São Paulo, terça-feira, 5 de novembro de 1996
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Freios na economia, "loucura coletiva"

ALOYSIO BIONDI

As importações cresceram, surgiu um "rombo" na balança comercial, os economistas voltam a falar na necessidade de "colocar freios" na economia, para reduzir as compras no exterior. A proposta é inaceitável, pelo fato puro e simples de que a origem do salto nas importações não é o crescimento (qual?) da economia, como ocorria no passado. Hoje, ele se deve ao escancaramento do mercado, promovido pelo governo FHC.
Essa verdade óbvia já está retratada até em estudos oficiais, mas os economistas de Brasília se recusam a enxergá-la. O espantoso é que a sociedade, empresários e trabalhadores, classe média e povão, parece disposta a aceitar bovinamente novas medidas para agravar a recessão.
Endeusados como sábios, os economistas são capazes de cometer erros monumentais, prejudicando centenas de milhões de pessoas durante anos a fio. O exemplo mais gritante dos erros cometidos por economistas, e a "loucura coletiva" que leva a sociedade a aceitá-los, são, certamente, as análises e políticas de governo surgidas com a crise do petróleo no começo dos anos 70.
Pode-se dizer que, naquele período, toda a população do planeta pagou um preço desnecessário, com recessão e miséria, devido aos "chavões" dos economistas, transformados em modismos incontestados.
O grande equívoco
A triplicação dos preços do petróleo, na década de 70, provocou rombos da ordem de centenas de bilhões de dólares, sobretudo nas contas dos países ricos -dependentes da importação do produto-, desviados para os cofres dos "árabes" exportadores.
A economia mundial sofreu um terremoto, e os economistas previram que a crise seria interminável. Razão do seu "raciocínio": os países "árabes" estavam em um estágio de desenvolvimento muito atrasado, pouquíssimos estavam industrializados e, por isso, não iam gastar os dólares recebidos, isto é, comprar produtos, máquinas, equipamentos dos países ricos -"devolvendo-lhes" os dólares e restabelecendo o equilíbrio em suas contas.
Essa análise, convertida em "dogma da moda", como sempre acontece com os economistas, foi endossada até por organismos mundiais como o Fundo Monetário Internacional (para quem duvidar, basta ler os seus relatórios anuais da época).
A sociedade engoliu a falação dos economistas. Resultado: o "modismo" agravou e prolongou a crise mundial, pois os governos de todos os países compradores de petróleo tomaram medidas para "esfriar" a economia e cortar as importações de outros produtos. Consequência óbvia: a redução nas importações significou igual redução nas exportações dos países fornecedores, e generalizou-se a retração na economia mundial.
Um caso de "loucura coletiva". O diagnóstico dos economistas estava totalmente equivocado. Na verdade, há muitos anos os "árabes" vinham traçando planos gigantescos para industrializar e modernizar suas economias -vale dizer, para importar máquinas, equipamentos, peças, componentes dos demais países. O Irã, sozinho, tinha um plano de investimentos de US$ 35 bilhões, a ser executado em cinco anos.
O caso brasileiro
Há estudos do próprio governo mostrando que o salto nas importações brasileiras se deve à política de "desindustrialização" da equipe FHC/BNDES. O Brasil está importando não apenas produtos acabados, mas também peças, componentes, e até matérias-primas (madeira, minérios, metais, algodão etc.), com a destruição de empresas e empregos.
É ridículo, por isso mesmo, o diagnóstico de que o "rombo" da balança comercial exige novo "esfriamento" da economia. Diagnóstico errado, terapia errada. A sociedade brasileira não deve embarcar nesse "modismo". Deve exigir revisão total da política atual.
Em tempo: é grotesco propor "esfriamento" da economia, como se ela estivesse aquecida. Em setembro, as vendas da indústria ao comércio caíram 0,3% na comparação com agosto. Às portas do Natal. Esfriar o quê?

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