São Paulo, sexta-feira, 1 de março de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para Maluf, engarrafamento é benção divina

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

Depois dizem que quem fala besteira é o extraordinário ministro extraordinário, o Pelé.
Como é que pode o prefeito Paulo Maluf, tão estudado, tão viajado, tão lido, tão ido à ópera, tão ido à Galleries Lafayette, fazer a seguinte declaração diante de uma platéia de 200 empresários, no seminário do Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Regiões: "Graças a Deus que tem engarrafamento. Bendito engarrafamento. Engarrafamento é sinal de progresso"?
Sei, sei. Quer dizer que São Paulo vive em estado crônico de caos no trânsito por causa do progresso e não devido às árvores podres de cupim que despencam com qualquer chuvinha?
São Paulo tem um trânsito do cão porque é uma cidade progressista e não porque as constantes quedas de energia elétrica deixam os semáforos apagados por horas a fio?
São Paulo está à beira do "gridlock", o congestionamento total, porque é uma cidade cada dia mais rica, não por culpa dos milhares de bueiros entupidos que transformam as ruas em rios?
São Paulo tem um trânsito insuportável por que a economia vai de vento em popa, não por falta de linhas de metrô? Ora, faz-me rir.
O prefeito foi além. Em vez de defender o transporte público, esse sim, sinal de progresso em qualquer capital do mundo que se preze, Maluf disse que o automóvel "dá status, dá liberdade".
Pois eu quero ver no próximo inverno, quando a inversão térmica cair matando o paulistano, de que tipo de status e liberdade nossos pulmões vão estar usufruindo.
O desvario não parou por aí. Maluf disse ainda que quem não gosta de congestionamento de trânsito, que vá morar em Kathmandu.
Como não conheço nenhum paulistano chegado em engarrafamentos, imagino que o prefeito estivesse sugerindo que São Paulo inteira vá ser monge budista no Nepal.
Tudo bem, até me prontifico a ser discípula daquele fofo do Dalai Lama nos cafundós da Ásia, mas só se o prefeito for também.
E aproveitar a viagem para escalar o Himalaia. De mocassim italiano.

Texto Anterior: DNER pede para motorista evitar a Rio-Santos
Próximo Texto: Perguntar ofende; Viagem encurtada; bianca Castafiore
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.