São Paulo, terça-feira, 10 de dezembro de 1996
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Não São Paulo

THALES DE MENEZES
DA REPORTAGEM LOCAL

O assunto aqui é geração. Na verdade, uma geração. Aquela que nasceu em 62, como dizia o Ira!. Pode ser também 61, 63... Enfim, quem entrou nos 20 anos no início da década passada e descobriu que fazer rock no Brasil era barra.
É a geração que não tinha vez nas gravadoras, nas quais o máximo de rock permitido era Blitz.
Esse pessoal encontrava refúgio em casas noturnas de São Paulo (Carbono 14, Napalm, Madame Satã...) e nas lojas das Grandes Galerias, no centro da cidade.
Uma dessas lojas, a Baratos Afins, virou um selo independente de fôlego. Entre outras boas ações, lançou oito bandas desse momento do rock paulista, nas coletâneas "Não São Paulo", volumes 1 e 2.
Agora, dez anos depois, elas são relançadas em CD e provam duas coisas: primeiro, existia realmente uma cena forte de rock paulistano em 1986; segundo, a existência de uma cena não garante qualidade.
Os grupos são amadores, cópias pálidas do que se fazia lá fora. O primeiro volume, em que boa parte dos integrantes das bandas eram então futuros escribas da imprensa pop paulistana, capricha mais na cópia e escorrega na pretensão.
Chance e Akira S & As Garotas que Erraram querem fazer música difícil e seu experimentalismo redunda em chatice. Com som mais redondo, o Muzak é comprometido por um vocal pífio.
Sobra um pouco mais de sorte à banda mais desencanada da turma. New wave até a medula, o Ness consegue o esboço de um hit, "Adeus Buck Rogers".
O integrante mais famoso do volume 2 é o Nau, que depois lançaria um álbum por uma grande gravadora. Ouvido agora, mostra um som datado e uma vocalista cheia de afetações. Seu único mérito era fazer rock honesto.
Mas até o Gueto era rock. "Fotografia" e "Luta" podem ser bem dançantes, mas são calcadas em furiosos riffs curtos de guitarra. Afinal, essas gravações são de 1986, antes de o Gueto descobrir os Beastie Boys e sacar que tinha uma "identidade" com o hip hop.
Já o Vultos tem os cacoetes da new wave chique. O vocal disputa com Guilherme Isnard o título de "o mais brega do rock nacional".
Com isso, brilha mais em "Não São Paulo 2" o 365, filho direto da primeira geração do punk nacional. Sem frescuras, é guitarra crua e som politizado. Pelo menos, injeta adrenalina. Fora o 365, ouvir os dois exemplares de "Não São Paulo" é pura arqueologia juvenil.

Discos: Não São Paulo 1 e 2
Lançamento: Baratos Afins
Preço: R$ 16
Códigos para ouvir: 2601 e 2602

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