São Paulo, quarta-feira, 10 de abril de 1996
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Marketing barato

GILBERTO DIMENSTEIN

Ao prometer cadeia para banqueiros, o presidente Fernando Henrique Cardoso produziu frase de efeito para demonstrar coragem e evitar a imagem de patrocinador de mamatas financeiras -mas só revelou o subdesenvolvimento brasileiro, marcado pela impunidade.
Ele disse o óbvio, previsto em lei: provadas as fraudes nos bancos, os responsáveis vão para a cadeia. Num país em que prisão é, essencialmente, para pobre, o óbvio serve como material para bravatas e marketing barato, no estilo Collor.
São reveladores da impunidade brasileira os dados do FBI, a polícia federal americana: apenas nos últimos cinco anos, eles colocaram na cadeia 3.700 executivos por fraude no sistema financeiro.
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O FBI tem um programa especial apenas para combater os chamados crimes do "colarinho branco", envolvendo 2.600 agentes. Recebem cursos preparatórios que os habilitariam a trabalhar como sofisticados operadores do mercado financeiro.
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Nenhum outro programa do FBI demanda tantas horas de investigação. Resultou que, no ano passado, 18% de todas as prisões ou aberturas de processos pelo FBI, atingindo 8.613 casos, foram fraudes no sistema financeiro.
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O fato é que ainda estamos na pré-história da cidadania. Em essência, ainda reproduzimos as iniquidades de uma sociedade escravagista.
Um sintoma é como a óbvia prisão de fraudadores de colarinho branco pode ser motivo de surpresa.
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Pergunto: alguém daria manchete se um governante prometesse colocar assaltante de banco na cadeia?
PS - Todos os assaltantes brasileiros juntos, por mais eficientes que fossem, não conseguiriam gatunar os R$ 6 bilhões concedidos para tapar os buracos no sistema financeiro. E, muito menos, o valor das dívidas consideradas incobráveis do Banco do Brasil.
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Atenção, pais fumantes: vocês estão prejudicando a saúde de seus filhos. É o que aponta investigação da associação dos pediatras americanos.
Considerado o principal já produzido nesse segmento da população, o estudo informa que, por ano, 4 milhões de crianças adoecem devido à fumaça produzida pelos pais.
Pior: do total, 100 mil acabam numa mesa de operação.
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O chefe da pesquisa, Joseph Difranza, da Universidade de Massachusetts, fez uma comparação definitiva. Imagine o escândalo, sugeriu, se vendessem algum doce capaz de provocar doença em 4 milhões de crianças.
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Um ótimo exemplo: nos EUA, procuradores estão processando a indústria do fumo. Querem pegar o dinheiro gasto na saúde da população contaminada pela nicotina.
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Levando em conta os efeitos na saúde pública, não há razão para a indústria tabagista ser considerada mais nobre que traficantes de drogas.

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