São Paulo, domingo, 22 de dezembro de 1996
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Super-heroínas

ADRIANA VIEIRA; DEBORAH GIANNINI

POR ADRIANA VIEIRA
E DEBORAH GIANNINI
Ciência, política, arte, cinema. Música, família, moda, economia. Hoje não há como pensar em qualquer uma dessas áreas sem associá-la a uma figura feminina.
Nesta edição de Natal, a Revista da Folha homenageia as mulheres brasileiras que fizeram ou continuam fazendo a história do século 20.
Elegemos 20 notáveis brasileiras para falar sobre outras 20. E essas 40 mulheres representam aqui muitas outras que, por motivo de espaço, tiveram de ficar de fora.
Cada uma em seu tempo, de Maria Bonita, a mulher do cangaceiro Lampião, a Johanna Dobereiner, a cientista que deve ser indicada ao Prêmio Nobel de Química, passando por Tarsila do Amaral, Clarice Lispector, Carmen Miranda, Leila Diniz, Xuxa e várias outras. Essas grandes mulheres influenciaram gerações e provaram estar ao lado, e não atrás, dos grandes homens.

Fernanda Montenegro por Fernanda Torres "Minha mãe nasceu num subúrbio no Rio, não era o ideal de beleza de sua época, nunca teve dinheiro para fazer cursos na Europa... Ou seja, tinha motivos de sobra para ter sentimento de inferioridade e, portanto, de deslumbre diante do resto da humanidade. Porém, a Dona Arlette, se concentrou em subir no palco, dia após dia, confiando nas suas necessidades, livre de qualquer engajamento, doutrina ou patrulhamento. Dessa forma, é curioso que alguém que nunca foi de esquerda ou de direita, que recusou um cargo público, que não tomou ácido na hora que era para tomar, que fez comédia de costume quando a regra eram textos políticos, que nunca esteve na moda; é curioso que justamente esse ser que abdicou das grandes 'causas' tenha se transformado numa espécie de exemplo de cidadã, algo que ultrapassou sua presença em cena. A liberdade e o sentido de realização que ela exerceu no palco foi o mesmo que exerceu na vida. Minha mãe nunca foi deslumbrada, nunca se deixou escravizar, e isso é crucial num país escravocrata como o nosso. A Fernanda Conde de Montenegro foi inventada por uma brasileira magra e olhuda, filha de operários do subúrbio carioca chamada Arlette Pinheiro da Silva, que se engajou em ser livre. Aí jaz o mistério."

Fernanda Montenegro, 66, atriz, atua no teatro, cinema e televisão. Entre seus principais trabalhos estão a peça "As lágrimas amargas de Petra von Kant", o filme "Eles não usam black-tie" e a novela a "Guerra dos Sexos".

Fernanda Torres, atriz, ganhou a Palma de Ouro de melhor atriz em Cannes em 1985, no filme "Eu sei que vou te amar", de Arnaldo Jabor.

Cacilda Becker por Marília Pêra
"Nunca vi Cacilda Becker trabalhar em teatro. Vi o filme 'Floradas na Serra' e trechos de programas com ela na TV. Em 1968 ou início de 1969, eu estava em São Paulo fazendo a peça 'Roda Viva' e frequentava o mesmo cabeleireiro de Cacilda. Encontrei-a duas ou três vezes lá. Ela sempre me convidava para assistir a peça 'Esperando Godot', de Samuel Beckett, que estava fazendo com Walmor Chagas e Flávio Rangel. 'É um espetáculo bastante árido', dizia Cacilda. Também a encontrava nas reuniões da classe artística, era um período conturbado em São Paulo, as peças eram retiradas de cartaz pela censura.
Cacilda comandava muitas reuniões da classe. Um dia, fui ao banco, que era exatamente em frente ao teatro onde ela fazia o 'Esperando Godot'. Vi uma ambulância na porta e atravessei a rua. Havia acabado a sessão das 16h, para estudantes. Entrei e ainda a vi em cima do palco, sentada numa cadeira com uma roupinha de mendigo do personagem. Ela mostrava ao médico onde doía: a nuca. Walmor a pegou no colo, a carregou até o começo da platéia e a passou para os braços do Rangel que a levou pelo corredor das cadeiras. A mãozinha de Cacilda foi passando pelas cadeiras. Eu a vi saindo nos braços de Walmor e Flávio Rangel, abandonando o teatro."

