numérico óbvio de trabalhos que incorporam a tecnologia eletrônica nas duas exposições, com raras exceções, pouco se falou sobre eles.
Na linha da videoinstalação, esses trabalhos envolvem a busca de formas de representação estética. Trata-se de dar conta das modificações nas noções de tempo e espaço que os avanços tecnológicos sugerem. A tarefa não é fácil.
Em geral, os artistas têm procurado assumir uma posição crítica frente ao monitor e à imagem de TV, que constituem sua matéria-prima. O resultado muitas vezes redunda em um distanciamento excessivo e frio, incapaz de questionar minimamente a força e a intimidade conquistadas pela TV junto ao espectador.
Televisores aparecem como cenário no meio de detritos. Aqui a crítica é fácil e repetitiva.
Televisores são utilizados para transmitir longos trabalhos em vídeo. Esses requerem uma atenção especial por um período de tempo pré-determinado pelo artista, mas de que o espectador nem sempre dispõe no espaço de um museu. A trilha sonora parece sempre a mesma ficção científica.
Os artistas que mais emocionam são os que questionam em alguma medida a imaterialidade da imagem. Na Bienal, a instalação de Éder Santos merece destaque pelos esforços do artista mineiro em associar o vídeo a texturas pesadas.
A instalação "Quiasma", do colombiano José Alejandro Restrepo, usa quatro monitores de vídeo ligados por muitos fios -aparelhos disseminadores da imagem eletrônica aqui corporificam o aparelho biológico da visão.
A instalação do romeno Alexandre Patatics problematiza as várias camadas que podem constituir a imagem de vídeo, terminando com a incorporação da imagem do próprio espectador.
Na mostra "Antarctica Artes com a Folha", destaca-se o trabalho interativo de Fábio Carvalho, que absorve figuras meio fantasmagóricas dos espectadores gravadas por uma câmera fixa.
A instalação de Kiko Goiffman e Alberto Alves usa quatro monitores que exibem programas diferentes. Os vídeos são individualmente interessantes, mas o trabalho exige atenção conflitante com seu contexto de exibição.
Para o diretor da Guggenheim, estaríamos vivendo um momento histórico semelhante à renascença italiana na sua confluência de ciência, arte e humanidades. A caracterização pode ser exagerada. Mas deposita uma expectativa inédita no formato pouco nobre da mídia.
A videoarte desafia a maravilhosa possibilidade de contemplação que a arte nos suportes clássicos propicia. Não possui "aura", nos termos de Walter Benjamin.
Dispersa a visão, desvela sequências de imagens que demandam tempo e perturbam o olhar concentrado. Exige simulação espacial e pode envolver a interatividade. Por tudo isso, exige convenções estéticas que precisam ser buscadas com maior agressividade.

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