São Paulo, domingo, 22 de dezembro de 1996
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Para que Sudene e Sudam?

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.

A medida provisória de "ajuda" ao Nordeste é casuística (ajudará apenas um fabricante, a Asia Motors, que pretende abrir uma fábrica que cria menos que 500 empregos), mas, mais grave, baseia-se em premissas equivocadas de como promover o desenvolvimento regional.
Desde os anos 50, acredita-se que a disparidade de renda entre o Nordeste e o Sul tenha sido provocada pela industrialização do pós-guerra. Para corrigir isso, foram criadas a Sudene e a Sudam para apoiar o desenvolvimento das regiões Nordeste e Norte, utilizando recursos obtidos de renúncias fiscais (abatimento do Imposto de Renda e outros) para serem investidos em indústrias. Passados mais de 40 anos, os resultados dessa política mostram pouca eficácia.
Não foi a industrialização do Sudeste no pós-guerra que gerou a diferença de renda entre o Norte/Nordeste e o Sul. Dados sobre a renda dos Estados e de deslocamento da população mostram que a diferença de renda foi formada entre o final do século passado e o início deste, quando o Nordeste ficou preso à monocultura da cana baseada em latifúndios de baixa produtividade, trabalho escravo e coronelismo.
Essa combinação não favoreceu a criação de uma cultura urbana capitalista. Ao passo que, no Sudeste, dava-se o apogeu do café e, no Sul, da pecuária, com trabalho imigrante livre e o surgimento de cidades com valores capitalistas (valorização do trabalho e do espírito empreendedor). Embora vários Estados do Nordeste tenham se modernizado deste então, o tripé cana, latifúndio e coronelismo ainda é forte.
Em estudo que conduzi sobre o desenvolvimento dos Estados brasileiros entre 1939 e 1994(*) mostra-se que a dispersão da renda per capita entre os Estados vem diminuindo desde o final dos anos 40 (era maior em 1947 do que hoje). No entanto, isso não foi linear. A diferença na renda aumentou bastante entre 1965 e 1975, anos nos quais os incentivos fiscais canalizados para a Sudene e a Sudam foram dos mais altos.
Entre 1980 e 1994, entretanto, houve forte diminuição dessa dispersão devido a fatores como a crise fiscal (que reduziu subsídios fiscais), a maturação de projetos governamentais importantes (determinados por fatores externos à "lógica" da Sudene/Sudam) e o baixo crescimento do Sudeste.
A conclusão é que a política de desenvolvimento regional baseada em perdões fiscais para investimentos industriais é pouco eficaz. Pior, é que ajuda a concentrar mais a renda, pois beneficia o capital e cria poucos empregos.
A mesma conclusão tem-se hoje na Itália, onde 40 anos de incentivos ao Sul (o "Mezzogiorno") produziram resultados tão magros quanto os daqui.
Fica para a próxima semana discutir como se pode assentar a política regional em bases novas.

Álvaro A. Zini Júnior, 43, é professor titular de economia internacional da Faculdade de Economia e Administração da USP.
(*) O estudo denomina-se "A Convergência da Renda Regional do Brasil e seus Determinantes Sócio-econômicos", FEA-USP, mimeo, dezembro/96.

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