São Paulo, sábado, 10 de fevereiro de 1996
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Obra de Hillary sobre infância está entre os mais vendidos nos EUA

GILBERTO DIMENSTEIN
DE NOVA YORK

Barbara Bush e Hillary Clinton têm pelo menos três coisas em comum: viraram primeiras-damas, escreveram livros e conseguiram entrar na lista dos mais vendidos.
A diferença é que Barbara Bush, casada com um republicano (George Bush), escreveu sobre Millie, sua cachorrinha; Hillary, mulher de um democrata (Bill Clinton), num toque de esquerda, analisa a infância nos EUA.
A diferença de temática e os respectivos sucessos literários trazem uma certeza e uma dúvida. A certeza: os americanos adoram ler os relatos confessionais de suas primeiras-damas.
A dúvida: difícil saber hoje se eles gostam mais de suas crianças ou de seus cachorros. Afinal, é mais fácil encontrar aqui adolescentes sozinhos ou abandonados do que animais de estimação perambulando pelas ruas.
Não vai nenhum exagero na comparação. Por dia, 19 crianças ou adolescentes são assassinados ou cometem suicídios; o homicídio é a principal causa de morte dos jovens negros. Um em cada quatro bebês nasce numa família desestruturada; 135 mil alunos levam armas para as escolas.
A mortalidade infantil nos EUA é a maior entre os países industrializados. Se tomarmos indicadores apenas dos negros americanos, eles ficam abaixo de países da América Latina (muito abaixo de Cuba ou do Chile) e até da Ásia.
Esse contraste é o cenário que gerou "It Takes a Village" ("Exige uma Comunidade", 318 págs., Simon & Schuster), de Hillary Clinton, primeiro lugar na lista do "The New York Times".
O título não tem tradução literal. É baseado num provérbio africano que, na década de 80, entrou no vocabulário de educadores nos EUA -para se educar uma criança, diz o provérbio, se exige toda uma comunidade, ou seja, não apenas governo, mas os pais, as igrejas, a imprensa.
O livro explora a sensação disseminada nos EUA de que os jovens estão ameaçados e desprotegidos diante das drogas e da violência: pela ineficiência governamental (escolas ruins, pouca assistência à saúde das mães) e pela ausência dos pais.
É o conceito social contemporâneo: estudiosos em marginalidade infantil sabem que políticas públicas sem envolvimento da família tendem ao fracasso. O sucesso escolar depende, em boa parte, tanto da expectativa e envolvimento dos pais quanto do nível da escola.
Crianças se tornam meninos de rua não apenas por causa da pobreza, mas porque não suportam o ambiente de violência doméstica.
Hillary trafega em torno desses conceitos, usando sua experiência de mãe emancipada, absorvida pela profissão -com a angústia de ficar fora de casa, por exemplo.
Revela que, por saber dos impactos do divórcio na saúde psicológica dos filhos, conteve ímpetos diante de Bill Clinton.
Ao tentar entendê-lo, conta que ele não conheceu o pai (morreu quando tinha 4 anos) e que o padrasto, um bêbado, agredia a mãe.
As fofocas de Washington sugerem que nem sempre essa tentativa é tão altiva. Falam em cinzeiros voando, lustres estilhaçados, em meio a gritaria.
Fugindo do tom confessional, Hillary manuseia também sua experiência como advogada, há muito interessada nos direitos da infância; sempre esteve ligada às mais combativas organizações governamentais, quando produziu estudos e propostas sobre a legislação em torno da infância.
O livro provoca reações diferentes. Os apreciadores dos livro enfatizam que a mensagem é correta, transmitida num momento correto, devido à crise da sociedade.
Obviamente que, mais do que entrar em primeiro lugar da lista, ela quer continuar como primeira mulher na Casa Branca.

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