São Paulo, sexta-feira, 1 de novembro de 1996
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Gabriela Sabatini deixa o tênis para ser feliz

DANIEL FIDALGO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Gabriela Sabatini acompanhava sempre seu irmão, Osvaldo, um de meus alunos de tênis nas quadras do River Plate. Ela ficava ali, quietinha, observando todos os movimentos feitos nos treinos.
Tinha então seis anos. Depois, se aventurou a repetir o que via. A timidez que carregou por toda sua carreira a fez procurar um paredão.
Um dia, eu estava andando pelo clube e percebi Gabriela batendo bola contra a parede. Com a direita, chegava a bater 20 vezes sem errar, mas, quando a bola ia para seu lado esquerdo, deixava a raquete e pegava a bola com a mão.
Eu me aproximei dela e disse que iria falar com seus pais para que a matriculassem no curso. Os pais relutaram, mas, antes de completar sete anos, Gabriela já começava a ser uma tenista.
Primeiro, eu a ensinei a bater de backhand. Depois, procurei transmitir todas as técnicas do tênis clássico. Minha preocupação era passar para ela todas as variações de golpes e jogadas. Ela assimilava muito rápido a técnica e mostrava muita capacidade física.
Gaby estava sempre à frente de sua idade. Quando tinha oito anos, jogava contra garotos de dez. Aos 12, vencia torneio para jogadoras de até 18.
É provável que sua única deficiência tenha sido o saque. Entreguei-a ao profissionalismo com essa fragilidade. Ela foi melhorando o fundamento, porém nunca chegou a aprimorá-lo o suficiente para as exigências do tênis atual.
Além da técnica, Gaby contava com essa vontade permanente de vencer. Por vezes, nós estávamos já no final de horas de treino, e eu propunha uma partida. Quem vencia ganhava uma barra de chocolate.
Mesmo cansada, ela, que era bem franzina, partia para o jogo com tudo atrás do prêmio.
Talvez essa garra a tenha abandonado nos últimos tempos. Já não desfrutava do jogo, e os últimos resultados a distanciaram mais do esporte.
A notícia da sua retirada me chocou. Não pensava que poderia ser tão rápido, afinal ela tem 26 anos e não teve lesões sérias. Mas a sua magia se tornou tristeza. E a decisão de abandonar as quadras a fazia muito feliz. Isso ela confessou em uma ligação telefônica que me fez apenas uma hora antes do pronunciamento de sua retirada, em Nova York.
Pode ser que ela inicie uma carreira artística. Seu irmão, aliás, deixou o tênis para começar um curso de teatro.
Agora, é galã de telenovela. Gabriela pode estar influenciada por ele. Mas também poderia virar cantora. Eu me lembro que ela vivia cantando quando estava em excursão. Ela, em uma primeira impressão, parece muito séria -forma de ser que, na verdade, esconde sua extrema timidez.
Essa característica é comum entre os tenistas. Um temperamento talvez necessário para um esporte individual que põe jovens atletas em um ambiente de muita pressão. Por isso, a princípio, todos os tenistas parecem iguais. É preciso conhecê-los bem para descobrir como realmente são.
Eu tive a sorte de acompanhar sua vida e, agora, torço para que, em meio a suas novas atividades, encontre um tempo para passar sua vivência para os jovens tenistas da Argentina e do mundo.

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