São Paulo, sexta-feira, 6 de dezembro de 1996
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Fina Torres faz boa comédia com o sonho latino-americano

CELSO FIORAVANTE
DA REPORTAGEM LOCAL

O filme francês "Mecanismo Celeste" não poderia ser mais latino-americano. Explica-se. Dirigido pela venezuelana Fina Torres, trabalha com as mais diversas características culturais dos imigrantes em Paris, mas sempre em tom de comédia.
O filme até começa com uma ameaça de denúncia social, ao mostrar, na alfândega do aeroporto, um negro sendo levado à força por policiais. Na sequência seguinte, a própria protagonista Ana Mendoza é avisada, em tom ameaçador, de seu limite de dois meses de permanência na França.
A primeira característica é a famosa solidariedade latina. Venezuelana que é, bate na porta de venezuelanas que nem conhece e é recebida de braços abertos.
A partir daí o filme se torna um conto de fadas contemporâneo, com direito a mocinha bonita com um belo ideal, bruxa malvada, príncipe encantado e muitos animaizinhos do bem.
A mocinha é a venezuelana Ana Mendoza, que, intempestivamente, larga seu noivo na igreja e foge para Paris, de vestido de noiva e tudo, para realizar seu maior sonho: se tornar cantora de ópera. É interpretada pela belíssima espanhola Ariadna Gil, que já apareceu em "Sedução - Belle Époque", "Os Piores Anos de Nossas Vidas" e "Libertárias".
A bruxa é Celeste, que vai usar de todos os artifícios para tomar o lugar de Ana nesse conto de fadas. O príncipe é Italo Medici, um diretor de cinema da moda que precisa de uma cantora para estrelar sua montagem de "Cinderela".
As obviedades terminam aí, já que a diretora Fina Torres consegue imprimir em seu enredo muito do que a América Latina tem de bom e deixar para trás o que o cinema tem de ruim.
Lá tem realismo fantástico, como no garçom que tem visões e na poção milagrosa que faz com que os desejos se concretizem.
Tem o sincretismo religioso, presente no "santeiro" que tem anúncio na TV e opera milagres até mesmo pelo telefone 0900.
Tem ainda o desejo sexual, que viabiliza as relações homossexuais masculinas e femininas sem o menor falso pudor. Até mesmo o Brasil, país geralmente à parte do universo latino-americano, tem seu espaço, ao ser citado duas vezes no filme, uma delas como um país de feiticeiras.
Fina Torres mostra com "Mecanismo Celeste" que é uma diretora habilidosa, que consegue reunir muitas informações de seu universo pessoal sem parecer presunçosa ou perder o tom da comédia.

Filme: Mecanismo Celeste
Direção: Fina Torres
Elenco: Ariadna Gil, Arielle Dombasle, Evelyne Didi
Produção: França, Venezuela, Bélgica e Espanha; 1995
Cinema: Belas Artes - sala Villa-Lobos

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