São Paulo, segunda-feira, 30 de dezembro de 1996
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Reeleição não muda meu futuro, diz Maluf

VAGUINALDO MARINHEIRO

VAGUINALDO MARINHEIRO; RICARDO FELTRIN
EDITOR DE CIDADES

RICARDO FELTRIN
Paulo Maluf, 65, deixa amanhã o cargo de prefeito de São Paulo já tendo definido seu futuro político. Em entrevista concedida quinta-feira, Maluf afirmou que já decidiu qual eleição disputa em 98 (Presidência ou governo estadual). Não confirma, mas dá indícios de que prefere o Planalto.
Diz, por exemplo, que não muda de idéia mesmo que o Congresso aprove a emenda para a reeleição de FHC. "Não mudo porque para mim as coisas não caem do céu. Eu preciso me programar. Quem não se programa, não chega lá."
A programação de Maluf começa dia 5, quando ele volta do Guarujá e se instala em seu novo escritório político, nos Jardins (zona oeste de São Paulo).
Ainda sobre reeleição, Maluf diz que o governo federal está tratando o tema com "casuísmo e tapeação", e que FHC teme uma consulta popular sobre o assunto. "Ele se acovarda diante do plebiscito", afirma.
Ao falar sobre o passado, Maluf diz que sua maior obra foi o PAS. Ao falar sobre o futuro, afirma não temer que a criatura (Celso Pitta) se volte contra o criador (ele próprio). "Há muitos exemplos na política. Mas acho que os culpados foram os criadores, que exigiram do eleito coisas que ele não poderia cumprir. Eu saio daqui e não volto mais para a prefeitura."

