São Paulo, domingo, 11 de fevereiro de 1996
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Astros da NBA celebram 'justiça social'

MELCHIADES FILHO
ENVIADO ESPECIAL A SAN ANTONIO (TEXAS)

Mais do que a técnica e a plástica do basquete, o 46º All-Star Game festeja hoje a redenção de um grupo de excluídos.
"O esporte nos salvou. Não tenho receio de admitir isso", disse à Folha o ala Scottie Pippen (Chicago), titular da seleção do Leste que pega a do Oeste a partir das 20h34 (horário de Brasília).
"Meu sonho era conseguir um emprego", contou o pivô Patrick Ewing (New York). "O meu era escapar da polícia", disse o ala-pivô Charles Barkley (Phoenix).
Considerado o jogador mais completo em atividade da NBA (National Basketball Association), o menino Pippen dividia o quarto com nove irmãos, em Arkansas.
Aos 18 anos, era faxineiro no ginásio em que seu time universitário treinava -para compensar a aposentadoria do pai, funcionário de um moinho que parou de trabalhar depois de sofrer um derrame.
Hoje, fatura US$ 3,8 milhões/ano só em salários. Divide com um só irmão uma casa de 24 cômodos no subúrbio chique de Chicago.
Ewing fez seu nome nos EUA como o pivô com melhor arremesso da história da NBA.
Pequenino, desembarcou em Nova York. Sua família, da Jamaica, instalou-se em um cortiço.
Ewing entregava jornais e leite -e sonhava em ser o novo Pelé, antes de seus ossos "explodirem" e levarem-no ao basquete.
O pivô ganha hoje o maior salário dos 400 atletas da liga norte-americana: US$ 18 milhões/ano.
Barkley, um dos mais populares atletas dos EUA, é conhecido pelo vigor com que tromba sob as tabelas em busca da posse da bola.
No Alabama, aos 12 anos, espremia-se no vão debaixo de sua casa, na lama -para escapar do "rapa" dos policiais.
Em janeiro, provocado pelos dirigentes da sua equipe, o ala-pivô abriu ao público sua conta bancária: um saldo de US$ 20 milhões.
Reunidos esta noite no Jogo das Estrelas, Pippen, Ewing e Barkley e os demais convocados fazem questão de transformar o megaevento numa festa de luxos e jóias.
Cada atleta levou para San Antonio uma média de 20 pessoas, entre parentes e amigos.
Uns alugaram casas para alojar a turma. Outros reservaram andares inteiros de hotéis de luxo.
Michael Jordan, o maior jogador da história do basquete, por exemplo, pagou a viagem para seus companheiros de golfe -seu principal hobbie.
"É muito bom poder proporcionar conforto àqueles que sofreram a seu lado", afirmou Anfernee Hardaway, baleado na adolescência por assaltante em Memphis.
"Podemos dar um exemplo à comunidade negra", opinou o ala Juwan Howard (Washington), que faz sua estréia em All-Star Games.
Não à toa, Jordan e cia. viraram modelo para milhões de crianças.
Com isso, o All-Star Weekend transforma em frenesi a cidade em que acampa a cada fevereiro.
Legiões amontoam-se fora dos ginásios e hotéis, em busca de um autógrafo ou de uma foto do ídolo.
"É o poder do dinheiro. É a raiz de todo o mal, e o combustível de tudo que é bom", sentenciou o armador Reggie Miller à Folha.
O ingresso para o Jogo das Estrelas alcançava ontem o valor de US$ 3.000 nas mãos de cambistas.
A partida é o carro-chefe de marketing da NBA, uma espécie de vitrine viva do que a liga norte-americana tem promovido.
Os dez titulares foram escolhidos pelos torcedores, em eleição direta (via Internet e por meio de urnas espalhadas pelos EUA). Os reservas foram indicados pelos 29 treinadores da NBA.
Trata-se da maior festa do basquete do planeta. Quase 150 países receberão as imagens pela TV, numa estimativa de 200 milhões de aparelhos ligados.
"Às vezes, me espanto com o tamanho que isso está ganhando e com a gigantesca responsabilidade que passo a ter. É preciso parar para pensar. São 400 vagas na NBA. Não podemos ser modelos de ninguém. Somos uma exceção."
O desabafo é de Grant Hill, o mais votado para o All-Star Game, um dos únicos que não teve infância pobre e que frequentou boas escolas -graças ao dinheiro do pai, ex-astro do futebol americano.

NA TV
Bandeirantes e ESPN, 20h34

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