São Paulo, segunda-feira, 30 de dezembro de 1996
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Classe média carioca adere às rodas de samba

MÁRIO MOREIRA
DA SUCURSAL DO RIO

Manifestação cultural das mais típicas do Rio de Janeiro, a roda de samba passa por uma fase de grande revitalização na cidade.
O impulso vem sendo dado, em grande parte, pela adesão de jovens de classe média da zona sul -platéia até há pouco tempo incomum nesse tipo de programa.
Se antes as rodas de samba praticamente se limitavam aos subúrbios, arrebanhando frequentadores de renda mais baixa, esse novo público, na faixa dos 18 aos 25 anos, estimulou o crescimento de várias outras rodas que se incorporaram ao cenário cultural carioca.
Nesses lugares só se tocam sambas de estilo tradicional -composições de autores como Noel Rosa e Nelson Cavaquinho, cujo espaço na mídia é cada vez menor.
"O samba agoniza, mas não morre", diz o compositor Wilson Moreira, citando versos de uma canção de Nelson Sargento.
"Tem uma rapaziada aí que sai procurando o samba de raiz e que já está saturada desse samba esquisito que tocam hoje", afirma, referindo-se aos grupos de pagode.
Para ele, o jovem de classe média que chega às rodas de samba sempre acaba gostando. "E ainda diz no pé", afirma, rindo.
Moreira foi um dos principais incentivadores das rodas ao promover uma no bar Sobrenatural, em Santa Teresa (zona sul), do qual era dono, no início da década.
O casal de namorados Tarcísio Carvalho, 21, e Gabriela Buscácio, 21, é um dos mais assíduos nas rodas. Estudantes e moradores de Laranjeiras (zona sul), eles planejam se casar numa roda de samba.
"A idéia não é uma roda para comemorar o casamento. Seria uma celebração comunitária, onde a roda faria parte do todo", explica Tarcísio. A festa deve acontecer em fevereiro, após o Carnaval.
Os dois são responsáveis pela chegada de vários amigos às rodas de samba -caso de Manoela Pedrosa, 18, que aderiu neste ano.
"Sempre pensei que roda de samba fosse coisa de subúrbio ou de gente mais velha", diz. "Se as pessoas da minha idade conseguissem se despir dos preconceitos, tenho certeza de que gostariam, porque é impossível não gostar."
Com um visual que mais se assemelha ao dos surfistas -louro, de cabelo comprido e queimado de sol-, Rafael de Carvalho, 22, morador de Botafogo (zona sul), conta que só ouvia rock antes de começar a ir às rodas de samba.
"Os meus pais sempre gostaram, mas eu achava música de velho. Quando comecei a frequentar, a barreira foi para o espaço."
Carvalho vai todos os domingos à roda do Bip-Bip, um pequeno botequim em Copacabana (zona sul) que promove uma cena rara na paisagem tipicamente urbana do bairro: mesas e cadeiras na calçada, onde os músicos se sentam para tocar e cantar, rodeados por dezenas de apreciadores do samba.
Segundo Alfredo Melo, 53, dono do Bip-Bip, os jovens não frequentam sua roda apenas por modismo. "Eles gostam mesmo. Há garotos de 18 anos que sabem as letras de todos os sambas antigos."
A cantora Beth Carvalho conta que sua filha, Luana, 15, costuma ir a um pagode dominical num bar na Barra da Tijuca (zona sul). "Esse movimento só tende a crescer, porque cada jovem vai levando outros. Antigamente, a garotada tinha até vergonha de sambar."

LEIA MAIS sobre rodas de samba à pág. 4-7

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