São Paulo, sábado, 17 de fevereiro de 1996 |
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'O Catálogo' não está interessado no amor
MÔNICA RODRIGUES COSTA
Aliada do inesperado, uma mulher -Suzanne- entra na vida de um homem, invadindo seu apartamento e alterando sua rotina. Suzanne procura por Ferrand, que a abandonou depois do amor. Não aparenta sofrer por isso. Quer ficar no apartamento de Jean-Jacques, saber das mulheres que ele conquista e registra em um livro contábil transformado em catálogo. Casualmente, Suzanne poderia também estar incluída ali. A forma como as falas são conduzidas no palco, com simplicidade e clareza, destitui os fatos cotidianos de significância, especialmente de tensão dramática. A situação de "O Catálogo" parece, de certo modo, com o que Maurice Blanchot escreveu para definir a poesia de Mallarmé: "O poema não é o discurso -é a gênese; o discurso não começa nunca, só se repete cada vez mais. Mas o poeta é alguém que ouviu o discurso, tornou-se seu intérprete e mediador e o reduziu ao silêncio, ao pronunciá-lo". No espetáculo, a intrusão de Suzanne, que deveria parecer absurda, passa a ser um fato banal. Mas "O Catálogo", assim como não busca retratar o absurdo, não busca a verossimilhança, não parece interessado no amor. A interpretação dos atores, especialmente a de Graziella, incorpora a insignificância face à vida. Suzanne não quer ser nada, sonha com uma casa automática em que basta imaginar um copo para ele aparecer. Ao mesmo tempo, deseja tudo, faz supermercado, põe as coisas no armário dele. Graziella representa essa ambiguidade. Destitui as coisas do lugar original, muda arbitrariamente de figurino, traduz-se em gêneros de mulheres diferentes. Construída assim, a personagem contamina Jean-Jacques, que vai adotando o modelo da mulher. Como sua indiferença é falsa, "O Catálogo" está carregado de ironia, põe em xeque o que é dito. A faxineira confunde-se com a contra-regra, que aparece, bebe o resto de vinho, mexe nos objetos. "O Catálogo" chega a ser engraçado e a provocar impasse, por isso merece ser visto. Peça: O Catálogo Autor: Jean-Claude Carrière Onde: Centro Cultural São Paulo (r. Vergueiro, 1.000, tel. 277-3611) Quando: De qui a sáb, às 21h30, e dom, às 20h30 Quanto: R$ 8,00 Texto Anterior: Série remasterizada resgata quase três décadas de gravações Próximo Texto: Buemba! Vai-Vai indo que eu não vou! Índice |
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