"É lícito cada deputado ficar mudando de partido, como muda de cueca?"
Folha - O senhor disse, em entrevista feita em fevereiro de 95, que acabaria o mandato, tiraria férias e em março de 97 sairia em viagens pelo Brasil em campanha presidencial. Os planos mudaram?
Paulo Maluf - Eu nunca revelei a ninguém que sairia em campanha presidencial. O que eu vou fazer agora é ficar poucos dias no Guarujá. Volto para São Paulo dia 5 e continuo a trabalhar. Mas não tenho nada programado sobre viagens pelo Brasil. Isso não se programa com antecedência. Eu vou viajar todas as vezes que receber convite e achar que é válido.
Folha - O senhor disse que não revelou a ninguém se concorre a Presidência. Mas já decidiu?
Maluf - Decidi que continuo na política.
Folha - Mas concorre ao governo estadual ou à Presidência?
Maluf - Eu já decidi o que eu vou ser. O que eu vou tentar ser. Mas acho que não devo revelar. Primeiro porque tem um ditado mineiro que diz que quem chega muito na frente come cru. Quem chega muito atrasado vai comer tostado. Então, na vida você tem um calendário. E o calendário eleitoral é 98. Acho que não é boa política alguém antecipar esse debate. A boa política é ajudar o governo a fazer as reformas. O governo diz que quer reformas. Diz que o Congresso não lhe dá as reformas, mas o Congresso não é chamado para votar as reformas. Então, eu não quero permitir que se diga que as reformas não foram feitas por causa do Paulo Maluf.
Folha - A decisão que o senhor tomou, sobre sua vida política, independe da aprovação da emenda que permite a reeleição de FHC?
Maluf - Eu não devo mudar nunca a minha decisão porque, como dizem os jesuítas, Deus ajuda quem se ajuda. Para algumas pessoas, as coisas caem do céu. Para mim, não. Eu sempre tive que me programar. Por exemplo, contra o Mário Andreazza na convenção do PDS de 84 para a Presidência. Eu me programei, visitei o Brasil com a imprensa. Então, o que eu vou fazer agora é me programar. Porque, se você não se programar, não chega lá.
Folha - Se for aprovada a realização de um plebiscito, o senhor fará campanha pelo não à reeleição?
Maluf - Eu sou contra a reeleição como casuísmo como o atual governo quer fazer. Reeleição, como está sendo colocada agora, é tapeação. O que o país precisa é de uma reforma política. Por exemplo, é lícito cada deputado ficar mudando de partido, como muda de cueca? É lícito, como está no "Jornal do Brasil" de hoje (quinta), que o governo comece a temporada de caça aos novos deputados? Nós estamos fazendo com que a votação da reeleição seja um balcão de negócios. A própria Folha denunciou a venda de concessões de rádio no Ministério das Comunicações. Nós estamos preocupados com a reeleição ou com a honestidade da política neste país? Do meu ponto de vista, se o governo quer o casuísmo, esse casuísmo não pode ser feito pelo Congresso. Os jornais estão dizendo que existe barganha. É bom que digam isso. O governo quis usar instrumentos de corrupção. Em março de 94, todas as lideranças tucanas e pefelistas votaram contra a reeleição. Agora mudaram. Se queremos ética, que se faça um plebiscito.
Folha - O senhor está dizendo que essas pessoas que mudaram de opinião "levaram algum" ou estão sendo só casuístas?
Maluf - Estão sendo meramente casuístas. Mas como poderemos ter a ética no exame desse problema? Através do plebiscito. Se é verdade que o presidente desfruta perante a opinião pública de uma grande aprovação, há que se perguntar por que ele tem medo do plebiscito. Por que ele se acovarda diante do plebiscito.
Folha - O que o senhor diz em relação ao Congresso -negociatas, mudanças de partido- não existe também na Câmara Municipal?
Maluf - E você acha que eu sou a favor disso? Eu estive sempre no mesmo partido.
Folha - Mas, quando o senhor começou o governo, vários vereadores vieram para o PPB.
Maluf - E muita gente saiu.
Folha - Mas cresceu a bancada, o que facilitou o seu governo.
Maluf - Eu disse que sou contra e quero acabar com isso.
Folha - Qual a real razão da revolta dos vereadores contra Celso Pitta?
Maluf - Nesse negócio eu não entro. Não quero saber de fofocas.
Folha - A prefeitura tem um projeto de criação de incineradores de lixo que mudaria a sistemática de coleta de lixo na cidade e reduziria o poder das Administrações Regionais, reduto dos vereadores. Foi essa a razão da revolta?
Maluf - Você colocou o dedo na ferida. Mas não vou dizer mais nada. Quando você coloca a administração privada para tocar algum setor, você reduz a ingerência política.
Folha - Como o senhor controlou a revolta dos vereadores?
Maluf - Um político mineiro dizia que só há segredo se a conversa for a dois e você matar o outro quando a conversa acaba. Como é que existiria segredo com 17 sujeitos aqui? Eu só lembrei a eles que todos estavam eleitos pela administração que a gente fez. A cada um eu lembrei das obras feitas em seus bairros. Eles caíram na realidade.
Folha - O senhor diz ter reduzido o número de funcionários da prefeitura de 150 mil para 120 mil, mas tem um grande número que não está mais nos quadros da prefeitura porque aderiu ao PAS. A prefeitura continua pagando, ainda que indiretamente, o salário desses funcionários.
Maluf - Os médicos da prefeitura não quiseram ir para o PAS. E você sabe explicar por que um médico não quer trocar um salário de R$ 1.000 por um outro de R$ 6.000?
Folha - Eles dizem é que não basta querer para entrar no PAS...
Maluf - Eu asseguro hoje a preferência a todos os médicos da prefeitura, se quiserem entrar no PAS.
Folha - Estão aparecendo denúncias contra o PAS, de que é a prefeitura que indica os responsáveis pelas compras. Que o sistema continua público, sem a necessidade de licitações para compras.
Maluf - Toda denúncia será bem-vinda. Eu adoro quando os jornais fazem denúncias. Foi para evitar a manchete da Folha, da "FT", de toda segunda-feira -"Faltou médico no plantão de domingo"- que eu fiz o PAS.
Folha - Se o PAS está bem, por que o Paulo Richter (secretário da Saúde) não foi mantido pelo Pitta?
Maluf - Não vou comentar.
Folha - O Pitta vai ter um governo mais fácil que o senhor teve?
Maluf - É difícil dizer. O governo depende muito de fatores externos. Eu posso dizer que não tive problemas mais sérios. A economia vai bem, a arrecadação está boa. Se a economia continuar aquecida, o Pitta terá uma administração melhor que a minha.
Folha - Se a prefeitura tem dinheiro, por que a cobrança da diferença do IPTU de 1992?
Maluf - Eu não quero cobrar. Não cobrei durante os quatro anos, porque sou contra o uso da progressividade. Quem quis cobrar a progressividade foi o PT, que hoje reclama. Eles foram proibidos de cobrar por uma liminar do Tribunal de Justiça, que depois, no ano passado, considerou a cobrança legal. Eu repito que não quero cobrar, tanto que não mandei cobrar. O que aconteceu foi que a dona Mônica Gaggiano (secretária dos Negócios Jurídicos) me disse que há pareceres de diversos procuradores afirmando que se eu não inscrevesse essa diferença do imposto na dívida pública, a dívida iria prescrever, e a prescrição seria crime de responsabilidade que poderia até me tornar inelegível. O que foi feito foi a inscrição na dívida pública, esperando que a Justiça, um dia, considera a cobrança ilegal.
Folha - Não vai haver cobrança?
Maluf - Eu não desejo cobrar e o doutor Pitta não deseja cobrar.
Folha - É claro que o senhor já ouviu aquelas histórias da criatura que se volta contra o criador, e na política há vários exemplos. O senhor não teme que o Pitta se volte contra o senhor?
Maluf - Não. Existem mesmo muitos casos na política, mas há que se perguntar quem foi o culpado. Se foi a criatura ou o criador. Acho que os criadores foram os culpados. Porque se sentindo no direito de, tendo eleito a criatura, exigir coisas que ele não poderia cumprir. Saio daqui e não volto mais para a prefeitura.
Folha - Mas o senhor tem um projeto político...
Maluf - E tenho certeza de que o prefeito Pitta estará me apoiando.
Folha - Qual o marco de sua administração?
Maluf - Em virtude do violento corporativismo que enfrentei, acho que é o PAS.

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