Cacilda Becker, atriz, morreu em 1969 aos 48 anos. Atuou no teatro por 28 anos, além de liderar as reuniões de artistas na época da ditadura. Entre as peças, "Quem tem medo de Virgínia Wolf", em 1964, e "Esperando Godot", em 1969.

Marília Pêra, 53, atriz, fez teatro, filmes e novelas. Entre seus trabalhos, o filme, "Pixote - A lei do mais Fraco", de Hector Babenco, em 1979, e a novela "Brega e Chique", em 1987. Atualmente está dirigindo a peça "O Último Drinque", de Regianna Antoninni, no Rio.

Dercy Gonçalves por Hebe Camargo
"Para mim, falar de Dercy é como se um passe de mágica fizesse com que o espelho refletisse o futuro. Tudo que quero para o amanhã é o presente dessa magnífica personagem das artes brasileiras. Gostaria de viver tanto quanto ela.
Desfrutar a mesma liberdade de fazer e dizer o que pensa sem se preocupar com o que os outros pensarão ou dirão. Vocês querem que eu fale de uma grande mulher, mas Dercy Gonçalves é mais: heroína libertária, ela, sempre feminina, abriu mão dos problemas que a companhia masculina costumam trazer para gente de temperamento forte como o dela. Dercy, mesmo que inconscientemente, criou uma espécie de reinado particular onde abre mão dos julgamentos alheios e onde faz e refaz suas leis.
Dercy pode rir do fracasso ou chorar o alto preço que o sucesso costuma cobrar. Dercy diz muitos palavrões e poucas palavras de afeto. Os primeiros fazem parte do cotidiano de muitas pessoas. O afeto ela reserva aos que ama de verdade. Dercy é a minha ídola definitiva."

Dercy Gonçalves , 89, atriz comediante de TV e teatro, foi uma das revelações do teatro de revista ao lado de Oscarito e Grande Otelo.

Hebe Camargo , 67, apresentadora de TV, já foi cantora de samba e atriz. Uma de suas atuações mais conhecidas foi no filme "Romeu e Julieta".

Leila Diniz por Norma Benguell
"Leila Diniz era uma atriz maravilhosa e super injustiçada. A cultura brasileira ficou somente falando que ela foi à praia de biquíni quando estava grávida. A mídia deu tanta força a esse lado libertário de Leila, que seu talento ficou em segundo plano. Sugiro que façam uma retrospectiva dos seus trabalhos para que possamos ver realmente o carisma e talento de Leila."

Leila Diniz, atriz, morreu aos 27 anos em 1972. Sua carreira foi marcada pelo confronto com tabus que envolviam a mulher na década de 60.

Norma Benguell, 60, atriz e cineasta. Foi a primeira brasileira a aparecer nua nas telas em "Os Cafajestes", de Ruy Guerra, em 62. Dirigiu "Eternamente Pagú" (88) e "O Guarani" (95).

Elis Regina por Rita Lee
"Na época do tropicalismo, Elis passava por mim chispando, murmurando palavras de desprezo pela minha existência. Eis que, quando fui presa em 1976, Elis deixou a máscara mal-humorada de lado e passou a ser minha maior defensora. Foi a única artista que teve coragem de me visitar na cadeia e ameaçar um escândalo daqueles, caso não pudesse me ver. A partir de então, pude conhecer minha nova velha amiga, a pimenta mais doce, a maior cantora do Brasil. Diferenças musicais ficaram para trás, até o nome da filha mais nova (Maria Rita) tinha um carinho por mim. O mais importante entre nós duas passou a ser a cumplicidade da vida e o respeito mútuo. No dia em que Elis partiu para o mundo espiritual, eu estava esperando por ela para fazermos o que seria a primeira parceria juntas. Elis era uma compositora na hora de cantar e também colecionava poesias à sete chaves. Foi com muito custo que consegui convencê-la a pôr as asinhas de poeta para fora, mas quis a vida que essa aventura ficasse para nosso próximo encontro. Saudade de Elis."

Elis Regina, cantora, morreu em 1982 aos 36 anos. Gravou 27 LPs, 14 compactos simples e seis compactos duplos. Ficou conhecida após vencer o 1º Festival da ex-TV Excelsior com a música "Arrastão", em 1965.

Rita Lee, 48, cantora e compositora, 30 anos de carreira, 25 discos e 19 coletâneas. Compôs "Doce Pimenta" e "Alô, Alô, Marciano" para Elis Regina, em 1980.

