São Paulo, sexta-feira, 2 de fevereiro de 1996
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Matando a saúde

A proposta de lei sobre planos de saúde privados que tramita na Câmara dos Deputados é a negação do juramento de Hipócrates. Pela proposta, doenças contraídas antes da assinatura do plano não teriam cobertura. Isso abre a brecha para que os planos de saúde deixem de cobrir muitas doenças, que, em tese, começam a formar-se muito antes de o médico ou o paciente terem a menor chance de detectá-las.
Apenas no campo da oncologia, sabe-se que algumas substâncias químicas são capazes de originar cânceres, mas muitas vezes levam de 20 a 30 anos para fazê-lo. Pelo projeto de lei, a administradora do plano poderia alegar que não é responsável por cobrir uma doença que se tenha originado 20 anos antes da contratação do plano.
O primeiro a associar um tipo de câncer a uma substância química foi Percival Pott, em 1775, que constatou a alta incidência de câncer no escroto entre limpadores de chaminé e a atribuiu à exposição à fuligem. Depois, descobriram-se outras substâncias altamente carcinogênicas, como os asbestos.
Alguns vírus também são capazes de provocar cânceres mesmo anos e anos depois da contaminação. É o caso, por exemplo, do linfoma de Burtitt ou do carcinoma nasofaringal, que estão associados a um tipo de herpesvírus, o Epstein-Barr. O HSV-2 e o papillomavírus também estão ligados ao surgimento de cânceres genitais.
Muitas outras doenças também encontram um largo tempo entre a sua suposta origem e a manifestação diagnosticável. Manter o projeto de lei como está é cair no lobby dos planos e cometer um crime contra a saúde pública.

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