São Paulo, quarta-feira, 24 de abril de 1996
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Crescimento: refreado ou tímido?

ANTONIO BARROS DE CASTRO

Não dá mais para negar que o desempenho da economia brasileira, excelente do ponto de vista do controle da inflação, mostra-se decepcionante em outros campos.
E isso não apenas para aqueles particularmente preocupados com o chamado lado real da economia: o que está em curso hoje tampouco corresponde às expectativas dos gestores da nossa política econômica, conforme expressas no anúncio, em setembro de 1995, de uma nova fase de crescimento moderado e firme.
Há duas possíveis maneiras de encarar o frustrante desempenho da economia.
A primeira consiste em crer que, não estando ainda assegurada a estabilidade (vide o déficit fiscal), convém não arriscar as grandes conquistas do Plano Real.
Vista a questão por esse prisma, a economia continua simples e deliberadamente contida por uma política econômica que se nega a cair no canto de sereia do crescimento-já.
Uma segunda maneira parte da suspeita de que as dificuldades que se vão revelando têm outra origem, mais imediata e concreta que o atraso das grandes reformas.
Elas seriam consequência, antes de mais nada, da maneira pela qual o Plano Real precipitou o ingresso da economia no processo de globalização.
Numa palavra, a abertura e o atraso cambial, combinados e potenciados, geraram um quadro em que grande parte das empresas voltadas para a produção de bens internacionalmente comercializáveis ("tradables") encontra-se acuada e sendo levada a tomar decisões eminentemente defensivas.
Na prática, isso significa que, em diversas atividades e numerosíssimas empresas, as opções atraentes vão se tornando migrar para o comércio ou vender ativos.
Mas esse não é o único problema. Lembremos que a Argentina, que realizou amplamente as reformas que aqui se encontram emperradas, que obteve êxitos tão ou mais espetaculares no combate à inflação -e que parecia haver descoberto o caminho do crescimento-, sofreu em 1995 uma retração de 4,4% do PIB e não parece recobrar ânimo para crescer.
O Brasil, por sua vez, que travou vigorosamente a sua economia no primeiro semestre de 1995, talvez esteja descobrindo que é difícil voltar a crescer sem dispor de instrumentos de política econômica capazes de relançar a economia -e com as empresas intimidadas pela sobrecompetição a que estão sendo submetidas.
Uma interessante maneira de perceber o que está sendo dito é a seguinte: no Brasil como na Argentina, sucessivos anúncios de vultosos investimentos por parte de montadoras têm alimentado a idéia de que a nova economia está liberando poderosos impulsos de crescimento.
Ocorre, porém, que os princípios que deveriam pautar a nova política econômica não foram respeitados, em ambos os países, na área automobilística.
Que o diga a ala purista da política econômica em curso no país -que não se cansa de denunciar o retrocesso incorrido no caso dos chamados "regimes automotivos".
Há fortes razões para crer que na economia globalizada -mais do que nas antigas economias nacionais- as decisões intra-industriais e intrafirmas adquirem enorme importância.
A duríssima competição a que todos se encontram submetidos exige, a rigor, um alto grau de coordenação das decisões.
Uma solução consiste em que a própria empresa líder coordene o processo -e isso estaria ocorrendo, por exemplo, em Betim, sob o comando da Fiat.
Em escala nacional, contudo, não há como reproduzir no Brasil, hoje, esse tipo de coordenação. Quando mais não seja, porque as velhas relações do Estado com a economia foram destruídas -e nada foi colocado no seu lugar.
Ora, sem coordenação e sem socialização dos riscos, as reações empresariais, ressalvadas exceções, estão mesmo condenadas a ser tímidas e defensivas. O resultado global tende a ser medíocre em termos de crescimento e péssimo em termos de emprego -o que em nada beneficia a luta contra a inflação.

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