São Paulo, sábado, 20 de abril de 1996
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Passa moleque (1)

JUCA KFOURI

O zagueiro Flávio, do Vitória da Bahia, tem 21 anos e teve seu contrato com clube terminado em 16 de março passado. Ganhava R$ 1.500. O clube lhe ofereceu R$ 2.500 para renová-lo.
Flávio não aceitou. Pediu R$ 10 mil para começar as negociações e, em seguida, baixou para R$ 8.500.
O clube baiano não arredou pé de sua proposta inicial, pôs seu reserva, que ganha por volta de R$ 7.500, para jogar como titular e fixou o valor do passe de Flávio na federação local: nada menos que R$ 8 milhões, algo que o transforma no atleta mais caro do país.
O Vitória não cometeu nenhuma ilegalidade, pois está amparado pela Lei do Passe.
A pergunta é óbvia: pode alguém querer vender uma mercadoria por R$ 8 milhões quando não está disposta a pagar mais do que R$ 2.500 mensais para mantê-la?
Afora o fato de estarmos tratando de um ser humano, de um trabalhador reduzido à condição de mercadoria, o caso de Flávio, que é corriqueiro e está longe de representar absurdos do tipo trocar passes de atletas por chuteiras, como aconteceu com o meio-campista Beto, do Botafogo carioca e da seleção, ilustra a necessidade de acabar com o passe.
Porque ele agora está impedido de trabalhar como atleta profissional, não recebe um tostão enquanto sua situação não for resolvida e, certamente como quatro mais quatro são oito, ninguém pagará o que o Vitória pede por sua transferência.
E o caso só é contado aqui porque Paulo Carneiro, o presidente do Vitória, foi chorar as pitangas em Brasília tentando demover o ministro Pelé de sua proposta de modificação das relações trabalhistas entre clubes e atletas.
Carneiro diz que o Vitória investe muito nas categorias de base e precisa ter garantia de que esse investimento será preservado.
Além do novo projeto não prejudicar em nada quem investe em baixo, a regra geral nos clubes brasileiros é investir quase nada nos jovens, pagando mal para os técnicos que cuidam deles, frequentemente mais interessados em tirar proveito sexual dos garotos do que em ensiná-los a jogar futebol -coisa que, por sinal, o jogador corintiano Zé Elias deixou escapar outro dia no programa "Cartão Verde".
Por que, então, tanto esforço em defender a atual Lei do Passe?
A resposta será dada amanhã.

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