São Paulo, quarta-feira, 13 de novembro de 1996
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Mix Brasil veta vídeo sobre casamento gay

ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL

A curadoria do 4º Mix Brasil decidiu deixar fora do festival o vídeo "Útera - A Noiva do Baú" por julgá-lo "desinformativo e preconceituoso em relação à união civil de pessoas do mesmo sexo".
O artista plástico mineiro Flávio Ferraz, diretor da produção, protesta. Diz que, em nome do politicamente correto, os organizadores do Mix estão praticando censura.
A quarta edição do festival começou no último dia 7 e termina amanhã. Entre filmes e vídeos, trouxe para São Paulo 83 produções de 12 países, todas com temas relativos à sexualidade.
No domingo passado, promoveu um debate sobre o projeto de lei número 1.151, que pretende regulamentar o "casamento gay".
A proposta, da deputada federal Marta Suplicy (PT-SP), está em discussão numa comissão especial da Câmara.
Se virar lei, possibilitará que casais do mesmo sexo desfrutem de prerrogativas civis até agora restritas às uniões heterossexuais -como o direito à herança do parceiro.
A própria deputada explicou o projeto durante o debate no Mix, que reuniu cerca de 170 pessoas.
Pensão
O vídeo de Ferraz aborda o assunto em tom de piada. Foi gravado há três meses na zona da mata mineira, tem 11 minutos e mistura a linguagem dos contos de fadas com a das pornochanchadas.
Logo de cara, um narrador dá o mote da história: "Enquanto em Brasília senadores e deputados se rasgam na maior ferveção para aprovar uma polêmica lei, num reino encantado das Minas Gerais a coisa pega, o bicho come".
Surgem, então, dois rapazes -sem camisa e de sunga- que passam parte dos 11 minutos disputando um baú. Às tantas, fazem as pazes e resolvem compartilhar o objeto da discórdia.
É quando o baú se abre e, de dentro, sai uma noiva drag, que reclama: "Essa história de casamento gay é uó. Vai dificultar a vida da gente. Imagina só! A bicha se encanta com o bofe e aí se casa, linda e maravilhosa. Dois anos depois, o bofe quer divórcio. Lá vai a pobrezinha da bicha pagar pensão para o ex-marido. Não tô podendo".
Ferraz, 46, esclarece que a "historinha" brinca "com a monogamia, o golpe do baú e outros conceitos tradicionalmente associados à união heterossexual".
"É só uma sátira", diz. "Quando mandei o trabalho para o Mix, desejava estimular a discussão sobre como o casamento gay irá funcionar na prática. Não estou condenando o projeto da deputada. Estou apenas olhando uma questão polêmica com irreverência."
O organizador do festival, André Fischer, 31, argumenta que não tem nada contra "o escracho".
Mas pondera que, "neste momento, às vésperas de a Câmara votar a proposta", o Mix Brasil não pode "se dar ao luxo de reforçar preconceitos e confundir as pessoas". "O vídeo ficou de fora por critérios de curadoria, não por censura."
Para Fischer, "Útera" desinforma. "O projeto não fala em pensão obrigatória, como o vídeo faz crer. Ao contrário. Permite que os parceiros rompam o contrato de união civil sem ônus financeiro tão logo a relação amorosa termine."

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