São Paulo, sexta-feira, 22 de novembro de 1996
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Rio 2004 vai sobrar para contribuinte carioca

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

O Rio de Janeiro e todos aqueles que estão torcendo para que a Olimpíada 2004 seja realizada na cidade maravilhosa que me perdoem, mas não consigo me empolgar com a candidatura carioca.
Não só pelo fato de o Brasil não estar preparado para receber turistas estrangeiros ou porque um país que investe menos em saúde e educação do que outros mais pobres não mereça sediar uma Olimpíada.
Mas como é que se pode pensar em Jogos Olímpicos em uma cidade que tem 4.000 pessoas morando em áreas de risco nas encostas dos morros; que tem uma clínica como a Santa Genoveva; que é dominada pelo jogo do bicho, pela polícia corrupta, pelo tráfico de drogas, pelos sequestros e pelas balas perdidas?
"Ah, mas nós somos um país hospitaleiro, somos a gente mais alegre do mundo!", dirão os ufanistas. Balela! Hospitaleiro é o país em que o turista só começa a ser roubado no táxi do aeroporto e não pelo carregador de bagagens, minutos após o desembarque. Hospitaleiro é o país em que se pode ao menos sair do hotel e atravessar a rua de relógio e máquina fotográfica a tiracolo.
Alegres, somos, sim. Mas prefiro o tédio islandês à alegria promovida pelos agentes federais que deram aquela surra na cantora Paula Toller no aeroporto de Cumbica. Lembra?
Prefiro bocejar até morrer em Nêuchatel, na Suíça, do que ser vítima da alegria do engarrafamento no qual fiquei presa durante quase três horas, na volta de Jacarepaguá para o Leblon, na corrida de Fórmula Indy no início do ano.
Prefiro congelar em algum fiorde da Finlândia do que participar da alegria dos roubos aos cofres de hotel, que vira e mexe acontecem nas capitais turísticas do país. E prefiro a tristeza de uma noite de inverno sem calefação em Helsinque do que apartar uma discussão de praia entre um funkeiro e um morador da Barra.
E por mais que o Ronaldo Cezar Coelho se esforce, quero ver os 20 delegados do COI acharem que um dos trunfos do Rio é possuir "o maior estádio do mundo". O Maracanã é um estádio ultrapassado, caindo aos pedaços. Seria preciso outros tantos milhões de dólares, além dos que já foram gastos na candidatura, para reformá-lo. Mas, se o contribuinte carioca não se importa em bancar a brincadeira, quem sou eu para contrariar?

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