São Paulo, quinta-feira, 1 de fevereiro de 1996
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Inocência geral

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - A política é cínica por natureza e necessidade. Contudo, o governo, que teoricamente seria a política no poder ou do poder, descamba para o cinismo sem necessidade e até mesmo contrariando a natureza.
O presidente da República é político e é governo. Tem duplo motivo para mascarar intenções, palavras e atos. Quando diz que tudo está correndo às maravilhas porque o frango ficou barato ele está sendo metade governo e metade político.
O mesmo não acontece com o ministro Pedro Malan, que não é político, é apenas governo. Foi surpreendido com a revelação de que a crise do Banco Econômico vinha de longe e o Banco Central colaborava com a mutreta, chegando inclusive a ajudar nos balancetes fajutos que iludiram poupadores e investidores.
O Econômico era um dos cinco ou seis maiores bancos do Brasil. É preciso muita cara-de-pau para afirmar que seus balancetes, seus movimentos no exterior fossem ignorados ou desprezados pelas autoridades da Fazenda e do Banco Central.
E tem mais: o Econômico ficou associado ao nebuloso universo das doações para as campanhas eleitorais mais recentes, cujos beneficiários, direta ou indiretamente, estão no poder.
O sr. Pedro Malan tem a seu crédito uma respeitabilidade antiga. Por isso mesmo, em decorrência dessa respeitabilidade, ele precisa arranjar desculpas melhores para tentar explicar a tolerância ou a cumplicidade do Banco Central nos balancetes e nas operações do Econômico. Dizer "que não era de seu conhecimento" não cola, não convence e nada diz realmente. Afinal, o sr. Ângelo Calmon de Sá não era invisível, o Econômico não era um ectoplasma no sistema bancário. Tudo o que houve lá dentro -o que se sabe é o que ainda não se sabe- teve a bênção das autoridades -e o sr. Pedro Malan era uma delas.
As desculpas que até agora apresentou nada esclarecem. Ou ele foi cúmplice da bandalheira ou dela não teve conhecimento. Num caso como no outro fica arranhada a autoridade de seu porte e passado.

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