São Paulo, domingo, 29 de dezembro de 1996
Texto Anterior | Índice

Ano novo, bola nova

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

Com tantos ilustres admiradores na boa política e na boa iniciativa privada, o futebol brasileiro bem que mereceria uma ação decidida de modernização no ano que entra.
Agora que o país começa a valorizar a competitividade, a eficiência, a melhoria de serviços, o respeito ao consumidor, agora que o bolor mental do estatismo e da politicagem de província vai cedendo ao desejo de renovação das práticas públicas e empresariais, agora que a crença no certo vai substituindo a aposta no "acerto", é hora de se pressionar o charlatanismo engravatado que comanda o esporte das multidões.
Se temos os melhores artistas e se temos o melhor público, por que não conseguimos montar o melhor espetáculo?
A idéia simplista de que o país é "pobre" e não tem condições de competir com centros mais "ricos" não convence.
O Brasil não é uma republiqueta de bananas. Tem uma economia competitiva em vários setores, cidades com alto poder aquisitivo, um PIB que supera países da União Européia.
Se podemos ter o sexto mercado fonográfico do mundo, se produzimos 1,5 milhão de veículos, se consumimos TVs e aparelhos de som a mancheias, podemos perfeitamente sustentar essa grande diversão nacional que é a bola.
O problema aqui não é de dinheiro, é de bagunça, de incapacidade gerencial, de conivência do setor público, que aceita dívidas monumentais e engole essa bobagem de clubes de futebol como entidades sem fins lucrativos.
O problema é de cultura, de vício, de cegueira. A queda do Fluminense, por exemplo, nada parece dizer aos responsáveis pelo futebol carioca, que vão fechando o ano com mais um espetáculo de golpismo e estupidez em torno da fórmula de um campeonato inviável, sob os auspícios do cartola-mor, o sr. Eurico Miranda.
Mas não é o caso apenas de "fulanizar" a discussão -ainda que os bois tenham mesmo que ter nomes: o problema é de estrutura, de organização.
O futebol, como o esporte em geral, faz parte, no mundo moderno, de uma gigantesca indústria de entretenimento, que movimenta quantias fabulosas, cria ídolos, projeta países, mobiliza povos. Não é possível que fique, como aqui, imune às regras do jogo de mercado.
E a primeira delas, é a velha e boa "quem não tem competência não se estabelece". Simples assim: que fechem as portas os que não são capazes de sobreviver. Dediquem-se à bocha, ao jogo de damas, às iquebanas, ao que for mais viável.
Ou o setor se organiza ou naufraga. Se Olacyr de Moraes faliu, por que nossos clubes podem ficar pendurados em economias fictícias, produzindo buracos e mais buracos?
Se áreas inteiras da economia modificam seus procedimentos, promovem ajustes, buscam novos caminhos, abrem e fecham unidades, por que no futebol deve ser diferente?
Aqueles que amam o esporte, que querem ter o prazer de acompanhar bons jogos, que se sentem no direito de ir a um estádio para se divertir e torcer -e são muitos aqui no país do futebol- merecem melhor sorte.
Por que o Flamengo, o Corinthians, o Atlético não podem ser um Barça? Chega de abaixar a cabeça. Faço votos de que aqueles que podem fazer alguma coisa pela alegria pensem com carinho na bola que vai rolar em 97.

Texto Anterior: LSD; ASSASSINATO; PROTESTO
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.