São Paulo, domingo, 3 de março de 1996
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Sharon Stone fala de sexo, fama e amor

SHARON STONE
DO INTERNATIONAL PRESS SYNDICATE

Prefiro homens cujos cérebros cresçam mais do que seus pênis.
Meus sentimentos em relação a ser uma rainha do sexo são ambivalentes. Sabe como é, os homens são tão burros... Eles ficam pasmos diante da gente.
Qual é a mulher que não tem vontade de abrir a blusa e gritar: "Dá pra você parar de olhar meus seios? Tá querendo me ver levando os gêmeos pra passear?"
Antes de chegar a Hollywood eu ganhava US$ 500 por dia trabalhando como modelo da Ford em Nova York. Eu sempre quis ser atriz. Desde muito jovem eu me sentia deslocada na cidade operária de Meadville, Pensilvânia, onde cresci. Eu era incrivelmente estranha, deslocada.
Tenho dois irmãos -um mais velho do que eu e outro mais jovem- e uma irmã mais nova. Meu pai, que é ferramenteiro, estudou até a 6ª série. Minha mãe não completou o 2º grau. Eles estão juntos desde os 14 anos. Casaram-se e começaram a ter filhos aos 18.
O tempo que passei trabalhando como modelo em Nova York nos anos 70 me fez sentir que tudo em mim era errado -eu não tinha a altura certa, o peso certo, as formas certas, a atitude certa.
Meu peso oscilava muito. Quando seu peso vive oscilando entre 74 e 53 quilos, você tem que ter roupas de muitos tamanhos.
Ia fazer testes e as pessoas ficavam chocadas. Diziam: "Ela está gorda demais. Será que consegue perder esse peso em três semanas?" Eu dizia: "Perco em um fim-de-semana. Vou parar de comer e só".
Quando fiz 35 anos abri meus guarda-roupas e percebi que tinha roupas de três tamanhos diferentes. Pensei: "Estou cheia disto". Então mandei fazer todas minhas roupas do tamanho que eu estava então, que era o intermediário.
Passei anos fazendo um filme B atrás do outro, em que os personagens femininos não se pareciam com qualquer mulher que a gente conhece. Sempre eram viciadas em drogas ou álcool ou loucas.
Minha criação operária, interiorana, brecou minha ambição. Chegou uma hora em que eu comecei a aceitar as coisas. Eu tinha emprego, trabalhava com regularidade. Fazia três filmes por ano. Viajava. Comprei uma casa. Não era tudo que eu tinha sonhado, mas estava bom. Mas depois passei a pensar: "Odeio minha vida. Odeio".
Arranjei um empresário novo. Ele e eu começamos a fazer força para me colocar em filmes com diretores de nome, filmes produzidos pelos grandes estúdios. Mas eu ainda tinha dificuldade em conseguir os papéis que queria. Quando fui recusada para um papel por um diretor que me disse que eu não era sexy, resolvi tomar uma atitude.
Meu empresário e eu começamos a construir minha imagem pública. Achei que uma imagem pública de "malvada" não iria me restringir. Me daria muito mais liberdade, seria mais divertido. Por isso nosso estilo era um pouco picante. É engraçado porque minha persona pública é mais corajosa e engraçada, mais extrovertida do que eu.
Quando percebi que tinha me tornado uma boa atriz, coisa que consegui estudando arte dramática e não trabalhando nos filmes horríveis que fazia, comecei a entender que para poder me transformar numa grande atriz eu teria que ser uma estrela de cinema. E eu já estava tão velha que precisaria fazer algo rápido, para fazer com que isso acontecesse. Então comecei a fazer coisas para chamar publicidade.
Ninguém me achava sexy. Eu vivia ouvindo a mesma coisa: "Ela não é uma atriz principal; não é sexy". Então posei nua para um ensaio na "Playboy" em 1990. Não foi exatamente sutil. Foi como se tivesse gritado por um megafone: "Ei, olhem para isto aqui!"
Minha reserva original em relação a posar nua era que não me achava bonita ou sexy suficiente. Não me achava suficiente em nada.
Não gosto tanto do meu rosto quanto de outras partes do corpo: a parte de trás de meus joelhos, as partes macias do corpo. Gosto das minhas dobras, da nuca, do lado interno dos meus cotovelos.
Não me pareço com o que sou na realidade. Nunca me pareci. Mas agora me pareço um pouco mais, porque estou me integrando comigo mesma. Dizem que na primeira metade da vida você tem o rosto com o qual nasceu e na segunda metade, o rosto que merece. Acho que devo estar chegando lá.
