São Paulo, segunda-feira, 8 de abril de 1996
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Para as vacas loucas

CELSO LODUCCA

Semana passada esteve no Brasil o chairman e diretor de criação da Lowe Howard-Spink de Londres. Ele veio dar algumas palestras para profissionais e estudantes de propaganda na 10ª Semana Internacional de Criação. Holmes, Adrian Holmes é o nome dele.
A agência que ele dirige foi a primeira das 33 do grupo Lowe em todo o mundo e do qual minha agência faz parte. Por isso mesmo, me sinto um pouco assaltante ao usar este espaço público para comentar as idéias de alguém ligado a mim e a minha empresa. Mas também não seria justo puni-lo por isso.
Dentre os assuntos que Adrian abordou, um é de particular interesse para clientes, publicitários e leitores brasileiros. Com sua elegância inglesa, ele comentou que -no seu mercado- uma das coisas que está distanciando a publicidade dos consumidores e, portanto, da eficiência são os criativos que fazem campanhas para que só outros criativos entendam, aplaudam e premiem.
É como se criassem uma língua própria, particular, que pode ser entendida dentro da tribo mas nem toca, de leve, os seres humanos que vivem a "vida real". Um dialeto "publicitês" com discussões e formas "publicitescas".
É um tipo de prepotência bem conhecida, daquelas que causam cegueira a tudo que não é o próprio umbigo e, em última análise, prejuízo para quem paga: o cliente.
Adrian diz que, lá na Inglaterra, alguns publicitários vêm desprezando os consumidores, sua cultura, suas necessidades e, por consequência, esses clientes que insistem em investir dinheiro em propaganda e, pasmem, ter retorno. Esses tipos de publicitários estão nascendo lá logo agora, quando aqui, no Brasil, eles estão morrendo, mesmo que não saibam.
Mas como é que foi acontecer uma coisa dessas bem lá na Inglaterra, a Meca da propaganda inteligente e consequente? Nós que sempre os admiramos pela maturidade aliada à criatividade! Será que são os efeitos colaterais da globalização que, por um lado, profissionaliza (ou pelo menos começa a) alguns mercados e "desamadurece" outros? Ou o vírus da vaca louca que atingiu o rebanho publicitário inglês como uma praga incontrolável? Com isso, Adrian Holmes não quis defender o conservadorismo, a chatice, o certinho. Sua história como criador prova isso. Mas alertar para um descolamento da realidade, um autismo voluntário.
A boa propaganda tem a obrigação de instigar, surpreender, inovar e até correr riscos. O que, ao longo do tempo, tem-se mostrado a forma mais barata e eficiente de levar produtos ao Top of Mind dos consumidores e às listas dos mais vendidos. Mais daí a usar a verba dos clientes para se comunicar com uns outros poucos publicitários há uma distância enorme.
Para essas pessoas, recomendo uma mala direta, que é mais adequada. Como na poesia de Caetano, quando diz "é que Narciso acha feio o que não é espelho".
Talvez alguns publicitários precisem de menos espelhos e mais óculos. Ou esperar que os ingleses descubram uma vacina para o vírus da vaca louca, e importá-la. E haja vacina!

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