São Paulo, domingo, 14 de abril de 1996
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Gugu adere ao jornalismo investigativo

MATINAS SUZUKI JR.
EDITOR-EXECUTIVO

A luta continua. Hoje, a Globo escalou o peso-pesado "O Guarda-Costas", filme campeão de bilheteria e aluguel em locadoras, para enfrentar o "Domingo Legal", de Gugu Liberato, no SBT.
Silvio Santos responderá ele mesmo. Traz seu programa para o meio-dia. Gugu entra logo em seguida para anunciar que o "Domingo Legal" hoje começará às 13h. Vai até as 17h, tentando preservar sua liderança no Ibope na guerra dominical pela audiência contra o noviço global "Ponto a Ponto" e contra o amigo Fausto Silva na última meia hora.
Gugu Liberato pauta, edita, produz e apresenta o seu programa. Mais do que isso: faz a direção, ao vivo, enquanto apresenta. Derruba e muda quadros "ao quente".
Na sexta à noite, quando recebeu a Folha, o multiempresário Antonio Augusto Liberato, 37, assinou o contrato para investir US$ 8 milhões em um parque de diversões indoor de 10 mil m2 em São Paulo, uma espécie de Gugulândia.
Ele brinca que "é duro lutar contra Hollywood", revela surpreendentes índices de audiência nas classes A e B, conta que foi ao ministro das Comunicações, Sérgio Motta, confirmar seu interesse em ter um canal e que vai investir mais na grande sensação do seu programa, o jornalismo, entrando na reportagem investigativa.
*
Folha - Por que você começou a investir em jornalismo?
Gugu Liberato - Eu sou formado em jornalismo pela Cásper Líbero, turma de 83. Foi uma coisa que eu sempre quis fazer.
Comecei, timidamente, a fazer o serviço de trânsito nas estradas nos fins-de-semana prolongados. O resultado foi muito bom.
Folha - Como você explica esse resultado?
Gugu - Aos domingos, as pessoas são carentes de informação. Elas só podiam ter informação à noite, no "Fantástico".
Eu tinha que oferecer alguma coisa a mais do que os outros programas oferecem. Meu programa tem que ser engraçado, ter artistas, ter música, como o Silvio Santos, tem que ter a característica de variedades do Faustão, mas tem que ter um diferencial.
Folha - Jornalismo interessa ao seu público?
Gugu - Engraçado, eu também tinha dúvidas. Mas, olhando a pesquisa do Ibope, eu tenho, acima de 25 anos, mais de 50%. E, curiosamente, somadas as classes A, B e C, a audiência é maior do que D e E.
Folha - A maior audiência foi com a cobertura do acidente com os Mamonas Assassinas, quando você bateu o recorde do SBT?
Gugu - Eu recebi a notícia às 7h30. Tirei todos os diretores da cama, pedi para eles irem ao teatro e levantarem todo o material.
Perguntei pelo nosso helicóptero. Ele estava no Rio. Mandei o comandante vir do Rio e pegar outro helicóptero, porque eu ia entrar no ar, ao meio-dia, com esse assunto.
Fui para o teatro. O Silvio Santos me ligou e perguntou o que a gente iria fazer. Ele estava preocupado porque, na morte do Ayrton Senna, quando o SBT passou o dia inteiro sem dar nada, toda a programação já estava gravada.
Eu disse ao Silvio para ele ficar tranquilo, que eu passaria o programa inteiro em cima do assunto Mamonas. Falei para ele: eu quero entrar no ar a partir das 11h com flashes avisando que eu estaria com esse assunto no programa.
Naquele dia, nós fomos a única fonte de informações, servindo não só ao público, como a uma série de veículos da imprensa.
Folha - Chamaram o seu programa de "CNN do Gugu".
Gugu - É, foi um negócio simpático por parte dos jornalistas.
Nós vimos naquele dia que estávamos no caminho certo, mas eu não pretendo colocar mais do que 20% de reportagem no programa.
Nós somos o primeiro programa de auditório do Brasil com endereço na Internet. O nível de pessoas que nos enviam mensagens é de professores de física da USP, médicos de Belo Horizonte, engenheiros do Rio de Janeiro.
Folha - Foi o jornalismo que fez a audiência decolar de vez?
Gugu - O jornalismo contribuiu de forma preponderante. O jornalismo hoje é a característica maior do nosso programa. As pessoas estão percebendo que, se acontecer alguma coisa importante, ela estará lá.
Folha - Qual será a próxima novidade do programa?
Gugu - Eu vou partir para o jornalismo investigativo. Tem muita coisa por aí que eu acho estranha, que eu resolvi investigar.
