São Paulo, quinta-feira, 19 de dezembro de 1996
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Imposto de Renda, CPMF e classe média

ALOYSIO BIONDI

Até anos recentes, qualquer elevação de impostos promovida pelo governo provocava indignação. Hoje, nestes tempos fernando-henriquistas, o governo promove uma reforma tributária às avessas, confiscando dinheiro da classe média e povão e aumentando a renda dos ricos e especuladores -e o silêncio é geral (salvo as exceções, agora excepcionais, de praxe).
Há poucos dias, os contribuintes foram surpreendidos com mudanças na declaração -e futuro pagamento- do Imposto de Renda para 1997. Entre elas, a drástica redução nos abatimentos permitidos com despesas de educação dos filhos.
O arrocho, na verdade, foi aprovado há muito tempo, no final de 1995, com a "reforma tributária" do governo, capitaneada pelo então deputado e hoje ministro Antonio Kandir.
A inovação é ainda mais revoltante -e retrato perfeito da filosofia do governo FHC- quando se sabe que o desconto permitido anteriormente já era ele próprio absolutamente ridículo, insuficiente para cobrir três mensalidades em escolas particulares de São Paulo, na faixa de R$ 500 a R$ 700, em 1996. Mas o governo FHC resolveu cortar essa "mordomia" da classe média ...
No extremo oposto, a reforma Kandir/FHC trouxe inovações para beneficiar os ricos, reduzindo o seu IR.
Vale a pena destacar uma: agora, os acionistas (donos de empresas) podem considerar o dinheiro que aplicam nas empresas como se fosse um empréstimo, para calcular os juros que esse capital "renderia" -e abater os juros dos lucros das suas empresas, reduzindo o IR.
Note-se bem: isso apesar de todos os estudos da Secretaria da Receita Federal, o "Leão", mostrarem que, proporcionalmente, a classe média paga Imposto de Renda várias vezes maior do que os milionários no Brasil... As mudanças, a "reforma"? Fizeram tudo às avessas do que os estudos da Receita preconizavam.
Especuladores
Estatísticas citadas por Clóvis Rossi nesta Folha mostram que os lucros resultantes das aplicações no mercado financeiro pagam, em média, 40% nos 25 países mais ricos do mundo.
No Brasil, a cobrança é de apenas 8%. Cinco vezes menos. Privilégio aos ricos, prêmio à especulação. Mas o governo FHC abre baterias contra a CPMF aprovada no Congresso, tentando exatamente eliminar sua cobrança para os especuladores em Bolsas de Valores...
Hora do povão
Há décadas se sabe, no Brasil, que uma verdadeira reforma tributária deveria reduzir a cobrança de impostos sobre produtos e serviços consumidos por toda a população.
Esses impostos são injustos ("regressivos") porque tanto o rico quanto o pobre vão pagar a mesma percentagem ("alíquota") sobre o preço, apesar de esse consumo ter um peso totalmente diferente, conforme a renda de cada um.
As mesmas estatísticas mostram que, na média, os impostos sobre o consumo chegam a 16% no país, contra 12% nos 25 países ricos. Distorção total.
Confiscando
Houve tempo, no Brasil, em que o governo realmente procurava fixar um Imposto de Renda maior para quem ganhasse mais. Havia, então, várias faixas (alíquotas) de cobrança do imposto: desde 8%, 10%, 12%, até 20%, 25%, 30% ou 35%, variável conforme a renda da pessoa.
A reforma às avessas do governo FHC/Kandir cometeu uma barbaridade, conforme o ex-secretário da Receita Osiris Lopes Filho sempre brada nesta Folha.
A mudança arrochou o povão e a classe média, ao extinguir as faixas de IR mais baixas. E doou mais renda aos ricos, ao colocar como teto da cobrança a alíquota de 25%. Hoje, o Brasil é assim: quem ganha menos não escapa de um IR de 15%. Quem é milionário não paga mais do que 25%.
O governo FHC cita uma elevação nos salários mais baixos para proclamar que está melhorando a distribuição da renda no país. Outro mito. A política tributária está enriquecendo ainda mais os ricos e empobrecendo classe média e povão. Concentrando a renda.

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