São Paulo, sexta-feira, 15 de novembro de 1996
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O time de futebol divino já está no céu

ROBERTO PETRI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Quem lembra chora. Solta logo uma lágrima dolorida.
Duas semanas atrás, partiu Roberto Belangero, o "Micha" do Maria Zélia, produto autêntico da velha várzea paulistana.
Aquele volante classudo, personalista, que estufava a bola no peito, erguia a cabeça e passava com arte.
Ele foi tão grande que, já rodado, jogou pelo Newell's Old Boys e deu tantas cátedras que os argentinos ainda o lembram como "fenômeno".
*
Quem recorda não aguenta. Deixa rolar outra lágrima sentida.
Agora pelo "Pai da Bola". Uma semana depois, Waldemar Fiume nos deixava, levando um pouco de todos que tanto o vimos em tardes ensolaradas no Pacaembu, com concha acústica, seu palco preferido para anular Ademir de Menezes, Pinga ou Ponce de Leon (três que viajaram primeiro).
Esse foi outro oriundo dos campos de várzea do Glicério, em anos áureos que não voltam mais.
*
O tempo passa, implacável. E vai levando nossos ídolos de infância.
Aqueles mesmos das figurinhas "Balas Futebol". Em períodos curtos, tristes notícias se repetem.
Quando não por morte natural, um choque como aquele que nos deu o goleiro Castilho, jogando-se, inexplicavelmente, de uma janela.
Junte-se Everaldo e os que desapareceram em trágicos acidentes.
A "seleção do céu" fica cada vez mais forte.
Danilo Alvim já está lá, junto de Jaime de Almeida, recordando os Campeonatos Sul-Americanos da década de 40.
E Garrincha, o maior de todos, deve estar feliz, caçando passarinhos entre as nuvens.
E se ali, ao lado de Deus, houver mesmo o projeto divino de se formar uma seleção de cada país, por certo a do Brasil já teria Osvaldo Brandão como treinador e Vicente Feola como supervisor.
Aquilo que não aconteceu na terra em 1958, talvez por culpa de um regionalismo mais forte do que o atual, finalmente se daria (a idéia inicial de Paulo Machado de Carvalho teria sido essa, e só ele poderia confirmar, também lá do além).
Aí, então, o velho "Caçamba", com aquela franqueza que pautou sua vida, repararia todas as injustiças terrenas.
Até como um prêmio por todos terem passado direto pelo aval de São Pedro.
E anunciaria a seguinte escalação: Castilho; Zezé Procópio, Djalma Dias, Waldemar Fiume e Oréco: Roberto Belangero e Rafael Chiarella; Garrincha (esse o único insubstituível), Pagão, Toninho Guerreiro e Canhoteiro.
Romeu Pelliciari, Waldemar de Brito, Tim, Fausto, Isaias, Lelé, Pirilo, Heleno, Russo, Hércules, Jurandir, Fried, Feitiço, Heitor, Neco, Bianco e dezenas de outros certamente entenderiam as justificativas da comissão técnica e iriam, felizes, torcer nas arquibancadas.
*
O árbitro seria, claro, João Etzel Filho (não houve ninguém melhor).
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P.S. - E que venha a seleção do inferno, com Dante Alighieri a tiracolo...

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