Folha - O que você acha do "Ponto a Ponto", que a Globo criou para concorrer com você?
Gugu - É um programa extremamente caro, custa uma média de R$ 200 mil por programa.
Folha - Quanto custa o seu?
Gugu - Por volta de R$ 50 mil por programa. Só que o meu dura quatro horas. O "Ponto a Ponto" dura uma hora e meia.
A Globo já tentou a Xuxa, o Chico Anysio, os Trapalhões, "Melrose", "Barrados no Baile", "Robocop", "Família Dinossauro, até o "ET", que é a maior bilheteria do cinema, eles colocaram em cima de mim e perderam.
Um programa ao vivo prevalece sobre tudo o que estiver gravado.
Folha - E o programa do Faustão?
Gugu - Nós temos praticamente a mesma origem, nós fomos repórteres. Mas o programa dele tem que ser diferente do meu. Nós dois conversamos sempre sobre isso.
Folha - É verdade que você comemorou o seu novo contrato com o SBT com o próprio Faustão?
Gugu - Foi uma coincidência. O jantar já estava marcado. Nós dois nos encontramos por acaso em Hong Kong e marcamos o jantar.
Folha - Então você recebeu uma nova proposta da Globo?
Gugu - Sempre existiu o namoro com a Rede Globo. Desde aquela vez em que eu fui para lá e acabei voltando para o SBT.
- Por que você não ficou lá?
Gugu - Porque o Silvio Santos descobriu que estava com aquele problema sério com a voz.
Ele então me pediu para ficar. Eu fui até à Globo e falei com o Boni. Ele me disse que não, me deu uma passagem, mandou eu passear e, na volta, eu estrearia na Globo.
Eu avisei o Silvio que eles não iriam me liberar. Então ele me disse: "Eu vou falar com o Roberto Marinho". Eu disse: "Eu não acredito que você vai". Ele respondeu: "Eu vou lá. E você vai comigo".
Pegamos uma ponte aérea e fomos. Ficamos esperando o Boni por duas horas. O Silvio contou para ele toda a história, a situação do seu estado de saúde. O Boni disse que a decisão não era mais dele, era do dr. Roberto Marinho.
O Silvio então ia subir para falar com ele, mas antes pediu para eu ir embora. O Boni disse que me levaria até a porta. O Silvio disse que não, que ele mesmo me acompanharia até o carro.
Ele me pôs no carro e me disse para esperá-lo no aeroporto. Ele subiu para falar com o dr. Roberto Marinho. Eu fiquei aflito, esperando no aeroporto. O Silvio voltou e disse: "Está tudo certo com o Roberto Marinho".
Eu acho que eles nunca mais se falaram. Daquela vez, fazia 15 anos que eles não se falavam.
Folha - Agora, por que você não foi novamente? Foi dinheiro?
Gugu - Primeiro, porque o meu contrato só vence em 98. Além disso, aqui no SBT, além do salário, eu tenho uma série de possibilidades de ganhar dinheiro.
Tem mais uma coisa que eu falei para o Boni, agora, no aniversário da Xuxa. Ele reclamou que eu tinha ficado de avisá-lo, antes da renovação com o SBT.
Eu disse a ele que, no SBT, quando eu preciso, eu ligo para o Silvio na casa dele. Eu ligo a qualquer hora na casa dele. Se eu preciso falar com ele às 8h da manhã, eu sei onde encontrá-lo. Eu falo com ele, invariavelmente, quatro ou cinco vezes por semana.
Como, na Globo, em um domingo, às 9h da manhã, eu poderia mudar a hora de entrar no ar? Como eu teria essa liberdade?
Eu coloquei o macaco para escolher entre a Coca, a Pepsi e o Guaraná Antarctica. Não precisei consultar ninguém. Essa liberdade, na Globo, eu não teria.
Folha - Você tiraria o Cid Moreira do "Jornal Nacional"?
Gugu - É difícil responder... A Globo está tentando recuperar o tempo perdido. Lá fora, os grandes jornais são apresentados por jornalistas. Não dá para escapar dessa tendência. Mas o Cid Moreira era um patrimônio, tanto é que eles não o tiraram totalmente.
Folha - O que você achou das mudanças no "Fantástico"?
Gugu - Ou o "Fantástico" volta ao que era, ou ele vai perder audiência. As matérias estão mornas.
Folha - É verdade que você faz o programa de olho no minuto a minuto da audiência e que, quando ela cai, você muda tudo no ar?
