São Paulo, quarta-feira, 13 de março de 1996
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Ignorância impera no caso dos Mamonas

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

Alguém poderia me explicar o que aquela senhora de mais de 50 anos fazia no último final de semana no local do acidente dos Mamonas Assassinas?
E o que passa pela cabeça daquela outra família, que não achou programa de domingo melhor do que visitar os túmulos dos rapazes e depois dar uma esticadinha até o local onde o avião caiu?
O "Aqui Agora" mostrou a sandice toda. A mulher de 50 anos é de Ribeirão Preto. Terá amargado horas no ônibus para prestar uma homenagem póstuma aos ídolos? A família, por sua vez, veio de carro de Campinas. Serão adeptos do lema: "A família que ama os Mamonas unida permanece unida"?
Duvido. Nenhum dos curiosos que a televisão flagrou vasculhando aquele maldito morro na serra da Cantareira demonstrava o menor sinal de dor. Estavam todos lá, felizes da vida, como se estivessem participando de um jamboree, como se a descoberta de algum "troféu" do acidente pudesse se converter nos 15 minutos de fama de que falava Andy Warhol.
Se está tão abatida com a morte dos Mamonas, por que essa gente esquisita não vai rezar na igreja ou, no caso dos descrentes, não dedica em nome dos Mamonas algumas horas de trabalho voluntário a uma instituição de caridade?
No "Programa Livre" de sexta-feira, Valéria, a namorada do Dinho, soltou os cachorros contra a imprensa. Acusou, entre outras, as publicações como o jornal "Notícias Populares" e a revista "Manchete" de desumanos e antiéticos por publicarem fotos dos corpos mutilados dos rapazes.
Basta que qualquer um de nós se coloque por um segundo na pele das famílias e dos amigos dos Mamonas para constatar que Valéria tem toda a razão.
Por outro lado, as edições do "Notícias Populares" e da "Manchete" que traziam as escabrosas fotos do acidente esgotaram em todas as bancas da cidade.
Morrer dormindo ou degolado, dá na mesma. E, no fim das contas, o único resultado prático da morbidez dessa corja de ignorantes que quer a todo custo esmiuçar o acidente, é colocar crianças diante das imagens de seus ídolos despedaçados.
Bom senso, limite e decoro são mesmo privilégio de poucos.

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