Pagú por Marta Suplicy
"Ousada, criativa, ingênua, bonita e corajosa. Pagú pagou um alto preço -a vida- por desafiar os preconceitos referentes ao comportamento feminino da época e também por se engajar no que acreditava ser melhor para o seu país.
Em época na qual mulheres não fumavam em público, não emitiam opiniões sobre assuntos ditos 'masculinos', a adolescente Pagú já desafiava as freiras do colégio, experimentando tudo o que era proibido. Jovem, Pagú escandalizava a sociedade tradicional, relacionando-se afetivamente com Oswald de Andrade e depois filiando-se ao Partido Comunista do Brasil.
Militante convicta, obedecia às ordens do partido mesmo quando contrárias a sua índole. Suas convicções políticas a levaram diversas vezes à prisão e à tortura, minando sua alegria e personalidade forte.
Observando o destino de Pagú, dá um aperto no coração e uma revolta. Como uma pessoa tão plena de vida e com tal potencial de contribuição pôde ser tão massacrada a ponto de desistir da vida? Questão de mulher? Questão de política? Questão de época?
De tudo um pouco. Se Pagú não tivesse entrado na política certamente não iria para a prisão. Não teria adoecido dos pulmões, não teria sido estraçalhada psicológica e fisicamente. O 'establishment' não desculpa nem homens nem mulheres que o ameaçam politicamente.
A ousadia que não desafia o 'status quo' político-econômico pode ser criticada, mas é palatável pela sociedade. Lembremo-nos de Leila Diniz que até mito virou. O que não se engole é o desafio ao 'establishment' econômico. Se for mulher e a ação for acompanhada da quebra de tradições morais aí... é o caso Pagú.

Pagú fez da vida uma aventura. Acreditando, partia para a ação. Vivia, não dando a mínima para o que pudesse lhe ocorrer. Para falar a verdade, não sei nem se percebia a dimensão do perigo real que corria enfrentando o estado novo Getulista de frente.
É interessante observar como algumas coisas mudaram nos dias de hoje e outras continuam iguaizinhas. As mulheres tentam largar o cigarro que faz mal à saúde, estão em todas as profissões...mas ainda são poucas na política, por exemplo.
Na altura contra a ditadura as mulheres se envolveram e pagaram o preço semelhante ao de Pagú.
Tivesse apenas ameaçado os costumes ou a moral vigente, Pagú pagaria o preço da marginalização social, mas viveria sua grande aventura longe das grades."
Patrícia Rendler Galvão, Pagú, morreu em 1962 de câncer. Foi considerada musa da poesia surrealista brasileira. Casou com com Oswald de Andrade. Militante do Partido Comunista, foi a primeira mulher presa política torturada.

Marta Suplicy, 50, psicanalista, deputada federal (PT/SP). Integra a comissão de Direitos Humanos, Seguridade Social e Família e a de Relações Exteriores da Câmara Federal.

Maria Bonita por Benedita da Silva
"Maria Bonita é um dos nomes mais importantes no contexto da história do Nordeste brasileiro. Ao lado de Lampião, marcou época e deixou para as gerações posteriores a imagem de uma mulher de luta, combativa, disposta e guerreira. Mesmo impondo a sua individualidade, deixou patente, frente a esse heroísmo, que sofria pressão proveniente do banditismo social.
Ao ajustar contas contra uma violência qualquer dos poderosos, o sertanejo pobre não tinha outra saída senão ingressar num dos muitos bandos de cangaceiros que percorriam o interior nordestino.
A rebeldia do cangaceiro não era política, mas individual, e frequentemente ultrapassava a tênue fronteira do banditismo. Seus 'feitos' eram cantados nas feiras, em cidades interioranas, pelos versos de cordel, alimentando a lenda de um famoso Lampião, da história do cangaço e da incansável Maria Bonita, numa mistura de admiração e medo.
Maria Bonita pôde conter a agressividade e a violência dos cangaceiros, sobretudo contra outras mulheres, que se viam obrigadas a cumprir ordens e desmandos, impostos pela força das armas.
É, sem dúvida, um dos grandes nomes de mulheres deste século, vítima de uma época, mas uma história que contribui sensivelmente para mudanças sociais ao raiar do terceiro milênio."

Maria Bonita morreu em 1938, na mesma emboscada de policiais que matou seu companheiro Lampião. No final dos anos 20, Maria Bonita abandonou a fazenda dos pais para ser a primeira mulher a se juntar ao grupo de Lampião.

Benedita da Silva , 54, é senadora pelo PT do Rio de Janeiro. Já foi vereadora, deputada federal e candidata à prefeitura carioca.

