São Paulo, domingo, 29 de dezembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O risco da balança (1)

CELSO PINTO

Muitas empresas de consultoria e bancos estão projetando um déficit na balança comercial (importações menos exportações) em torno de US$ 6 bilhões no próximo ano. Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central, acha que o déficit ficará no mínimo em US$ 8,2 bilhões, mas poderá chegar a US$ 12,6 bilhões.
A diferença é crucial: enquanto um déficit de US$ 6 bilhões poderia ser financiado sem sustos, um de US$ 12,6 bilhões acenderia uma luz amarela, ou vermelha, no mercado. Se Pastore estiver correto, dificilmente o governo deixará de tentar interferir no rumo da economia para evitar um déficit tão alto.
Existem duas questões vitais por trás de qualquer projeção para a balança comercial em 97: saber a tendência das importações e imaginar qual será o crescimento da economia. Diferentes hipóteses para essas duas questões explicam a maioria das divergências nas projeções. Vale a pena, portanto, examinar com mais atenção o que está por trás dessa discussão.
As importações foram afetadas, nos últimos anos, por três fatores principais: a abertura externa com redução de tarifas, a sobrevalorização cambial (que barateou o preço dos importados em reais), e o maior uso de crédito (barato).
Com isso, as importações, que eram de US$ 20,5 bilhões em 92, podem chegar a US$ 55 bilhões neste ano. Um estudo do BNDES indica que, em média, o uso de importações, que representava 6% da produção industrial em 1990, no ano passado subiu a 15,6%.
Uma dúvida básica é saber se o impulso extra dado por esses fatores foi inteiramente absorvido. Se foi, houve um salto no patamar das importações, mas, daqui para frente, elas tenderão a crescer conforme o aumento do PIB. Se não foi, elas crescerão ainda mais rápido.
Pastore montou alguns modelos econométricos para testar o impacto dos vários fatores sobre as importações. A tendência de longo prazo (de 91 a 96) tem sido de um crescimento de 16,8% nas importações e 5,2% nas exportações, embora em 96 as exportações tenham crescido só 3%. Ele testou o modelo considerando as variações trimestrais neste período e a sensibilidade a cada um dos fatores mais importantes (abertura, câmbio e financiamento).
A conclusão, diz ele, é que há um padrão muito estável de aumento das importações. Ele estima que o coeficiente de importações é de 2, ou seja, para cada ponto a mais no produto (PIB), somam-se dois pontos na importação.
As exportações, por sua vez, são sensíveis ao câmbio, ao comércio mundial e ao preço das "commodities". De um modo geral, seguem o aumento do comércio mundial (previsto para 7,6% em 97), perdem com a valorização cambial e com a queda no preço das "commodities" (a previsão é de queda de 5% em 97).
A longo prazo, de 80 a 96, a expansão das exportações foi quase toda derivada dos produtos industrializados. Os básicos até cresceram, em 93/94, graças ao aumento do preço internacional, revertido por uma queda desde o final de 94.
O que vinha sustentando a expansão das exportações eram os produtos industrializados. De 92 a 96 eles cresceram a 5,3% ao ano, mas, desde então, a taxa ficou em 1,9%.
A outra grande questão que fica é o crescimento econômico. Pastore defende a tese de que a economia vem apresentando uma tendência de crescimento desde 92 e não deve mudar em 97. No terceiro trimestre deste ano a economia estava crescendo a uma taxa anualizada de 12%, e ele não vê razões para supor uma desaceleração espontânea em 97. Ao contrário, acha que a economia se manterá na tendência histórica de 5% a 5,5% de crescimento.
Com esse crescimento, as importações em 97 devem crescer pelo menos 11%, se todos os efeitos da abertura/câmbio/financiamento tiverem sido absorvidos, ou 17%, se houver um efeito residual. As exportações devem crescer de 3%, como em 96, a 5,5%, que é a taxa histórica. Dessa combinação resultam as projeções de déficits que vão do mínimo de US$ 8,2 bilhões ao máximo de US$ 12,6 bilhões.
Na coluna de terça, comento as alternativas de Pastore para lidar com este déficit.

Texto Anterior: Para começar o ano, a ode do astrônomo Carl Sagan à ciência; Faltam 18 votos; Chega para lá; Trabalheira; Demarcação; Reciclagem fracassada virou sucesso oficial; Mais televisões no Brasil e empregos na Ásia; O sargento cego é um deputado que enxerga; ENTREVISTA; Boa notícia
Próximo Texto: Maluf e Maia param obras depois de eleger sucessores
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.