São Paulo, quinta-feira, 21 de março de 1996
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Sarney é a principal vítima da articulação do Planalto

'Congresso sai desmoralizado', afirma presidente do Senado

JOSIAS DE SOUZA; RAQUEL ULHÔA

JOSIAS DE SOUZA
Secretário de Redação
O Planalto executou, nas últimas 72 horas, uma superarticulação para isolar o presidente do Senado, José Sarney, e enterrar a CPI dos Bancos.
Ontem, Fernando Henrique Cardoso disse a seus auxiliares que a CPI seria liquidada hoje, no Senado. E Sarney, visto como "mentor" da idéia, "derrotado".
A estratégia foi deflagrada na segunda-feira. Em telefonema a Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), um aliado de todas as horas, Sarney comunicou que instalaria a CPI no dia seguinte.
ACM desaconselhou o gesto. Mas sentiu que Sarney não lhe deu ouvidos. Discou para Fernando Henrique.
O presidente decidiu acionar Marco Maciel. Pediu ao vice-presidente que visitasse Sarney ainda na noite de segunda.
Maciel estava de viagem marcada para São José do Rio Preto (SP). Voaria às 20h. Havia agendado uma entrevista na cidade.
Sarney recebeu Maciel na sala de estar de seu apartamento. Não chegou a recuar da idéia de instalar a CPI. Mas pareceu aberto à idéia de uma composição.
Maciel fez um relato telefônico da conversa a FHC. E, aliviado, voou para o interior paulista ás 21h.
Em Brasília, porém, os aliados de Sarney, entre eles os senadores Gilberto Miranda (PMDB-AM) e Renan Calheiros (PMDB-AL), continuaram maquinando a abertura da CPI.
Acionado, o ministro Sérgio Motta (Comunicações) discou para a governadora do Maranhão, Roseana Sarney, filha do presidente do Senado. Roseana comprometeu-se a falar com o pai.
Informado, Maciel pendurou-se no celular. Passava da meia-noite quando bateu o telefone para ACM. Pediu ajuda. E voltou para Brasília às duas da madrugada.
Na manhã de terça, ACM trombou com Sarney."Não conte mais comigo", disse ao amigo, conforme apurou a Folha. Sarney começava a falar sozinho.
O Planalto sacou, então, uma arma preparada por Saulo Ramos, amigo do peito de Sarney.
Trata-se de parecer redigido por Saulo em 88, à época em que era consultor-geral da República.
O Congresso ameaçava à época instalar CPI para investigar supostos atos de corrupção praticados sob o governo Sarney. FHC, então simples senador, era um entusiasta da comissão de inquérito.
Sarney dizia que o ato de convocação da CPI era genérico. E brandia o texto de Saulo, segundo o qual a comissão só poderia funcionar se convocada para investigar um fato determinado.
O parecer de Saulo, aprovado por Sarney, permanece em vigor. Tem poderes normativos sobre a administração pública.
E Fernando Henrique, hoje do outro lado do balcão, diz que também o projeto da CPI dos Bancos não prevê nenhum fato determinado a ser investigado.
O documento foi utilizado por Hugo Napoleão (PFL-PI), escalado pelo governo para questionar a CPI na Comissão de Justiça do Senado.
Ontem, em diálogo com Sarney, Saulo confirmou que seu parecer continuava de pé.
À tarde, o governo atraiu mais um aliado de Sarney: Jader Barbalho (PMDB-PA). Indicado para compor a CPI, Barbalho esteve no Planalto. E, à saída, falava em tom conciliador.
Sarney dizia que o Congresso "vai sair desmoralizado" se não instalar a CPI. "A população precisa de esclarecimentos", afirmava.

Colaborou Raquel Ulhôa, da Sucursal de Brasília

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