São Paulo, quarta-feira, 24 de abril de 1996
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'Balada do Pistoleiro' dilui vigor de 'El Mariachi'

JOSÉ GERALDO COUTO
DA REPORTAGEM LOCAL

"A Balada do Pistoleiro", de Robert Rodriguez, ilustra bem a avidez com que a indústria do cinema coopta e dilui os talentos surgidos à sua margem.
Há três anos, Rodriguez realizou com pouquíssimos recursos, atores semi-amadores e muita imaginação o "thriller" chicano "El Mariachi". O filme ganhou fama mundial porque muita gente acreditou na lorota de que havia sido feito com US$ 7 mil.
Era uma aventura absurda e frenética falada em espanhol e ambientada num sórdido vilarejo mexicano: um "mariachi" (músico popular) era confundido com um pistoleiro. Perseguido por traficantes, ele acabava distribuindo tiro e porrada para todo lado.
A pobreza da produção era constrangedora, os erros se contavam às dúzias, mas o filme era uma delícia do princípio ao fim, graças a seu frescor narrativo, seu humor, seu uso inventivo da câmera e dos recursos de montagem.
Executivos da Columbia viram o filme e, de olho num veio promissor (o do "cinema independente pero no mucho"), decidiram contratar Rodriguez para refilmá-lo com alguns milhões de dólares.
Nasceu assim "A Balada do Pistoleiro", que é uma espécie de continuação do filme original. Aqui, o "mariachi" (Antonio Banderas) virou pistoleiro de verdade para se vingar dos traficantes que mataram sua namorada.
Num vilarejo mexicano imundo, ele dizima em minutos um exército inteiro de traficantes.
Absurdos, divertidos, delirantemente coreografados, os tiroteios têm algo de faroeste espaguete e algo de filme de kung fu. O herói atira para todos os lados ao mesmo tempo, dá cambalhotas para escapar das balas, voa sobre mesas em câmera lenta -uma festa.
Nessas cenas, Rodriguez mostra todo o seu talento na manipulação da imagem e do ritmo. Aliás, além de escrever, dirigir e produzir, ele também montou o filme.
O problema não está aí. Está na fotografia publicitária (veja-se a caretice espantosa da cena de amor entre Banderas e Salma Hayek), no excesso de estilo e de pose. Abundam câmeras lentas inúteis, filtros dourados, caras e bocas de Banderas, referências "cult" (como as aparições de Quentin Tarantino e de Cheech Marin).
Tudo isso configura a fórmula da hora, a do independente domesticado, em que se misturam doses bem pensadas de violência, ironia, sensualidade e metalinguagem de modo a não ofender o gosto médio do público. Vale a pena ver, mas a invenção ficou longe.

Vídeo: A Balada do Pistoleiro
Produção: EUA, 1995, 101 min.
Direção: Robert Rodriguez
Elenco: Antonio Banderas, Joaquim de Almeida, Salma Hayek, Steve Buscemi Lançamento: LK-Tel (tel. 011 825-5766

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