São Paulo, segunda-feira, 19 de fevereiro de 1996
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Metalúrgica quer mudar lei e manter as contratações

SUZANA BARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Paulo José Lucia, 40, principal executivo da Aliança Metalúrgica, ganhou fama na semana passada ao ser o primeiro -e único- empresário a assinar o polêmico contrato social com redução de encargos sociais.
Lucia, que assumiu a Aliança há dois anos para reestruturar a empresa, acha que o acordo é a forma de viabilizar o problema do desemprego e de começar a combater o custo Brasil.
Um dia após a liminar da Justiça, que o obrigou a contratar de acordo com as regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), Lucia deu emprego a mais 25 pessoas pelo acordo coletivo. Seus planos são chegar aos 85 empregados logo após o Carnaval.
A liminar da Justiça é inócua. Precisamos é mudar a legislação, diz ele na seguinte entrevista.
*
Folha - A Aliança foi a primeira e única a assinar o acordo. Por que vocês saíram na frente?
Paulo José Lucia - Por circunstância. Há cerca de um mês, começamos a discutir a questão do desemprego com o Paulinho (Paulo Pereira da Silva, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo) e a questão do custo Brasil estava muito em voga. Então falei que poderíamos reduzir o desemprego se houvesse uma forma melhor de contratar.
Folha - Mas o sindicato concordou desde o início em reduzir encargos sociais?
Lucia - O Paulinho já estava com essa idéia e pensamos em fazer um contrato diferente. Revimos todos os itens de custo da empresa e, obviamente, o custo Brasil passa pelas conquistas sociais e pelos impostos. Eu pago o INSS, mas, ao mesmo tempo, tenho de dar assistência médica decente para 850 trabalhadores. Vimos que existe muito espaço para mudar. Foi um contrato feito a quatro mãos. Só depois os sindicatos patronais foram chamados.
Folha - Quais são os ganhos da Aliança com a contratação?
Lucia - Falando de forma míope, muito pouco. São 85 pessoas que representam 10% do meu efetivo e que reduzirão meus custos com encargos em 30%. A economia de custo deve representar US$ 130 mil por ano. Mas o motivo que fez a gente entrar nessa polêmica é que, se o Brasil inteiro entrar, se a gente conseguir mudar a legislação, teremos uma redução de custo em cascata. É a forma que temos de ficar competitivos.
Folha - Com o dinheiro que gastaria para contratar 74 funcionários a Aliança conseguirá contratar 85, o que dá um ganho de cerca de 15%. Vale a pena comprar uma briga por 15%?
Lucia - Lógico que não. Mas a questão não é essa. É o efeito cascata que teremos com a adesão dos fornecedores.
Folha - Quando saiu a liminar, na quinta-feira, o senhor declarou que ela não tinha validade. Por que a decisão de enfrentar a Justiça?
Lucia - Vou respeitar a liminar do TRT. O problema são os pontos apontados pelo TRT. O juiz disse que tenho de contratar com carteira de trabalho. Qual é a diferença? Isso vai contar para a Previdência, porque eu desconto o INSS.
Folha - Mas como o funcionário prova que está contribuindo?
Lucia - Dou uma declaração. O juiz também cancela a cláusula de contratação temporária. Mas posso contratar por quanto tempo quiser. É inócuo o que o juiz está falando.
Folha - Com a pressão contrária, em algum momento o senhor pensou em retroceder?
Lucia - Não. Eu esperava que o Aidar (Rubens Tavares Aidar, presidente do TRT) esperasse o ministro. Mas o juiz fez o previsível.
Folha - O que dá para mudar nesse contrato?
Lucia - O contrato não pode mudar. Temos de ter uma legislação guarda-chuva, que garanta os direitos macros.
Folha - Pelo contrato, se o trabalhador entrar na Justiça a Aliança perde. Há uma negociação com eles para que não entrem na Justiça?
Lucia - De forma nenhuma.
Folha - A Metalúrgica Helfont falou que ia entrar e desistiu. A Fiesp abandonou a Aliança nesse acordo?
Lucia - A Fiesp nunca me procurou. Quem falou comigo foi o empresário Nildo Masini, que nem sei quem é (Masini é presidente do Sindicato das Indústrias de Trefilação e Laminação de Metais Ferrosos no Estado de São Paulo).
Folha - O senhor espera apoio da Fiesp?
Lucia - Não. Pelo que eu entendo, a Fiesp espera apoio meu.
Folha - Há empresas procurando a Aliança?
Lucia - Umas dez me ligaram. Com a liminar, todas sumiram.
Folha - Mais alguém deve assinar o acordo?
Lucia - Muito difícil. Tem muita pressão, muita gente que depende de arrecadação. Mas com a mudança da lei, todo mundo vai correr atrás.
Folha - E se a lei não mudar?
Lucia - É impossível a lei não se atualizar. Se não mudar, este país não vale nada.
Folha - O senhor acha que o Paulinho é um bom líder sindical?
Lucia - Acho que ele tem futuro. É sensato, entende o lado da empresa e o do empregado.
Folha - E o Vicentinho?
Lucia - Não o conheço. Minha opinião é baseada numa certa antipatia que sinto pela filosofia da CUT.
Folha - O senhor votou em quem para presidente?
Lucia - No Fernando Henrique. Votaria de novo.
Folha - Outras providências também reduziriam o custo Brasil, como a reforma tributária. Por que começou com a redução de direitos dos trabalhadores?
Lucia - Mas onde está o volume do negócio? A reforma fiscal depende de quem são os motivados. Como você vai arregimentar o povo contra isso, se ele não é politizado? Mas se falarmos que vamos lutar pelo desemprego e que o único jeito é ter encargo mais barato, então a movimentação é muito maior.
Folha - Mas também não é o mais fácil, já que o trabalhador é mais frágil?
Lucia - Não. O sindicato não abre mão das conquistas sociais, que são as férias, o 13º salário. Vamos mexer no que a gente sabe que está um despautério, como o FGTS.
Folha - Onde mais dá para reduzir o custo Brasil?
Lucia - A reforma fiscal é importantíssima. Mas o grande problema é a sonegação.

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