São Paulo, sábado, 30 de novembro de 1996
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BEBENDO VENENO

É preciso investigar a eventual relação entre os altos índices de suicídio em lavouras de fumo e o uso de determinado tipo de agrotóxico (os organofosforados). São preocupantes tanto a constatação médica de que tais produtos interferem em processos neurológicos responsáveis pela depressão como a informação de que várias regiões onde existe esse tipo de atividade têm índices de suicídio muito superiores à média nacional.
Os dados publicados ontem por esta Folha revelam o grave descuido no trato de produtos venenosos na agricultura. O fenômeno dos suicídios foi identificado em áreas produtoras de fumo de Estados tão diferentes quanto Alagoas e Rio Grande do Sul.
A média desse tipo de morte em todo o Brasil é de 3,9 por 100 mil habitantes. Na região do Vale do Rio Pardo (RS), a cidade de Candelária registrou taxa de 25,9 por 100 mil entre 1990 e 1994. Em Venâncio Aires, a taxa foi de 20,3 por 100 mil.
Em Arapiraca (AL), onde a Bayer S.A. anunciou recentemente ter retirado do mercado o agrotóxico Tamaron depois que 28 pessoas se mataram ingerindo o produto nos últimos 11 meses, o índice de suicídios está em 16 por mil este ano.
Investigações rigorosas precisam explicar se essa coincidência é fruto do acaso ou se de fato existe aí uma relação. Mas, de qualquer forma, não restam dúvidas quanto à falta de precauções na manipulação de produtos altamente tóxicos. Pessoas que trabalham desde os oito ou mesmo cinco anos de idade, trabalhadores que se intoxicaram seguidas vezes e têm acesso difícil a hospitais ou centros médicos parecem revelar mais uma regra do que uma exceção.
Não chegam a ser novidade as situações de pobreza e miséria ou a extrema precariedade dos serviços sociais no campo brasileiro. Mais do que fenômenos isolados, a elevada incidência de intoxicações e suicídios no país é um grave problema de saúde pública. Coloca claramente em xeque a utilização intensiva e indiscriminada de agrotóxicos.

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