São Paulo, domingo, 28 de abril de 1996
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O alfinete em ação

JANIO DE FREITAS

Qualquer que seja o tamanho do balão, um alfinetinho pode esvaziá-lo, com o resultado conhecido. As indicações de uma nova postura governamental, expressas na eloquência de um ministério só para a reforma agrária e na pronta indicação do futuro ministro, encontraram um alfinetinho logo nas primeiras 24 horas de existência.
Sob o pretexto de inquietação com o rumo que a reforma agrária estaria tomando no governo, os parlamentares contrários a ela, mais conhecidos como bancada ruralista, emitiram uma vaga ameaça de afastar-se das forças governistas. Foi o bastante para serem convidados a conversar por Fernando Henrique Cardoso. Mas não só com ele: também com Raul Jungmann, o futuro ministro do futuro ministério.
Os adversários da reforma agrária estão tranquilizados, desde anteontem, com o que ouviram do presidente, com o que ouviram do futuro ministro e com o que ouviram o presidente dizer ao futuro ministro. Isso não faz duvidar da vontade e das qualidades de Jungmann. Mas põe em dúvida a possibilidade de que as exerça na plenitude esperada.
O gênero de reação à ameaça de ameaça dos ruralistas resulta, com toda a clareza, do contraste entre as resistências à reforma agrária e a ausência de determinação governamental para ultrapassá-las. Os ruralistas, parlamentares ou não, sabem todos que está criada, e é crescente, uma situação insustentável em certas áreas rurais. Não sabem, porque ninguém pode ter certeza a respeito, a que levará a permanência dessa situação.
Na mesma medida, os ruralistas sabem que não há condições institucionais, sociais e qualquer outra para que uma reforma agrária avance em terras produtivas, com títulos legais de propriedade, relações de trabalho corretas, financiamentos e impostos regularizados. Logo, o ruralista é adversário da reforma porque infringe essas exigências das leis ou porque, não as infringindo, opõe-se a um dos objetivos essenciais da nação, de qualquer uma, que é a evolução socioeconômica.
Foi a estes tipos de ruralistas que depressa se deram as garantias desejadas. Não há, porém, como conciliar a satisfação desses resistentes com a realização das metas a que eles resistem. A simples tentativa de fazê-lo já implica, necessariamente, uma redução substancial das metas. É a eloquência do ministério, as promessas pomposas, é o balão se esvaindo.

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