São Paulo, terça-feira, 31 de dezembro de 1996
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Xangai investe para virar "capital cultural" da Ásia

JAIME SPITZCOVSKY
DE PEQUIM

Cidade, centro industrial chinês, constrói museu, biblioteca e teatro

Xangai investe para virar "capital cultural" da Ásia
Xangai, a maior cidade da China, alimenta o ambicioso projeto de se transformar numa capital cultural da Ásia.
A ofensiva começou em outubro, com a inauguração de um museu de arte chinesa que custou US$ 48 milhões, prosseguiu na semana passada com a abertura de uma das maiores bibliotecas do planeta e guarda, para 1998, seu tiro de misericórdia: a abertura de um teatro-casa de ópera, planejado para ser o maior do continente asiático.
"Não é possível que sejamos grande cidade do ponto vista econômico e, por outro lado ,um deserto cultural", avaliou o prefeito Xu Kuangdi.
Xangai, com 14 milhões de habitantes, representa um dos pontos nevrálgicos do atual salto ao capitalismo promovido pelo Partido Comunista chinês.
A cidade corresponde ao principal centro industrial do país, abriga uma das duas bolsas de valores chinesas e recupera as tradições de centro financeiro e cultural, destruídas pela chegada ao poder dos comunistas em 1949.
O Museu de Xangai, inaugurado em 12 de outubro, também ilustra a alquimia de capitalismo e comunismo criada pela China neste final de século.
Mármore espanhol
Empresários e colecionadores, chineses ou estrangeiros, entraram com doações para ajudar os comunistas das prefeitura a cobrirem as despesas de construção do museu.
Construído com mármore rosa espanhol cortado na Itália e instalado por trabalhadores japoneses, o Museu de Xangai abriga um dos melhores acervos de arte chinesa.
Rivaliza com o Museu do Palácio, em Pequim, e com o Museu Nacional do Palácio, em Taiwan, tradicionais e importantes reservas de peças que podem atingir 5.000 anos de existência.
O Museu de Xangai conta com dez galerias que cobrem as principais categorias de arte e antiguidades chinesas, como jade, bronze, caligrafia, pintura, cerâmica, móveis, moedas, cunhos e selos, escultura, além de uma área para peças feitas pelas minorias étnicas que vivem na China.
Um das peças mais importantes é uma caligrafia com dois metros de comprimento, feita há cerca de mil anos, durante a dinastia Song.
Ao se aproximarem da obra, os visitantes involuntariamente acendem a iluminação. Quando se afastam, a luz se desfaz lentamente, para evitar que excesso de claridade acabe por danificar a peça.
Recursos tecnológicos são uma novidade em museus da China, o que destaca o pioneirismo do projeto de Xangai.
Ma e Wang
A idéia de presentear a maior cidade chinesa com uma "jóia da indústria cultural" surgiu em 1980, quando os pesquisadores xangaienses Ma Chengyuan, especialista em bronze, e Wang Qingzheng (pronuncia-se tchidjen), especialista em cerâmica, visitaram museus em Nova York.
Ma é hoje o diretor do Museu de Xangai, e Wang, o vice.
Conhecidos como a "dupla dinâmica" da vida cultural xangaiense, os dois já trabalhavam juntos desde os anos 60 no antigo Museu de Xangai, fundado em 1952 por Chen Yi, o primeiro prefeito comunista da cidade.
Ma também ganhou fama na cidade ao impedir a destruição do acervo do museu.
Entre 1966 e 1976, a China viveu a Revolução Cultural, onda de ortodoxia e fervor comunista que levava hordas de "guardas vermelhos" a invadirem locais onde houvesse "objetos do feudalismo". Objetivo: destruir marcas do passado pré-comunista.
Ma impediu a entrada de "guardas vermelhos" no antigo prédio do museu. Chegou a acampar lá durante 49 dias, dormindo junto ao acervo, para impedir uma eventual invasão.
Os "guardas vermelhos" desapareceram, e, atualmente, cerca de 5.000 pessoas invadem diariamente o novo Museu de Xangai para apreciar a coleção.
Estrangeiros pagam pelo ingresso 60 yuans (US$ 7,2), e os chineses, 20 yuans.
A receita obtida com a venda de ingressos não é capaz de cobrir o orçamento anual, previsto para atingir US$ 7 milhões. O museu vai depender de ajuda do governo e de mais doações.
O diretor Ma e seu vice, Wang, já mostraram competência na hora de arrecadar fundos. Levantaram cerca de US$ 10 milhões em doações para a construção.
O dinheiro sempre vinha de pessoas que tinham alguma ligação com a cidade.
Os principais doadores foram empresários que nasceram em Xangai, mas deixaram a cidade quando da chegada dos comunistas. Outra importante fonte de recursos foram homens de negócios de Hong Kong.

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