São Paulo, quarta-feira, 6 de março de 1996
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A briga pelos leilões de café

DAGMAR CUPAIOLO

Em 1995, o brasileiro consumiu nada menos que 10,1 milhões de sacas de café.
Uma quantidade surpreendente se levarmos em conta que em 95 foram colhidas 12,5 milhões sacas (uma quebra de safra decorrente das geadas de 94 que dizimaram grande parte da lavoura cafeeira).
Mesmo comparado o consumo às safras históricas de 26 milhões de sacas, não há como negar: o brasileiro é o maior consumidor do mundo do seu próprio café. O óbvio seria que esse mercado cativo, esse cliente fiel e tradicional, fosse tratado como um rei, não só pelas indústrias de torrefação e moagem, mas pelos próprios produtores e comerciantes de café.
Entretanto, com exceção da ABIC (Associação Brasileira da Indústria de Café), que não mede esforços nem investimentos em defesa do consumidor brasileiro, os demais segmentos continuam voltados ao mercado externo.
Esse pouco interesse pelo consumidor brasileiro é manifestado por diversos segmentos da cadeia produtiva constantemente, seja por meio de declarações ou, pior, de ações.
Desde a quebra da safra em 95 sabia-se que teríamos um longo período de escassez, que se tornaria caótico justamente neste trimestre em que estamos.
Afinal, a pequena colheita não poderia abastecer mercado interno e externo. Ora, mas escassez também eleva preços que, por sua vez, aumentam o lucro... E esse é o único objetivo daqueles que não se preocupam nen um pouco com o bolso do brasileiro.
Importar café e pleitear junto ao governo a liberação de seus estoques (de 14 milhões de sacas) foram as alternativas encontradas pela ABIC para defender o seu consumidor.
A primeira alternativa está em andamento, mas é lógico que são os leilões que podem suprir de forma mais imediata as necessidades do mercado, impedindo que a alta da matéria-prima seja repassada para o consumidor.
Embora tardiamente, o governo realizou seu primeiro leilão, na quinta-feira (08/02).
Colocou à venda 250 mil sacas, uma quantidade pequena se levarmos em consideração que a necessidade das indústrias é de 750 mil sacas mensais.
Mas por outro lado, leilões de pequenos volumes são tecnicamente mais ágeis e condizentes com a estrutura operacional dos próprios armazéns. Já os preços, infelizmente, foram altos, algumas vezes até mesmo superiores aos de mercado. Além disso, o agente financeiro -no caso o Banco do Brasil- criou diversos entraves, inclusive com exigências que não constavam em edital. Isso nos deixa admirados, tendo em vista que nosso setor tem um percentual mínimo de inadimplentes.
Há que se elogiar, porém, o fato de o governo ter mantido neste pregão as mesmas regras democráticas com que realizou os leilões no ano de 94: segmentado, específico para as indústrias de café.
Isso não só dá mais transparência às operações como permite a efetiva participação de pequenas e médias empresas, que formam a grande maioria do setor.
A opção do governo pelo leilão segmentado, porém, foi contestada por outros setores, como os exportadores e comerciantes que queriam leilões universais, abertos para todos.
Nota divulgada recentemente pela Febec (Federação Brasileira dos Exportadores de Café), afirmava que somente eles, exportadores, teriam condições de manipular os estoques reguladores.
Uma declaração infeliz pois, se fosse verdade, a indústria não teria comprado, manipulado, industrializado e colocado no mercado as mais de 2 milhões de sacas adquiridas nos leilões realizados em 1994.
Acontece que exportadores e comerciantes também têm entre seus clientes as próprias indústrias, e poderiam atuar como intermediários. Ou será que eles têm a intenção de vender para as indústrias cafés a preços menores ou iguais aos arrematados nos pregões?
A indústria não quer exclusividade na compra de cafés dos estoques reguladores do governo. Se outros setores têm necessidade de abastecimento, que pleiteiem para si leilões também segmentados.
O que a indústria, por meio da ABIC, não vai permitir é que seu consumidor fique à mercê de especuladores e oportunistas.

Dagmar Oswaldo Cupaiolo, 53, advogado, é vice-presidente da ABIC (Associação Brasileira da Indústria de Café) e diretor jurídico da Fiesp.

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