São Paulo, terça-feira, 7 de maio de 1996
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Universidades: certezas e incertezas

JOSÉ MARTINS FILHO

O governador Mário Covas acaba de enviar à Assembléia Legislativa a proposta orçamentária do Estado para o ano de 1997. Esse é um assunto que, desde a preparação e a votação da proposta anterior, passou a interessar de perto às universidades públicas de São Paulo -USP, Unicamp e Unesp-, já que data desse episódio a fixação de um fator limitador à expansão dos investimentos dessas instituições e, por consequência, a fratura da prerrogativa da autonomia financeira que lhes foi conferida por decreto em 1989.
Para as três universidades, esse momento de transe institucional tem uma fundamental importância, pois pode tanto representar uma esperança quanto uma nova ameaça.
A ameaça vem frequentemente daqueles que, no seio do governo ou fora dele, seduzidos pela ideologia dos números, julgam que as universidades públicas são uma excrescência e um peso orçamentário que caberia ao Estado aliviar; a esperança está na possibilidade, sempre existente, de que o critério limitador seja revisto e, por outro lado, transformado em lei aquilo que está preso ainda hoje ao fio de um decreto.
As universidades não ignoram que, num momento de reordenação administrativa profunda, em que o governo do Estado se vê refém de dificuldades herdadas, a austeridade é uma imposição das circunstâncias. Entretanto é o caso de perguntar se, no quadro do esforço geral para que o Estado ganhe em funcionalidade e se torne mais leve, não estão sendo punidas justamente aquelas instituições que têm dado mostras de funcionar bem.
A não ser que se não acredite nos frutos da pesquisa científica e, no caso, de sua indissociabilidade do ensino superior qualificado, parecerá claro até mesmo aos mais empedernidos adversários do ensino público gratuito que o notável crescimento dos indicadores de qualidade das universidades estaduais paulistas nos últimos sete anos se deve à sua autonomia de gestão financeira.
Nesse sentido, sem aumentar pessoal e operando com orçamentos até inferiores aos da série histórica do final dos anos 70 -porém contando com a possibilidade de, pela primeira vez, planejar seus investimentos a longo prazo-, as três universidades públicas paulistas assumiram a tarefa hercúlea de tocar, sozinhas, 60% da pesquisa universitária nacional. Só a Unicamp responde, hoje, por 10% de toda a pós-graduação brasileira.
Mais: o colapso do sistema público de saúde só não é total em muitas regiões porque os hospitais universitários chamaram para si -com séria e crescente repercussão em seus orçamentos- a responsabilidade de socorrer as vastas legiões de pacientes vitimados pelo descredenciamento dos hospitais particulares.
A área hospitalar da Unicamp, por exemplo, que cobre uma população de 4 milhões de pessoas na região leste do Estado, viu saltar seu número de consultas médicas de 350 mil para 480 mil nos últimos cinco anos, ou seja, um crescimento de 25% -enquanto as cirurgias cresceram 27% e os exames laboratoriais, 28%. O quadro é seguramente o mesmo nos hospitais das duas outras universidades.
É natural, portanto, que, após um breve período de equilíbrio orçamentário em 1995, as universidades tenham atravessado os meses iniciais de 1996 com a perspectiva de problema de caixa e sua capacidade de investimento praticamente reduzida a zero.
Acresce que as previsões de expansão da arrecadação em 8,16% para este ano, traçadas pelo próprio governo no final do ano, não se confirmaram; bem ao contrário, houve sim uma queda de receita de 6,5% no período de janeiro a abril em relação ao mesmo período do ano passado.
Se adicionarmos a isso o infortúnio do teto orçamentário e as incertezas que cercam a questão da autonomia, pode-se aquilatar a importância que tem para as universidades públicas de São Paulo a votação, em breve, da nova Lei de Diretrizes Orçamentárias. Esperamos que a Assembléia Legislativa esteja consciente disso.

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