Marta Rocha por Shirley Malmann
"Marta Rocha virou um mito. A mais famosa, a mais conhecida. As pessoas podem não conhecê-la, nunca tê-la visto, mas sabem quem é Marta Rocha. Admiro-a por ter conquistado um nome e ter conseguido segurar isso.
Os concursos de 'miss' visavam a mulher com um corpo bonito, ao contrário das modelos que valorizam o 'quanto mais magra melhor'. Para a época, ela era perfeita. A mulher cheia de curvas era o auge do sucesso. Os padrões de beleza vão mudando. Marilyn Monroe nunca foi uma magricela."

Marta Rocha, 63, baiana, ex-Miss Brasil de 1954. Duas polegadas a mais a impediram de chegar ao título de Miss Universo.

Shirley Malmann, 19, gaúcha, já faz parte do time de supermodelos. Na temporada européia, desfilou para Lagerfeld, Helmut Lang, Chanel, Lacroix e Valentino.

Lygia Clark por Tomie Othake
"Lygia Clark radicalizou quando fez peças bidimensionais, em branco e preto, geométricas, indo ao essencial da composição e, como em todo concretismo, quase que parecendo exercícios visuais. Acrescentou a tridimensionalidade, daí a participação do espectador com os bichos, onde os valores da visualidade foram sendo abandonados, até que, com as roupas de plástico, o espectador virou ator da obra, e que obra! Uma nova artista! A sua morte prematura atrasou o processo artístico, que provavelmente levaria a juntar mais artista-obra-espectador, ou então, esses três elementos se tornariam um só."

Lygia Clark morreu em 1988, aos 67 anos, escultora, pintora e artista experimental, tornou-se um dos líderes do movimento de arte concreta.

Tomie Othake, 83 anos, artista plástica há quase 40, japonesa naturalizada brasileira.

Maria Esther Bueno por Paula
"A tenista Maria Esther Bueno foi a primeira a levantar a bandeira da mulher no esporte, iniciando um trabalho que dura até hoje. Com certeza, ela teve muitas dificuldades. Na época, a mulher que praticava esporte era taxada de masculinizada, e ela tentou acabar com esse tabu. Maria Esther Bueno foi uma mulher de expressão. Sua trajetória contribuiu muito para que a mulher brasileira conquistasse espaço não só no tênis, mas em várias modalidades."

Maria Esther Bueno , 57, tenista paulistana, ganhou 558 títulos internacionais entre 1957 e 1968, além dos 25 nacionais, de 1952 a 1957. Em Wimbledon, foi campeã por três vezes sozinha (1959, 1960 e 1964). Chegou a ser eleita a maior atleta feminina do mundo na temporada de 59/60.

Maria Paula Gonçalves da Silva, 34, foi chamada pela primeira vez para a Seleção Brasileira de Basquete em 1974. Na Olimpíada deste ano, conquistou medalha de prata. Hoje, é jogadora do Microcamp e foi convidada para jogar na WNBA, Liga Profissional Feminina de Basquete dos EUA.

Tarsila do Amaral por Leda Catunda
"Há dois aspectos a se comentar sobre Tarsila do Amaral. O primeiro trata-se de sua obra, que traz uma carga muito original, uma pintura que se inspira na estética popular brasileira por meio de cores e paisagens. Ao mesmo tempo, Tarsila, com sua obra, criou uma mitologia própria, como o "Abaporu", forte na história do Brasil. O segundo ponto é a mulher que Tarsila representava. Casou-se e teve um filho, descasou-se e casou-se novamente, personalidade marcante que influenciaria outras mulheres. Artisticamente, identifico-me com Tarsila pela feminilidade de sua obra."

Tarsila do Amaral , pintora paulista, morreu em 1973. Foi uma das figuras centrais da primeira fase do modernismo brasileiro. Ligada a Anita Malfatti, aproximou-se dos modernistas Mário e Oswald de Andrade. Em 1995, sua obra "Abaporu" (1928) foi vendida por US$ 1,3 milhão.

Leda Catunda, 35, pintora contemporânea. Conhecida por usar materiais não convencionais.

