São Paulo, segunda-feira, 22 de abril de 1996
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Líder morto aos 17 estudou e foi ator

Trajetórias dos envolvidos são parecidas

FÁBIO ZANINI; IRINEU MACHADO
DA AGÊNCIA FOLHA

Oziel Alves Pereira, 17, um dos 19 mortos no conflito com a Polícia Militar na última quarta-feira em Eldorado dos Carajás (PA), chegou à coordenação estadual do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) em menos de dois anos.
"Perdemos uma das nossas mais promissoras lideranças", disse à Folha José Orlando Galvino, 30, outro líder do acampamento.
O MST acusa a polícia, com base em depoimento de sem-terra envolvidos no confronto, de ter matado Pereira depois de ele já estar algemado.
Pereira tinha 15 anos quando se integrou ao movimento. A primeira invasão em que tomou parte ocorreu em junho de 1994, quando um grupo de trabalhadores sem-terra entrou numa área conhecida como Cinturão Verde, pertencente à Companhia Vale do Rio Doce, em Parauapebas (PA).
Pereira foi um dos organizadores da marcha que os sem-terra faziam a Marabá e era um dos líderes do acampamento na rodovia PA-150.
Posições firmes
"Ele era uma pessoa ponderada, mas de posições firmes. Juntou-se ao movimento por idealismo e conhecia bem os problemas da região", afirma Galvino.
Pereira nasceu no Mato Grosso e tinha três irmãs e dois irmãos. Chegou a Parauapebas em 1983, quando seus pais compraram uma casa na cidade.
Cursou até a quarta série do primeiro grau num colégio estadual da cidade, mas teve de largar os estudos para trabalhar na lavoura.
Em agosto do ano passado, Pereira foi enviado pelo MST ao assentamento de Vila Diamante, em Vitória do Mearim (MA).
Com material escolar doado pelo governo do Estado e professores pagos pelos próprios assentados, fez um curso supletivo de seis meses, conseguindo certificado de conclusão do primeiro grau.
Ao retornar ao Pará, em dezembro, ganhou posição de destaque na direção do MST. Passou a participar de reuniões onde era definida a estratégia do movimento e o calendário de ocupações.
No final de 95, Pereira participou de uma montagem teatral feita no acampamento dos sem-terra em homenagem aos 300 anos da morte do líder negro Zumbi.
Protagonizou o personagem-título e passou a ser chamado de Zumbi pelos companheiros.
Sonho
Além de Oziel Pereira, identificado por um irmão, mais cinco sem-terra mortos foram reconhecidos por parentes. A maioria veio de Estados do Nordeste e migrou para o leste do Pará no final do ano passado, atraída pela possibilidade de receber um lote de terras.
Raimundo Lopes, 20, conhecido por "Raimundo Parazinho", militava no MST desde novembro.
Ele nasceu em Imperatriz (MA) e foi para a região do conflito quando houve a invasão da fazenda Macaxeira, em novembro. Era solteiro e trabalhava como borracheiro antes de se mudar para o acampamento sem-terra.
Também militante desde novembro de 95, José Alves da Silva, 25, de Açailândia (MA), era solteiro e trabalhava como lavrador.
Três dos identificados eram casados: Abílio Alves Rabelo, 45, Graciano de Souza, 46, e Joaquim Pereira Zera, 31.
Zera, casado havia nove anos, tinha três filhos. Nasceu em Alto João de Paiva (PI) e chegou a Curionópolis em 1969. Militava no MST havia cinco meses.
Graciano Olímpio de Souza, 46, era garimpeiro e, segundo sua família, juntou-se aos trabalhadores sem-terra há cinco meses, deixando a mulher e sete filhos.
Sua mãe, Bernarda Simplício da Silva, 81, diz que ele era de Marabá e trabalhou durante dois anos com garimpo de ouro em Altamira.
(FÁBIO ZANINI)

Colaborou IRINEU MACHADO, da Agência Folha, em Marabá

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