São Paulo, sexta-feira, 1 de novembro de 1996
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Queda do avião da TAM leva colega classe A

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

O último contato que tive com a jornalista Regina Lemos Valério, 47, foi uma ida e vinda de abraços, enviados cerca de duas semanas atrás por meio de colegas.
Me diziam que nos últimos tempos ela voltara a ter gosto pela vida. Tinha acabado de peitar mais um desafio profissional, o lançamento da revista feminina "Mais Vida", mencionada, por coincidência, neste espaço na semana em que Cláudia Liz entrou em coma por se tratar de uma nova proposta editorial, que não privilegia modelos com look de vítima da anorexia.
Sempre fui com a cara de Regina. Notável exceção nas redações de revistas femininas, onde o que mais se encontra são duas variações do mesmo tema, a cabeça de vento e a cabeça de vento peçonhenta, ela era conhecida profissionalmente pelo prazer que todos tinham em trabalhar com ela. Era correta, rápida no gatilho e uma editora eficientíssima, como fui descobrir nos primeiros tempos da "Elle", onde fui sua subordinada.
Se bem me lembro, uma das últimas vezes que nos falamos foi em junho de 1994, quando liguei para agradecer o bilhete que ela me enviara, comentando a coluna que escrevi sobre o assassinato de seu marido, o publicitário Antonio Valério, morto a tiros por um adolescente (que aliás, sumiu do mapa), ao apartar uma briga na lanchonete New Dog.
Apaixonadíssima pelo marido, mais jovem do que ela, Regina só conseguiu superar o trauma transformando sua tragédia pessoal em campanha contra o desarmamento da população.
Recentemente, aderiu também ao movimento Reage São Paulo e estava a mil por hora com a nova revista, que nem bem completou três meses e já é um sucesso editorial.
E foi justamente para divulgar esse sucesso no Rio que ela tomou o vôo 402 da TAM.
Regina era dona de um senso de humor apurado.
Me lembro que costumávamos gargalhar na redação da "Elle" a ponto de ela ter de tapar minha boca com a mão, para que a gandaia não se instalasse de vez no ambiente de trabalho.
Ontem, a maioria dos colegas que me ligou para lamentar sua morte, mencionou a palavra "karma". Não sei, não. Talvez essa noção de "karma" só exista mesmo para que se possa aceitar a morte de gente batuta como Regina Lemos.

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