São Paulo, segunda-feira, 6 de maio de 1996 |
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Criminalista quer 'pena de pobreza'
ABNOR GONDIM
"A pior pena para o corrupto é a pobreza", disse, na semana passada, ao retornar ao Brasil, após estudar na Universidade de Miami, por oito meses, penas alternativas usadas nos cinco continentes. * Folha - De que trata sua tese? Edmundo Oliveira - A tese busca uma visão de como está a tendência das alternativas de prisão no mundo. Há alternativas simples, como a proibição de residência: uma pessoa é proibida de morar em certo bairro porque praticou um crime ou pode ser proibida de sair do bairro onde mora. Folha - Qual a diferença entre uma prisão do Primeiro Mundo e uma prisão no Brasil? Oliveira - Na Europa e nos EUA, constata-se que as prisões são higiênicas, bem-conservadas. É obrigatório haver lugar para o estudo e para o trabalho a fim de que o preso não viva ocioso. Folha - Por que no Brasil não é possível a ressocialização de um criminoso? Oliveira - Desde que Pedro Álvares Cabral chegou por aqui, o Brasil vive o tormento de um sistema penitenciário caótico, e as prisões são universidades do crime. Desde o início do século, a Europa deixou de discutir prisão e passou a estudar alternativas. Estamos atrasados cem anos. Folha - Quais são essas soluções? Oliveira - A tese busca dar mais poderes para o juiz criminal no sentido de que ele faça tudo para evitar o encarceramento. Folha - Poderia citar exemplos? Oliveira - A França adota uma moderna punição ao proibir em determinados casos que a pessoa possa usar cartões de crédito ou cheque. Nos EUA, há monitoramento eletrônico. Folha - O que é isso? Oliveira - Um bracelete é acoplado ao braço do infrator. Ele pode optar por colocar no tornozelo ou num cordão. O bracelete tem um transmissor acoplado ao telefone da casa do transgressor. Isso serve para crimes médios e brandos, pessoas que não praticam crimes hediondos. Os EUA estão aplicando esse tipo de pena inclusive para punir a corrupção. Folha - Prisão deve ser aplicada para quem? Oliveira - Para aquelas cuja periculosidade os impeça de permanecer no convívio social. O que mais dói, no meu entender, para um criminoso rico, é torná-lo pobre. Que pague todos os débitos com a Justiça, indenizando com correção monetária e juros o que ele surrupiou da nação. Iria doer mais do que mandar essas pessoas para a prisão, passar três, quatro, cinco anos. Temos de distinguir a violência do convívio social de outros crimes. A violência do convívio social é a que atemoriza as pessoas, o estuprador, o traficante, aquele que não sabe se comportar e precisa de encarceramento. A prisão tem que ser restrita a casos necessários. Folha - E a corrupção? Oliveira - A corrupção é um dos crimes mais comuns no Brasil. Há dois anos, quando publiquei um livro sobre corrupção, o Brasil tinha 0,32% de pessoas condenadas por corrupção. Gente de classe média pra baixo, que não estava presa e nem deve ficar presa se não apresentam periculosidade. Temos de aplicar para eles as penas alternativas, incidindo basicamente sobre o seu patrimônio. Lamentável no Brasil é que a grande pena do rico, do corrupto, do criminoso do colarinho branco, é pagar caro um bom advogado. Mas não adianta também ele passar cinco anos na cadeia e continuar rico. Os corruptos tinham que voltar a ser pobres. Texto Anterior: Alistamento eleitoral causa filas nas capitais Índice |
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