Márcia Haydée por Ana Botafogo
"A minha admiração por Márcia Haydée vem não só pela bailarina que ela era, mas por ser uma artista. Ela conseguia emocionar o público apenas com uma cena em que rasgava uma carta. É justamente esse lado da interpretação de Márcia Haydée que influenciou minha carreira.
Além disso, ela foi uma bailarina que sempre lutou muito. Até que o coreógrafo John Cranko descobriu seu talento e mudou sua vida. Márcia criou personagens que prometem ficar na história. É o caso do espetáculo "A Megera Domada" ou do "Um Bonde Chamado Desejo". Márcia Haydée também conseguiu dirigir uma grande companhia de dança como a Stuttgart Ballet. Não é fácil dirigir os colegas.
Não posso esquecer também que Márcia foi uma das responsáveis pela minha entrada como primeira bailarina no Teatro Municipal. Ela fazia parte da bancada que me classificou."

Márcia Haydée, 59, ocupou por 18 anos a direção-artística do Stuttgart Ballet, da Alemanha, além de ter sido bailarina dessa companhia.

Ana Botafogo é primeira bailarina do Teatro Municipal do Rio de Janeiro desde 1981.

Costanza Pascolato por Glória Kalil
"Que ela é elegante, todo mundo sabe. Canso de votar nela quando me pedem nomes das mais bem vestidas do Brasil. E olhem que sou exigente. Jamais consegui as famosas dez indicações. Fico sempre nos seis ou sete.
Que ela tem estilo, todo mundo sabe. Não conheço ninguén que use óculos com sua categoria, que coloque um suéter amarrado nas costas com tanta propriedade, que se maquie em público com tanta classe e desfaçatez.
Que ela é chique, todo mundo sabe. É original e surpreendente em suas escolhas. Não vai nunca no mais fácil. Vai no detalhe, onde acha o único, o só dela.
Que é linda, todo mundo vê. Talvez em gravuras romanas se encontre um perfil parecido, uma delicadeza aproximada, um sorriso que se compare.
Mas tem algo que nem todo mundo sabe. Que só quem a conhece bem identifica: um inesperado e malandríssimo senso de humor que lhe dá sua mais importante qualidade: um olhar crítico e distanciado de quem não se leva muito a sério. O que dá equilíbrio, graça e interioridade a tantas externas perfeições."

Costanza Pascolato, ítalo-brasileira, é empresária de moda.

Glória Kalil, 52, consultora de moda. Trabalhou 15 anos como representante da Fiorucci e acaba de lançar um guia básico de moda e estilo.

Bidu Sayão por Rosana Lamosa
"Bidu Sayão sempre foi uma importante referência na minha carreira. Talvez porque, como ela, precisei ter muita determinação para começar uma carreira na música lírica no Brasil, um país sem tradição em prestigiar e homenagear seus artistas, principalmente nessa área.
Admiro sua determinação e auto-confiança para impor seu talento diante de opiniões contrárias que afirmaram que Bidu seria apenas uma 'vozinha de salão', para se tornar um dos maiores nomes da cena lírica deste século. Na verdade, seu sonho sempre foi ser atriz e foi por meio da ópera que ela conseguiu realizá-lo. Sábia, resistiu à tentação de cantar papéis importantes, mas que não se adequavam a sua voz de soprano ligeiro, optando por um repertório sem grandes riscos, mas que lhe permitiu fazer uma brilhante carreira nos mais importantes teatros do mundo."

Bidu Sayão, 90, cantora lírica, foi contratada pelo maestro Toscanini para integrar a Orquesta Filarmônica de Nova York em 1930. Em 37, foi para o Metropolitan Opera House, quando recebeu convite do presidente dos EUA Franklin Roosevelt para fazer um recital na Casa Branca.

Rosana Lamosa, 33, soprano, fez oito papéis em sete anos de carreira, entre eles a montagem paulistana de "La Traviata", de Giuseppe Verdi, no Teatro Municipal de São Paulo.

Irmã Dulce por Maricy Trussardi
"Falar sobre Irmã Dulce requer um coração muito aberto para as coisas de Deus, pois ela não só deu sua vida à serviço Dele, como viveu profundamente todos os mandamentos, sobretudo o 'amar ao próximo como a si mesmo'.
Ela nunca teve nenhuma preocupação a não ser a doação. Nunca se omitiu, sempre lutou pelos necessitados."

Irmã Dulce, missionária baiana, morreu em 92, cuidava de crianças e doentes em Salvador.

Maricy Trussardi, 61, vice-presidente do Conjunto Paroquial Nossa Senhora Mãe do Salvador, que atende carentes na Grande São Paulo.

