São Paulo, quinta-feira, 31 de outubro de 1996
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O bom técnico de futebol é o que não aparece

JOSÉ GERALDO COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A saída do técnico Carlos Alberto Parreira do São Paulo traz à tona um problema crônico do futebol brasileiro -a alta rotatividade de técnicos-, mas põe em relevo também uma questão mais recente, a da supervalorização do papel do treinador.
Por um lado, cobra-se muito do técnico. Se um time grande perde duas partidas seguidas, já se configura uma situação de crise: pressões da torcida, da imprensa, da diretoria. O bode expiatório é o técnico.
É evidente que isso está errado. No caso de Parreira, se o São Paulo o contratou, há alguns meses, foi por considerá-lo um profissional competente, capaz de colocar o clube entre os melhores do país.
Os dirigentes tricolores não estavam contratando um desconhecido, cujo trabalho seria imprevisível. Sabiam muito bem quem é Parreira, como é seu método de trabalho e o estilo de futebol que lhe agrada.
Conheciam também (ou deveriam conhecer) os jogadores que o técnico teria em mãos e podiam prever se esse grupo era ou não compatível com sua filosofia de trabalho.
Se houve erro, portanto, não foi de Parreira, que é o mesmo desde sempre, mas de quem o contratou.
A questão é anterior. Por que se contratou Parreira, sobretudo depois de cinco anos de reinado de um técnico que é seu antípoda, Telê Santana?
Minha interpretação para o mistério é a de que as contratações de técnicos têm se revestido, em muitos casos, de jogadas de marketing. Qual era o nome, a "marca" nacional que tinha peso equivalente ao de Telê no futebol de hoje? Parreira, claro. Campeão mundial em 94, Parreira é, indiscutivelmente, um "nome" -ainda que esteja longe de ser uma unanimidade.
Para efeito de jogar poeira nos olhos da torcida, um nome é sempre um nome.
É evidente que se, em vez disso, os cartolas do Morumbi estivessem mais interessados no desempenho futebolístico do time, teriam mantido Muricy Ramalho como técnico e economizado um bom dinheiro.
Senão, vejamos: Muricy sempre pegou o São Paulo em momentos difíceis, com grupo desfalcado, colocações ruins etc. E sempre conseguiu recuperar a dignidade do time.
O último Campeonato Estadual é um exemplo. O São Paulo começou a competição como "a quinta força do futebol paulista", atrás de Palmeiras, Corinthians, Santos e Portuguesa. Terminou o campeonato como vice, atrás apenas do então imbatível Palmeiras.
Será Muricy um gênio? Não. Simplesmente é um profissional sério e discreto, que conhece seus jogadores e sabe criar condições para que façam o que sabem: jogar futebol.
Numa entrevista que me concedeu, o poeta João Cabral de Melo Neto -que jogou no juvenil do Santa Cruz de Recife- declarou-se admirado com a importância que se dá hoje aos treinadores. "Antigamente, a gente nem sabia o nome do técnico."

Matinas Suzuki Jr., que escreve às terças, quintas e sábados, está em férias

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