São Paulo, domingo, 3 de novembro de 1996 |
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Cenário de tragédia vira 'rua dos milagres'
AURELIANO BIANCARELLI
Para os que estavam em terra, no entanto, o que houve foi um milagre: o avião atingiu dois prédios e oito casas, destruindo completamente quatro delas. As chamas desceram por 300 metros e explodiram 14 carros. Na rua moram mais de uma centena de pessoas. Até a madrugada do sábado, apenas uma delas, o professor Marco Antonio Oliveira, tinha sido dada por morta (leia texto na página). Oito pessoas ficaram feridas e foram hospitalizadas. Se o avião tivesse caído uma hora antes, poderia ter matado dezenas de pessoas. O mais jovem entre os sobreviventes da tragédia da "rua dos milagres" foi o bebê Danilo Ferreira Manes, de 1 ano e 7 meses. Ele dormia nos fundos da casa de número 125 quando o avião caiu. A turbina direita e uma parte do nariz azul da aeronave ficaram na sala da casa. Pela única janela que restou na casa, a empregada Guacira Honório Reis, 42, pedia aos gritos que salvassem o bebê. Guacira passou sobre corpos ao lado da turbina em chamas até chegar no quarto dos fundos. Agarrou o bebê e não encontrou para onde correr. "Eu gritava para que passassem o Danilo pelo vitrô, mas ele não cabia", conta a avó Vanda de Calazans Almeida, 76. Guacira e o bebê foram retirados com a ajuda de vizinhos pelo muro dos fundos. Guacira estava sozinha com Danilo em casa. Seus pais, a professora Eva Ferreira Manes, 34, e o pai Arnaldo Tadeu Manes, 32, estavam no trabalho. O irmão Daniel, 6, já estava na escola. Dois canários A avó Vanda mora na casa ao lado, de número 121, que também foi completamente destruída. Na mesma casa moram a tia-avó de Danilo, Elvira de Calazans, 78, e o tios Ricardo, 24 e Renata, 27. Nas duas casas vizinhas ainda estavam três cachorras, dois canários e um jabuti. Só os canários, Vandinha e Ciso, morreram no acidente. A última a ser resgatada, 30 horas depois da queda do avião, foi o jabuti Magrela. As cachorras escaparam. Megg saiu na hora do fogo, Xuxa foi encontrada pela rua na sexta-feira, e Kika foi retirada pelos bombeiros. Kika é a mais velhinha, não enxerga nem ouve mais. O menino Daniel não voltou mais para ver a casa. Foi levado com a família para o sobrado de parentes no bairro. "Não quero que ele guarde essa imagem", disse o pai na sexta-feira diante dos escombros. Para retirar a turbina do local onde era a sala, foi preciso derrubar a única parede da frente. Nos fundos só restou o quarto onde dormiam as crianças. Daniel já sabe que um avião caiu na sua rua e que sua casa foi derrubada. Sua mãe conta que o menino tem dormido agitado, falando durante a noite. "Ele diz que o piloto não sabia dirigir." Daniel diz que não tem medo de aviões no céu, mas faz um não com a cabeça quando perguntam se gostaria de viajar em um deles. "Não, não", ele repete. As tias-avós Vanda e Elvira, as duas enfermeiras aposentadas, não sabem como conseguiram sair da casa. "Foi o Ricardo e uns vizinhos que nos salvaram." Emocionadas, elas choram olhando o bebê Danilo e a cachorra Kika no colo. Ricardo, operador de informática, é espírita e diz que estava rezando no momento em que o avião caiu. "Fomos ajudados por Deus", afirma. Sua irmã Renata Lúcia, que também morava na casa, terá de adiar o casamento marcado para o início do ano. O fogo queimou todo o enxoval que já tinha comprado e destruiu parte do material de construção. Texto Anterior: Chega a 69 o número de corpos de vítimas reconhecidos Próximo Texto: Grupo faz vigília por professor Índice |
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