São Paulo, domingo, 25 de fevereiro de 1996
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Independência pioneira destaca engenheiro

CÉLIA DE GOUVÊA FRANCO
DA REPORTAGEM LOCAL

Aos 35 anos, mas aparentando menos, Laercio Cosentino, diretor-geral da Microsiga, bem-sucedida empresa de software, poderia ser confundido com um seu funcionário do departamento técnico.
Jovens, bem vestidos, com telefones celulares sempre à mão, são eles que criam e desenvolvem os programas para computador que permitiram que a empresa dobrasse seu faturamento em 95.
A grande maioria dos 200 funcionários da empresa tem formação universitária.
Há alguns anos, o perfil profissional de Cosentino era muito parecido com esse.
Nascido em São Paulo, numa família de classe média de origem italiana (ele tirou o passaporte italiano embora nem fale a língua), Cosentino se formou em engenharia eletrônica na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.
Poli
Durante os cinco anos de faculdade, ele também trabalhou numa empresa de informática, a Siga, primeiro como estagiário, depois como analista de sistemas até chegar ao posto de gerente.
A diferença de Cosentino é que, recém-formado, em 1983, ele foi ousado o suficiente para propor ao seu chefe, o dono da Siga, Ernesto Haberkorn, uma parceria em bases iguais para a criação de uma nova empresa.
Haberton foi ousado o suficiente para concordar.
A Siga era uma empresa especializada em computadores de grande porte e na terceirização de serviços na área de informática.
A Microsiga, a nova companhia surgida da associação entre ex-patrão e ex-funcionário, escolheu outra especialidade, os programas para microcomputadores, então uma grande novidade.
A aposta da Microsiga acabou se revelando acertada.
A empresa começou com um microcomputador, uma mesa, Cosentino como único funcionário e seu Fiat 147 como frota.
Hoje, a companhia emprega 200 funcionários, tem 13 franqueados (2 no Estado de São Paulo) e quer repetir o feito do ano passado, dobrar de novo o faturamento e fechar 96 com vendas na casa dos R$ 25 milhões.
A Microsiga cresceu porque seus diretores colocaram suas fichas no que era então quase uma aventura, o mercado de microcomputadores, mas que nos últimos anos se tornou no grande filão do setor de informática.
Se fosse explicar para uma pessoa totalmente ignorante a respeito de informática o que a Microsiga faz, Cosentino diria que fabrica programas que dão vida aos computadores.
Mais especificamente, dão vida a computadores empregados pelas empresas.
Produto
Até recentemente, o principal produto da Microsiga eram os programas que permitiam o controle administrativo de uma empresa.
Mais de 2.000 companhias compraram esse tipo de software, que hoje já está na sua décima versão.
Agora, a Microsiga está se renovando e começando a explorar dois novos nichos de mercado, os quais permitirão um novo salto de crescimento para as empresas que fornecem softwares, acredita ele.
Os novos nichos são o mercado representado pelas microempresas e pelos profissionais liberais e o mercado criado pela Internet, a rede mundial de microcomputadores que hoje já tem milhões de usuários internacionalmente.
Cosentino espera que os produtos que está oferecendo nessas novas áreas facilitem a vida dos usuários de microcomputadores e da Internet.
A história profissional de Cosentino não se parece, porém, apenas a de boa parcela dos seus funcionários.
São muitos os casos de engenheiros e outros profissionais do setor de informática que, no final dos anos 70 e no decorrer da década de 80, que também abriram suas empresas de informática.
Muitas dessas companhias ficaram no meio do caminho. Não sobreviveram ao fim da lei de reserva de mercado de informática ou não aguentaram o drástico aumento na importação de produtos depois da abertura da economia brasileira nesta década.
Cosentino acredita que sua empresa sobreviveu e está crescendo porque ele e seu sócio conseguiram identificar nichos de mercado muito específicos em que era possível uma expansão de vendas.
Um exemplo é a decisão de competir na área da Internet, como provedora de serviços.
É grande o número de empresas do setor de informática que está fazendo exatamente a mesma coisa.
A Microsiga procura ser diferente e ter melhores condições para competir ao decidir explorar apenas uma faixa desse mercado -a companhia quer ter como clientes apenas outras empresas.
Ou seja, foi escolhido uma fatia do mercado onde a concorrência não é tão acirrada. Do grupo de consumidores em potencial já fazem parte muitos dos seus clientes.
Outra razão para o fracasso de algumas firmas de informática foi a incapacidade de seus dirigentes de administrarem uma empresa.
Apaixonados pela informática e concentrados apenas no desenvolvimento de novos produtos, esses empresários acabavam se esquecendo ou não podendo gerenciar a empresa que criaram.
Paixão
Cosentino acha que o caso dele é diferente porque ele é apaixonado sim, mas não pela informática e sim pela empresa que fundou.
A empresa não precisaria necessariamente ser de informática. Acabou sendo porque ele identificou essa área como cheia de possibilidades de crescimento.
Ele diz que tanto ele não é apaixonado por computadores que deixou de trabalhar com o desenvolvimento de programas há três anos para cuidar apenas da gerência da Microsiga.
Em casa, ele normalmente não "brinca" com computadores, garante.
Nas horas de folga, prefere um programa muito paulistano, levar a família para jantar fora ou vai ao teatro, um interesse tão grande que a Microsiga está patrocinando a nova montagem do grupo teatral Ornitorrinco, de São Paulo.
Além disso, ele diz que ao prestar serviços em outras empresas, como consultor ou dando suporte para os produtos que vendeu, aprendeu lições de administração ao observar como trabalhavam os dirigentes dessas companhias.
E mais: na Politécnica, ele não aprendeu tudo o que precisou na sua vida profissional, mas aprendeu como e onde buscar a solução para os problemas.
Apesar de reconhecer essa herança preciosa da Poli, a mais prestigiada faculdade de engenharia do país, ele diz que a decisão mais acertada da sua vida profissional foi ter decidido deixar de ser engenheiro e fundar sua empresa, assim que deixou a faculdade.

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