Clarice Lispector por Nélida Piñon
"Cada dia para Clarice era um fardo cheio de esperança. Bastava tomar café, comer, saber de alguma boa intriga ou peripécia, para lhe nascer uma réstia de ilusão. Logo, porém, os olhos verdes, aflitos e intensos, pareciam transmitir a mensagem: tudo que vejo nesta sala me é familiar e monótono. Será que a vida não pode se renovar ao menor para surpreender-me?
Impaciente, queria renovar às pressas a própria casa, sua única toca. De nada valia, então, inventar-lhe ardis, armadilhas, prorrogar discretas fantasias. Seu contudente gênio conhecia em excesso o espetáculo humano que sofria, se esfastiava, criava."

Clarice Lispector, escritora pós-moderna, morreu aos 52 anos, em 1977, e ficou conhecida pelos livros introspectivos.

Nélida Pinõn, escritora, assumiu neste mês a presidência da Academia Brasileira de Letras, sendo a primeira mulher no mundo nesse cargo.

Johanna Dobereiner por Valéria Petri
"Johanna é a mulher que eu queria ser. Ela tem uma objetividade cristalina para identificar a essência das coisas. Intriga-se com coisas certeiras, deduz com determinação, vive apaixonadamente o saber científico. Seu trabalho é abrangente e transformador. Melhorar a vida dos seres (humanos e não-humanos, minimizando o efeito estufa, agindo contra a redução da camada de ozônio, melhorando o suprimento de alimentos para o Terceiro Mundo). O Nobel é um incidente, não norteia suas vontades. Qualquer consagração não representa o melhor -a gente vê no seu olhar coisas mais simples: uma mulher comum, com nove netos e a harmonia dos justos."

Johanna Dõbereiner, 72, cientista tcheca naturalizada brasileira. Lidera 30 pessoas de um departamento da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e deve ser indicada ao Prêmio Nobel de Química por tornar a produção agrícola mais produtiva e menos poluente.

Valéria Petri, 49, professora do Departamento de Dermatologia da Universidade Federal de São Paulo, foi a primeira a detectar a Aids no Brasil.

Carmem Miranda por Nana Caymmi
"Carmem foi uma figura muito importante para o Brasil e para minha família. Foi por meio dela que papai (Dorival Caymmi) estourou com a música 'O que é que a baiana tem'. Carmem também abriu caminho para a música brasileira no exterior. Ela foi muito corajosa ao perceber que aqui sua carreira seria limitada. Ela é única. Nenhuma mulher conseguiu tanto sucesso internacional."

Carmem Miranda morreu em 1955. Foi uma das maiores cantoras do Brasil na década de 30. Fez 15 anos de sucesso nos EUA.

Nana Caymmi , 53, cantora, filha do compositor Dorival Caymmi. Já gravou 30 discos.

Diolinda Alves de Souza por Marina Silva
"Quando o nome e as fotos de Diolinda começaram a aparecer no noticiário sobre o Movimento dos Sem-Terra, senti uma curiosidade. Em meio a violência dos conflitos, a presença de uma mulher mostrava que a luta dos sem-terra não era resultado apenas de uma organização política ou de uma decisão ideológica, mas brotava de uma situação social trágica. Mais do que um movimento de militantes, eram famílias lutando contra a miséria e a injustiça. A imagem de Diolinda despertava o desejo de conhecer a situação dessas famílias. As pessoas começaram a dar atenção à vida nos acampamentos, ajudando a criar um novo ambiente político, pressionado pela opinião pública mais favorável aos sem-terra. A imagem de Diolinda não está ligada só à coragem pessoal. Ela me lembra de que o fundamento da verdadeira coragem é a esperança."

Diolinda Alves de Souza , 26, agricultora, líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra do Pontal do Paranapanema.

Marina Silva, 38, historiadora, foi eleita em 1994 senadora pelo PT do Acre.

Xuxa por Maitê Proença
"As pessoas têm enorme facilidade em criticar a Xuxa e poucas têm coragem de louvá-la. A Xuxa tem uma adição de ingenuidade e espontaneidade que aparece em tudo o que faz. Ela não pretende ser uma virtuose: canta e interpreta simplesmente, sem culpa. Você vê o programa dela como sendo de criança, mas tira proveito de adulto."

Xuxa, 33, apresentadora de TV. Começou a carrreira aos 16 anos, como modelo. Em 83, virou apresentadora de um programa infantil na TV Manchete. Em 85, mudou-se para a Globo.

Maitê Proença, 38, atriz há 17 anos, fez novelas, filmes e no teatro. Faz na Rede Globo "A Vida Como Ela É", de Nelson Rodrigues.

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