São Paulo, domingo, 10 de março de 1996
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Tyson troca 'materialismo' por redenção

JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
DA REPORTAGEM LOCAL

Seis anos, um mês e cinco dias depois de ter perdido o título mundial dos pesados para James Buster Douglas, sua única derrota em 44 lutas, Mike Tyson tem a chance de recuperar o trono.
No sábado, em Las Vegas (EUA), o lutador, que foi o mais jovem campeão do mundo dos pesados (aos 20 anos, em 86), enfrenta o inglês Frank Bruno pelo cinturão do Conselho Mundial de Boxe.
Em entrevista à Folha, por telefone, Tyson afirmou estar em melhor forma do que em 89, quando nocauteou Bruno no quinto assalto, defendendo os títulos das três principais entidades do boxe (CMB, AMB e FIB) na categoria acima de 86,183 kg.
"Minha cabeça melhorou", disse o lutador. "Naquela oportunidade, não estava 100%. Era materialista, pensava muito em dinheiro."
O ex-campeão pretende escrever um livro, para relatar experiências e os 1.095 dias que passou na prisão, de março de 92 a março de 95.
Condenado sob acusação de estuprar a modelo Desiree Washington, Tyson reclamou do sistema penitenciário nos EUA. "A prisão é como o boxe. Os dois são um negócio milionário", afirmou.
*
Folha - Como você está para enfrentar Frank Bruno?
Mike Tyson - Estou bem. Treinei forte nas últimas semanas. Tenho todas as condições de vencê-lo novamente. No boxe, você tem que estar muito bem fisicamente e mentalmente no dia da luta.
Não dá para fazer prognósticos, porque tudo pode acontecer. Depende muito do momento, do dia, de como você acorda.
Enfim, é como eu disse: tudo pode acontecer. Até mesmo num treino você pode se machucar, e a luta ser cancelada. O que eu sei é que, se a luta fosse hoje, eu ganharia.
Folha - Você falou em se machucar em algum treino...
Tyson - Não, não, não falei que a luta vai ser cancelada. Falei que tudo pode acontecer. Eu posso morrer amanhã, ou até hoje.
Folha - Quando enfrentou o Bruno a primeira vez, você era considerado imbatível. Contra ele, porém, a luta não foi tão fácil como as anteriores, você não achou?
Tyson - Boxe não é só a parte física, como muita gente que não conhece o esporte imagina. Depende de raciocínio, da cabeça.
Naquela ocasião, eu não estava 100% de cabeça. Era materialista, pensava muito em dinheiro, foi o início de uma fase ruim. Mesmo assim, acho que ganhei bem.
E, se a luta fosse hoje, ganharia novamente.
Folha - Hoje você está melhor do que em 89?
Tyson - Estou. Nos últimos anos, mesmo sem lutar, eu treinei bastante, gosto de me exercitar.
E a principal diferença é que a minha cabeça melhorou. Com o tempo, você vai ficando maduro.
Então, hoje eu me sinto mais completo, mais forte, preparado para ser campeão, o número um do mundo, você entende?
Folha - Você foi campeão muito jovem, mas praticava um boxe impressionante...
Tyson - É verdade, mas eu tinha apenas 20 anos, o que é pouco. Acabei me perdendo, cometi erros que me prejudicaram no ringue.
Folha - Que tipo de erros?
Tyson - Dinheiro, sucesso, me envolvi com pessoas erradas, tentava administrar tudo, pensava em agradar todo mundo. Era um brigando com o outro, cada um tentando tirar uma lasquinha de mim.
E você precisa estar amadurecido para lidar com tudo isso.
Folha - Quando você retornou ao boxe, em agosto de 95, depois de ter deixado a prisão de Indiana, alguns brasileiros chegaram a sonhar com uma luta sua no Brasil.
Existe a possibilidade de você disputar uma luta no Rio ou em São Paulo? No Rio, o estádio do Maracanã pode abrigar mais de 100 mil pessoas. O que você acha disso?
Tyson - Eu me preocupo em lutar, em ganhar toda vez em que eu entro no ringue... Quanto ao local, não veria problemas em lutar algum dia no Brasil. Eu já lutei no Japão, poderia lutar no Brasil.
Não estou dizendo que vou lutar aí, porque, você sabe, o boxe é um negócio. Os promotores teriam que acertar os detalhes, o dinheiro, OK? Acertando, tudo bem.
Uma luta envolve muitos interesses, muito dinheiro.
Minha próxima luta deve ter audiência de 200 milhões de pessoas.

LEIA a continuação da entrevista com Mike Tyson à pág. 4

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