São Paulo, segunda-feira, 25 de novembro de 1996
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Maria João traz novos sons portugueses

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Paulistas e cariocas poderão comprovar que a música portuguesa contemporânea tem muito mais a oferecer do que as canções delicadas do grupo Madredeus.
O duo da cantora Maria João com o pianista Mário Laginha é a principal atração da Semana de Portugal, que começa hoje em São Paulo (veja a programação em quadro nesta página). Os ingressos custam R$ 15.
"Eu e Laginha estamos cheios de vontade de ir ao Brasil, que é uma referência obrigatória para nós", disse a cantora à Folha, por telefone, em meio à turnê européia que iniciou em setembro.
Consagrada já há alguns anos, no circuito de festivais de jazz, Maria João, 40, mostra uma sensível mudança em seus últimos discos. Se, por um lado, vai se distanciando do jazz mais estrito, por outro lado vem se aproximando cada vez mais da música brasileira.
Em "Danças", álbum de 1994 que também destaca o piano de Laginha, Maria gravou uma versão bastante original de "Saudosa Maloca" (de Adoniran Barbosa).
No recente "Fábula" (Verve/Polygram), que chega ao mercado brasileiro até o fim do mês, ela recria duas canções de Edu Lobo e Chico Buarque: "A Bela e a Fera" e "Beatriz".
"A coisa ameaça crescer. No próximo disco já podem ser três canções", brinca a cantora, excitada com o projeto de gravar um especial com Chico Buarque e Laginha, para a TV portuguesa, em janeiro. "Estou orgulhosa", diz.
Maria ainda fica encabulada quando é mencionado o elogio que recebeu de outro de seus admiradores brasileiros. Caetano Veloso definiu-a como "uma intérprete de jazz como não há, nem nunca houve, no Brasil."
Maria tem consciência de que sua relação com o jazz está se modificando. "Ser uma cantora de jazz é o que está mais próximo daquilo que eu faço, mas hoje já existe muito pouco jazz, no sentido tradicional, em minha música."
Para Maria, o que une sua música ao jazz é a improvisação. "Eu, como o Laginha, seria incapaz de cantar as mesmas músicas, da mesma maneira, todos os dias. É isso que nos liga ao jazz", diz.
Quanto aos shows que fará por aqui, a cantora prefere não antecipar nada. "Nunca digo antes o que vou cantar. Acho que um concerto, como qualquer espetáculo, deve ter um lado de surpresa."
Porém, admite que não vai deixar de mostrar alguma de suas incursões pela MPB. "Adoro a música brasileira, que eu canto com a maior humildade. Espero que gostem de minha interpretação", diz.
Quem conhece os últimos discos de Maria sabe que se pode esperar uma boa dose de variedade. Seu repertório inclui canções folclóricas portuguesas, fados, tangos e improvisos sem palavras.
A trajetória de Maria João é singular como seus solos vocais. Aos 28 anos, ela ainda trabalhava como professora de natação, quando se decidiu a estudar na Escola de Jazz do Hot Club de Lisboa.
Para o teste de avaliação, Maria escolheu "O Cantador" (de Dori Caymmi e Nelson Mota). Tirou essa canção de um LP da brasileira Flora Purim -até então o único disco de jazz de sua discoteca.
Além de cantar tanto a música brasileira como a norte-americana, praticamente sem sotaque, outro traço singular nas performances de Maria é sua postura de palco -fruto da prática de "hai-ki-dô" por 17 anos. "Sou um bocadinho atlética", brinca.
Já o pianista Mário Laginha -parceiro de Maria há seis anos- formou-se na tradição erudita de Bach, Bartok e Ravel, fazendo uma conexão com o jazz de Bill Evans e Keith Jarrett. O que não o impede de se abrir a experiências com a música pop, folclórica ou portuguesa.
"Há muitas influências, muitos caminhos, tantas outras coisas que se pode fazer além de cantar o jazz tradicional", diz Maria.
"Estou à procura de meu caminho, do meu modo especial de dizer as coisas, que é, enfim, a procura de todos os músicos."
O evento Semana de Portugal se repete a partir de amanhã no Rio, no Centro Cultural Banco do Brasil (r. 1º de Março, 66, tel. 021/216-0410), com o concerto de Rodrigo Leão & Vox Ensemble, às 21h. A dupla Maria João e Mário Laginha se apresenta quinta, às 18h30, e sexta, às 21h. Os ingressos custam R$ 6.

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