São Paulo, quinta-feira, 25 de abril de 1996
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MST e o "massacre" de Eldorado

LAMARTINE NAVARRO JR.

Toda perda de vidas humanas é lamentável, e muito especialmente quando ocorre de forma violenta e desnecessária, como aconteceu no Pará.
É importante, porém, que a emoção consequente da violência das cenas levadas ao ar pela televisão não perturbe o julgamento correto do que vem realmente acontecendo na área rural.
Não se pode deixar que o "massacre" de Eldorado, incidente provocado pela atuação da PM ao tentar reestabelecer o trânsito em uma importante estrada do Pará, se transforme em uma espécie de salvo-conduto para as ações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que se configurem como ilegais.
É preciso ter em mente que a nossa Constituição garante o direito de propriedade e assim, no caso de invasões, os mandados de reintegração de posse devem ser cumpridos em tempo hábil, de forma a resguardar os direitos dos proprietários.
É mister que as ações policiais devam ser planejadas de forma a evitar violência, mas postergar indefinidamente as reintegrações porque os invasores estão armados e resistirão à lei e à ordem significa ignorar o Estado de Direito e provocar o recrudescimento dos conflitos no campo.
Vejamos o reverso da medalha no caso da fazenda Vale do Cantú, de nossa propriedade, situada nos municípios de Laranjal e Altamira (PR).
A propriedade foi invadida por 150 famílias do MST em 1º/10/95. No dia 5/10 a juíza da comarca de Campina da Lagôa expediu o mandado de reintegração de posse. O Incra-PR solicitou à Secretaria da Segurança postergar a reintegração de posse, pois estaria em andamento o processo de desapropriação da propriedade.
O secretário da Segurança atendeu a solicitação do Incra, a desapropriação não se concretizou e, em 20/12, a juíza expediu novo mandado que, até hoje, também não foi cumprido.
No entretempo, ocorreram na propriedade os seguintes delitos:
- Os invasores ocuparam 2/3 da fazenda, cortaram as cercas, misturaram o gado que estava em regime de seleção, queimaram e saquearam as casas dos funcionários e roubaram um trator Massey Ferguson com implemento.
- Provocaram vários tiroteios com os empregados da fazenda e não permitem trânsito na área ocupada.
- Roubaram 60 cabeças de gado e, ao distribuir o resultado da venda, se desentenderam e três sem-terra foram assassinados pelos seus pares.
- Semanalmente matam três cabeças de gado.
- Na sexta-feira, 5/4, ao realizar avaliação após entendimentos do Incra, que propôs a compra da propriedade, o signatário e os avaliadores foram atacados a tiros e obrigados a fugir usando os cavalos como escudo.
Todas as ocorrências foram objeto de queixa policial e reportadas à juíza de direito e ao secretário da Segurança.
A PM de Guarapuava mantém policiais na sede da fazenda exclusivamente para garantia das famílias dos funcionários que, expulsos das suas casas, lá se encontram abrigados.
Todas as atividades da propriedade estão paralisadas, o gado se encontra confinado em um terço da fazenda e as pastagens existentes não podem ser utilizadas.
Verifica-se assim que o cheiro da morte não exala somente de Carajás.
Ele persiste há sete meses no Vale do Cantú e os assassinos, por estarem infiltrados no MST, apesar de conhecidos, estão impunes.
Não é só o deputado José Dirceu que está com a alma vazia e amargurada.
Trago na boca o travo amargo da decepção, da frustração, do desencanto com este pobre país, onde hoje a lei tem dois pesos e duas medidas e onde a demagogia política chega ao ponto de transformar um movimento social legítimo, como o MST, em alavanca de desestruturação social e econômica.

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