Gugu - Entra um artista para cantar três músicas. Se, com uma música, a audiência cair, ele canta só uma. Uma matéria que tem 15 minutos e começa a cair, quando a Globo sobe o comercial, eu subo os comerciais junto.
O cara vai para a Globo, vê que ela também está no comercial e volta. Só quando estou muito bem de audiência é que eu chamo o comercial a qualquer hora.
Eu tenho no estúdio uma televisão ligada na Globo, que fica virada para mim. Quando eu percebo que eles sobem os comerciais, eu também subo o meu comercial.
O certo seria bater comercial com comercial. Mas como eu tenho mais anunciantes que a Globo, abro uns cortes a mais.
Outro momento importante é na passagem dos programas da Globo. Todo fim de programa e começo de outro é vulnerável. É aí que tem que se dar tudo.
Folha - No dia da cobertura dos Mamonas, você deixou no pico. Entrou a Indy e derrubou a audiência. É ruim para o SBT?
Gugu - O pior é que o horário das corridas não é fixo. A Indy, infelizmente, ainda não dá audiência. Dá prestígio e dá dinheiro.
Folha - Mas você não patrocinava o piloto André Ribeiro?
Gugu - Eu apoiei como empresário. O mundo inteiro vê corridas de carro. A Indy e a Fórmula 1 são ótimas para divulgação de marcas.
Folha - Você confia no Ibope?
Gugu - Eu acho que deveria haver um outro instituto de medição. O monopólio não é bom.
O Ibope aumentou o número de residências. Ele pesquisava 200 casas on line. Hoje, ele pesquisa 600. A abrangência é maior. Os números são um pouco mais confiáveis.
Eu tenho esse sistema on line na minha própria casa. É uma questão técnica, mas eu questiono o fato de que, se são 600 casas, a somatória de audiência não bate.
Eles dizem lá: 74% estão ligados. Quando você soma todas as audiências, dá lá 110%. Eu perguntei ao Ibope porque dá essa diferença. Eles respondem que são pessoas que estão vendo TVs a cabo ou vídeo. Mas 10% é um índice muito alto para as TVs a cabo e vídeo.
Outro erro do Ibope é não pesquisar o interior. A programação com características populares tem audiências altíssimas no interior.
Folha - É verdade que, no novo contrato, você poderá ganhar até US$ 4,5 milhões por ano?
Gugu - Eu estimo ter ganho por volta de US$ 18 milhões nos últimos seis anos. Dá uma média de US$ 3 milhões por ano.
Folha - Agora você chegará aos US$ 4,5 milhões por ano?
Gugu - Pode alcançar. Depende do que nós temos de espaço, depende do uso da televisão para o lançamento de produtos etc.
Folha - Você tem uma tabela para fazer merchandising?
Gugu - Temos. Nós temos uma tabela que hoje deve estar girando por volta de R$ 60 mil o minuto.
Folha - Quais são suas empresas?
Gugu - Eu tenho a Promoarte, tenho a Gugu Produções e Merchandising, tenho um shopping de outlet, onde eu tenho uma loja e vou abrir mais quatro até o final do ano, tenho um kart indoor, vou abrir um franquia da Subway, tenho um incorporadora e tenho licenciamento de brinquedos.
Folha - Qual foi o faturamento dessas empresas no ano passado e quantos empregados você tem?
Gugu - R$ 18 milhões. Tenho entre 80 e 100 funcionários e prestadores de serviços.
Folha - E o seu canal de TV?
Gugu - Eu falei com o ministro Sérgio Motta na semana passada. Eu disse a ele que, desde 88, eu venho pedindo um canal. Ele me disse que o edital sairá em maio.
Ele me perguntou como seria a programação do canal. Eu disse que será um canal exclusivo de música popular brasileira. Eu já registrei a marca MPB/TV.
Mas o meu sonho era fazer um canal de jornalismo ao vivo. Uma CNN brasileira, que o SBT e a Abril já estão se preparando para fazer.
Folha - Será um canal pago?
Gugu - Não, eu quero fazer uma rede aberta em UHF.
Folha - Qual o futuro da televisão aberta no Brasil?
Gugu - A televisão a cabo só vai atrapalhar a televisão aberta a médio e longo prazos. Eu acho que nós teremos três redes grandes com uma programação variada. Os outros canais serão segmentados. E, ao contrário de muita gente derrotista, eu vejo muito campo futuro para a televisão em UHF.
Folha - Você está ficando calvo?
Gugu - Estou. Mas, como o meu pai, vou ficar calvo mesmo muito velho. Na TV, uso um creme para engrossar o cabelo. Não me importo com a calvície. Importo com o peso. Faço regime, passo fome para poder perder peso.

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