Agora que estou mais velha e tenho muito mais autoconfiança, não quero ninguém me dizendo quem eu sou. Não quero mais ser usada para as fantasias das pessoas. Se as coisas que crio por acaso satisfazem uma fantasia, ótimo. E só.
Quando eu era criança, meu sonho era ser estrela de cinema. Essa era a fantasia com a qual eu brincava. Por isso, mesmo que eu more numa casa pequena, ande num carro mais velho e passe meus dias livres dando aulas de culinária para crianças sem-teto, faço questão de ser tratada como estrela.
Eu me tornei sucesso num filme que tinha estilo. Catherine Trammell (em "Instinto Selvagem") tinha grande estilo. Sou muito grata por isso ter acontecido comigo. Me transformou numa estrela de cinema, e eu fico feliz em me mostrar ao público e ser estrela.
Em matéria de roupas, prefiro as simples e clássicas, e acho que são as que combinam melhor comigo. Meu corpo é desajeitado -pernas e braços compridos, ombros grandes e um tórax curto e cheio de curvas... e um lugar realmente macio, de menininha, no meio.
Não gosto de mostrar essa parte realmente curva porque isso me deixa constrangida, sem graça. É como se me fizesse parecer oferecida ou algo assim. Ser sexy não é realmente meu estilo; gosto mais de ser chique do que sexy, e mais do que qualquer outra coisa gosto de calças e casaco.
Fiz a capa da "Playboy" em 1990 porque achei que assim eu poderia criar publicidade para mim, e funcionou. Mas não preciso mais fazer coisas desse tipo. Estou farta de Catherine Trammell. Não ligo mais para ela. Faz parte do meu passado.
Meu compromisso com o cinema pode ser comprovado pelo fato de que eu concordo em levantar da cama antes do amanhecer, quando se trata de fazer um filme. Eu odeio isso -odeio mesmo. Gosto de dormir 12 horas por dia.
No começo era realmente divertido. "Instinto Selvagem" foi um sucesso; de repente virei um novo tipo de estrela. Mas a coisa parece ter ganho ímpeto e atingiu um pico de frenesi que chega a ser assustador. Tenho que andar por aí com seguranças armados.
Lembro a primeira vez que ouvi pessoas dizendo: "Ela é fabulosa, adoramos ela". Depois: "Nós a odiamos, ela é uma puta, veja só o que ela anda fazendo!"
Passei por uma fase ruim uns dois anos atrás. As pessoas eram horríveis comigo. Me envolvi com um sujeito chamado Bill MacDonald. A ex-mulher dele queria aparecer, foi à TV e disse: "Sharon Stone consegue o que quer". Eu disse: "E daí, qual o problema?"
O grande escândalo é que eu o tinha roubado dela. Mas hoje não falo mais com ele. Fiquei esperta. A gente tem que olhar para alguém como Elizabeth Taylor, que passa por fases boas e ruins, mas ainda está de pé. Acho que isso é o melhor que se pode esperar na vida.
As pessoas dizem tudo que se pode imaginar de horrível, cada coisinha minúscula, idiota, é inflada até o ridículo. Se você teve boas notas na escola, você é um gênio. No dia seguinte você sai com um cara que largou a mulher e você vira uma puta, destruidora de lares.
As pessoas exageram tudo. Mas quanto mais se exagera, melhor, porque depois de ser aumentada ao máximo você sabe que a bolha vai explodir e depois desaparecer.
É esquisito, porque nunca sei qual vai ser o efeito de minha fama. Tem dias em que ninguém dá bola -tipo "Sharon Stone? grande merda". Outros dias, me tratam como se eu fosse os Beatles.
Depois houve aquela confusão sobre eu ter câncer ou não. Fiz vários testes que deram resultados conflitantes, positivos e negativos, e me diagnosticaram -errado- como tendo câncer linfático. Minha vida virou um inferno.
Em "Cassino" eu faço a mulher de Robert De Niro, que conheço há anos. Uma vez fiz um teste para um papel em "Era Uma na America". Me disseram que eu não servia para o papel porque eu tinha seios grandes demais. Não é engraçado?
Já fiz terapia. Foi na época do meu divórcio. Fui casada com um sujeito que era uma amor, um produtor chamado Michael Greenburg. Ficamos casados dois anos e separados um ano. Parece quer durou a vida toda.
Conheci meu namorado Bob Wagner, um diretor assistente, no set de "Rápida e Mortal". Parte do trabalho dele era me levar de carro até o set, todas as manhãs. Alguns dias chegávamos muito atrasados. Já trabalhamos juntos em "Cassino" também. Ele era tão doido quanto eu. Encontrei meu par. Nós dois temos personalidades febris.

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