São Paulo, domingo, 11 de fevereiro de 1996
Texto Anterior | Índice

Acupuntura é nova arma contra o vício

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os traços da heroína nos arquivos da polícia e nas clínicas de tratamento do Brasil ainda são raros e ocasionais. Ocorrem, na maioria das vezes, por conta de estrangeiros de passagem.
Há, no entanto, quem aposte que ela vai chegar. "Copiamos os modelos lá de fora", diz a psiquiatra Patrizia Donatella Streparava, diretora do projeto Phoenix, que atende dependentes nos dois extremos da escala social.
Enquanto a heroína não vem, o país já está adotando um tratamento que começou na China com dependentes dessa droga: a acupuntura. Essa terapia à base de agulhas espetadas em pontos precisos do corpo vem ajudando na recuperação de centenas de viciados em cocaína e crack.
Trinta anos atrás, médicos franceses descobriram o sucesso que os chineses vinham obtendo ao usar a acupuntura em dependentes de ópio. E exportaram a idéia para muitos países.
Em Nova York, a psicóloga brasileira Ana de Oliveira vem coordenando a implantação de serviços de acupuntura na rede pública que atende a viciados em heroína e crack. Aprendeu com seu professor Michael Smith, médico do Lincoln Hospital, tratando os dependentes de heroína do Bronx.
No ano passado, Ana esteve no Brasil falando de sua experiência. "Estamos conseguindo os mesmos resultados do Lincoln Hospital", diz o fisioterapeuta Márcio Luna, 35, amigo de Ana e acupunturista no Rio. Segundo ele, 80% dos pacientes que combinam acupuntura e psicoterapia deixam as drogas.
"A acupuntura tem se mostrado de fundamental importância, mas ainda é vista com preconceito pelos psiquiatras brasileiros."
A maioria dos casos é tratada com sessões de acupuntura que vão se espaçando ao longo de um ano. "A aplicação das agulhas baixa a ansiedade, reduz a síndrome da abstinência, desintoxica e aos poucos equilibra o organismo", diz. "O paciente vai deixando a droga naturalmente."
Em São Paulo, o médico chinês Tai Hsing-I promete a cura de qualquer dependência com agulhas e chás misteriosos em apenas 15 dias de internação. Não há acompanhamento psicoterápico. "Basta ter vontade", diz Tai.
Tai diz que a terapia é fruto de 13 anos de estudos de um instituto de Taiwan. Os textos, em chinês e inglês, afirmam que o segredo dos chás não são revelados por serem "propriedade intelectual".
Aos incrédulos, Tai Hsing-I oferece o testemunho de ex-pacientes. Um deles, o empresário R.T., 47, conta que fumou crack três anos, passava dias fora de casa, vivia em favelas procurando drogas, afastou-se dos filhos pequenos e quase faliu nos negócios. "Há seis meses vivo sem drogas. Quando sinto que estou tenso, faço uma sessão de acupuntura."
Fage Marat, 49, do Instituto Marat de Auriculoterapia, diz que já tratou 44 mil fumantes e centenas de dependentes de drogas pesadas. Mas não acredita que só a acupuntura resolva o problema desses dependentes. "A acupuntura pode tranquilizar alguém, mas não vai curar suas ansiedades. A parte emocional deve ser tratada por um psicanalista."

Texto Anterior: 'Brasil quase não se manifesta'
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.