São Paulo, domingo, 8 de dezembro de 1996
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Enquanto os ricos se protegem...

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Nunca o comércio internacional foi tão difícil de ser interpretado como nos dias atuais. A globalização virou sinônimo de modernidade, eficiência e progresso. Colocar-se contra ela -além de inócuo- representa ser antiquado, ineficiente e regressivo. Ninguém gosta desses rótulos.
Mas o assunto é demasiadamente sério para ser evitado. As novas tecnologias revolucionaram o modo de produzir e comercializar. Vivemos a era das vantagens comparativas. O capital migra para as nações mais atraentes, pouco se importando com as consequências sociais dessa transferência, em especial o desemprego.
O mundo desenvolvido fala em livre comércio e pratica o mais deslavado protecionismo. Isso está atingindo o Brasil. As nossas empresas estão sendo demandadas a competir em desigualdade de condições -pagando os juros mais altos do mundo e enfrentando custos de produção, transporte e comercialização que derrubam qualquer planejamento racional.
Os Estados Unidos e a Europa, por exemplo, pregam o liberalismo de comércio, mas gravam os principais produtos brasileiros com elevadíssimas tarifas de importação, como é o caso do suco de laranja, soja, frango, café, açúcar, alumínio, aço, calçados e vários outros. Se o comércio desses produtos fosse realmente livre, o Brasil teria exportado, no ano passado, mais US$ 10,5 bilhões.
As autoridades brasileiras precisam deixar sua inocência de lado no trato com os países ricos e organismos internacionais, em especial a Organização Mundial de Comércio, cuja reunião anual inicia amanhã em Cingapura.
No Brasil, nada justifica querer voltar ao velho protecionismo. Mas é essencial que os produtores tenham igualdade de condições para competir. Uma abertura mal arquitetada pode destruir as empresas e os empregos. Os países ricos sabem disso. E, por isso, tomam precauções.
Não há razão tampouco para responsabilizar os produtores, embora haja exceções, como a causa da baixa competitividade internacional. Os impostos em cascata elevam os custos de modo fatal.
A taxa de juros no Brasil é 200% mais alta do que nos países desenvolvidos. Os preços públicos subiram mais de 25% em termos reais nos últimos 24 meses. Os lucros encolheram mais de 35% em relação ao patrimônio. E, apesar disso, os preços industriais caíram 26%!
É um milagre que, com todos esses obstáculos -sem falar no atraso do câmbio-, a economia brasileira exporte mais de US$ 50 bilhões por ano. Se os conhecidos constrangimentos do "custo Brasil" fossem pelo menos mitigados, o país poderia facilmente exportar US$ 100 bilhões anualmente. Isso redundaria em mais empregos e menos pobreza.
Porém até hoje a história é bem diferente. Enquanto os países do Primeiro Mundo se protegem e fortalecem em nome da globalização, os do Terceiro Mundo estremecem e empobrecem.

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